A Ladeira da Barra só vai ter um incremento maior a partir de 1915 com a abertura da Avenida Sete de Setembro
Tasso Franco , Salvador |
03/12/2024 às 16:21
A Ladeira da Barra e os prédios com tecnologia em vidro
Foto: BJÁ
Este é o último trecho que vamos descrever da Avenida Sete e tem 1km de extensão. Se inicia no Largo da Vitória onde se situa uma das igrejas mais antigas da cidade e termina no Largo do Porto da Barra oficialmente Largo Marquês de Leão, e se trata ao que parece à primeira vista, eminentemente residencial, mas não é.
Abriga no seu trajeto dois centros culturais (Aliança Francesa na Bahia e Instituto Cervantes, Espanha), duas agências de publicidade (Propeg e Nova Midia), um clube social Yatch, um templo religioso (Igreja de Santo Antônio da Barra), o cemitério dos Ingleses, um escritório de arquitetura (Quintela), um beco, uma pousada, três transversais (Ruas Tenente Pires Ferreira, Presidente Kennedy e Raul Drumond), três restaurantes (Egeu, Sette e Veleiro) uma reserva ambiental onde morou Caramuru e Catarina Paraguaçu (pertence à família Mariani), dois hotéis, sede de uma CIA da PM e várias lojas comerciais.
Portanto, trata-se de uma área mista com residências, comércio e serviços e uma ligação importante entre o centro e a orla atlântica. Nos primórdios, quando da chegada da esquadra de Thomé de Souza para fundar a cidade fortaleza, em 29 de março de 1549, as naus aportaram numa enseada onde é, na atualidade, a praia do Porto da Barra. Tem esse nome porque as águas eram paradas (a semelhança de um porto seguro) e representava o primeiro local adequado para lançar âncoras depois da entrada (da boca) da Baía de Todos os Santos, que dista daí poucas milhas.
Quando Thomé de Souza aportou com a nau Nossa Senhora da Conceição e as outras naus já existia nesse local uma pequena fortaleza, a Casa do Conselho, onde residia os familiares do donatário da Capitania da Bahia, Francisco Pereira Coutinho, o qual chegara ao local em 1538 para instalar a capitania e tomar posse dela. A essa altura (1549), Pereira Coutinho, já tinha sido morto pelos tupinambás de Itaparica após um conflito e um naufrágio na ilha. Foi devorado pelos tupinambás. Com a implantação do Governo Geral extinguiu-se o sistema de Capitanias Hereditárias.
Antes disso, desde 1510, o aventureiro português Diogo Álvares Correa (Caramuru) a serviço dos franceses já morava nessa mesma área da barra num morro, ainda hoje com vegetação intacta, que pertence à família Clemente Mariani (ex-Banco da Bahia), área que se situa em frente à sede do Yatch Club. Nesse local do Yatch havia uma gamboa para a pesca de peixes e Caramuru se utilizava dela com a ajuda dos tupinambás. Mas, não havia (nunca houve) uma aldeia tupinambá nessa área do território de Salvador.
As mais próximas eram a do Passeio Público e Gamboa de Baixo, à montante; e na direção da orla, a aldeia dos franceses no Rio Vermelho.
Thomé de Souza e seus homens em armas e em carpintaria usavam o Caminho da Vila Velha para chegar ao platô onde foi fundada a cidade subindo a encosta da ladeira da atual Rua Princesa Isabel onde, adiante, na atual Princesa Leopoldina já havia uma capela em louvor a Nossa Senhora da Graça, erguida em 1536 por Caramuru e Catarina Paraguaçu, e dai seguiam pelo atual Corredor da Vitória até o centro.
A Ladeira da Barra, como tal, só vai surgir de fato a partir de 1915 quando a Avenida Sete foi aberta e detonou-se uma pedreira que havia no caminho situada entre a antiga morada de Caramuru e a Igreja de Santo Antônio da Barra. Este templo católico teria sido construído – segundo anotações históricas – no final do século XVII e sua relação inicial se dava com a antiga Vila Velha do Pereira e não propriamente com a cidade do Salvador.
Os bondes foram implantados em Salvador no ano de 1870 pela família Ariani ainda puxados a burros e uma linha foi implantada entre o bairro da Graça e o Centro. Os bondes só chegaram a Barra e Barra Avenida já eletrificados – parte da eletrificação de Salvador começa em 1906 – e segundo Geraldo da Cosa Leal em “Perfis Urbanos de Salvador – os bondes, a demolição da Sé, o futebol e os gallegos” os trajetos “Barra e Barra Avenida chegando no Largo da Vitória se separavam. O primeiro (34) descia a ladeira em frente e, chegando ao Largo do Farol da Barra (isso a partir de 1915), entrava na Rua Marques de Leão; o outro viajava pelas ruas da Graça, Princesa Leopoldina, Princesa Isabel. Ambos seguiam um roteiro inverso, cruzavam-se na Pastelaria Alameda, regressando em sentido contrário ao Largo da Vitória, onde tinham se separado. Ambos passavam na ida ou na volta, em frente ao Barracão da Graça, Clube Bahiano de Tênis, Hospital Português, Clube Palmeiras e Hospital Espanhol. O bonde com tabela de Farol da Barra (34) partindo do Plano Inclinado, ia e voltava, sem desvio, cruzando toda a Avenida Sete de Setembro”.
Ou seja, o bonde circular retornava pela Barra Avenida (Av. Princesa Isabel, Av. Princesa Leopoldina, Graça, centro) e o 34 (Barra via Farol) voltava pela Ladeira da Barra. Hoje, os ônibus circulares para Amaralina, Itapuã (orla atlântica) a Paralela e Miolo descem a Ladeira da Barra, contornam trecho da Princesa Isabel pela rua Praguer Fróes e voltam à orla na rua Barão de Itapoan seguindo pelo final da Av. Sete até a rua Afonso Celso e depois retornam novamente a orla na rua Ayrosa Galvão saindo na altura do Morro do Cristo. Há, desde 2010, um calçadão no final da Av. Sete que limita a circulação dos ônibus. Nos finais de semana, os ônibus não passam em frente ao Porto da Barra, antigo Caminho Conselho. Daí, a necessidade de fazer essas manobras.
Outros veículos acessam o calçadão. É um rolo permanente. O certo é que na Ladeira da Barra descem e sobem ônibus e outros veículos. Não há, nesse trecho, pista de bike, porém, circulam muitos ciclistas, na subida quase sempre empurrando a bicicleta e na descida a mil por hora. Eventualmente, alguém se esborracha e é também atropelado por veículos. Lembrando, ainda, que os motociclistas usam muito essa via. Há, nesse trecho, restaurantes, agências de publicidade, hotéis e lojas.
Na real, a Ladeira da Barra só vai ter vida mais intensa a partir de 1915. Embora, antes disso, já existissem casas e uma fábrica de leques onde está instalado o Yatch Clube, desde a década de 1930, o cemitério dos ingleses que foi autorizado pelo governador Conde dos Arcos (1815) e casarões do eclético italiano e no modelo inglês que já existiam em meados do século XIX e floresceram mais ainda no século XX até quando, já na segunda quadra do século XX foram derrubados para a construção de arranhas céus. Não ficou pedra sobre pedra e todos foram abaixo e na virada do século XXI e no correr desses 24 anos não restaram mais nada.
Há, é verdade, ainda algumas casas já erguidas no correr do século XX no modelo clássico e ‘art deco’, um dos exemplos mais antigos ainda existente é o casarão que abriga a Aliança Francesa (Casa da França, consulado honorário, Teatro Moliére, curso de francês) e diria que os demais estão com os dias contados (algumas dessas casas já abandonadas) esperando a morte definitiva chegar e envidraçados subirem aos céus. A Ladeira da Barra, por conseguinte, é um local de apartamentos de alto padrão todos com vistas belíssimas para a Baía de Todos os Santos.
O QUE EXISTE em edificações a partir do Edifício Versailles cuja portaria dá para o Largo da Vitória e a lateral é o primeiro prédio da ladeira, à esquerda, segue adiante com duas casas abandonadas. Em seguida Edifício Lenora (2747), Edifício Mansão Carybé (2759) prédio mais moderno e imponente; Edifício Serra do Crepúsculo; Edifício Portal do Atlântico (2791); Mansão Baia Azul (2847) dois imensos prédios de 16 andares cada; Edifício Pedra do Mar (2965); Edifício Solar das Mangueiras (2901) com belíssima área verde; Edifício Vila Serena (2937), 15 andares, moderno; Edifício Solaire (2959) gigante envidraçado com 25 andares; e chega-se a rua Tenente Pires Ferreira.
Depois da Tenente Pires Ferreira, Condomínio Edifício Monterey; Edifício Iate; Condomínio Edifício Bahia do Sol; Edifício Primavera (3089), Edifício José Bastos Tourinho (3097); Mansão Yath View (3911) e Edifício Yatch Privillege (3157) onde se situa o restaurante Sette, vindo a seguir a Rua Presidente Kennedy; seguindo após esta rua os edifícios Ibirapuera (3189) e Yatch (3207) vindo outra rua, a Raul Drumond; do outro lado da rua a Mansão Mariani; após a extensão área verde desta mansão situa-se o Edifício Solar Ferreira, sobre pilotis; terreno vazio; Edifício Rodrigues Lima (3435) , estacionamento da PM; Edifício David (3465), mais modesto; edifício Karline (3479); Edifício Porto do Sol (3495), clínica veterinária PET; Edifício Rômulo (3503); Edifício Aion (em lançamento); lojas Expresso Receptivo e Turismo e Cassi Turismo; e Rede Andrade Barra Hotel, este último com entrada no largo do Porto.
Descendo a ladeira pelo lado direito se inicia pelo prédio abandonado da antiga Clínica Cato (fechada), em seguida o casarão da Alianças Francesa da Bahia instalada em casa neoclássica do século XIX, local da antiga Pensão Francesa usado por Pancetti para pintar seus quadros, centro de cultura com Teatro Moliére e cursos de francês; casa enorme marrom; Edifício Warhol (2774), mais moderno; Instituto Cervantes prédio envidraçado curso de espanhol e centro de cultura da língua de Cervantes; loja em casarão da Su Mistura Modas, feminina e casual; casa onde funciona o Restaurante Egeu (2830) com vista belíssima para o mar; residência particular (2852); prédio em estrutura de fachada em ferro Sidney Quintela Arquitetos (ao lado funciona a Nova Midia Publicidade); mais uma casa ao lado do Sidney; prédio de 1 andar; Beco da Costureira; casa de alvenaria em pedra (2948); prédio da Santeria Hostel; terreno vazio; prédio sede da Propeg; Pousada Brisa do Mar; Casa com muro coberto de plantas (3026); Oxum Casa de Arte (casarão fechado em abandono); mureta do Yatch Clube; Edifício Porto XX (colado a entrada do Yatch); muro do Cemitério dos Ingleses; Igreja de Santo Antônio da Barra; Casa Fastframe Molduras - loja de molduras e quadros; Cia da PM; casa amarela onde foi uma sorveteria (em reforma); Edifício Alagoinhas; Grande Hotel da Barra com lojas de souvenirs no térreo o Abreu Clottings, Cafés Especiais, Vilas Bahia, Nita e Porto Bahia. Chega-se, assim, a área do Porto da Barra.
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A Igreja de Santo Antônio da Barra é do século XVII e tombada pelo IPHAN.
Situa-se acima do Forte de São Diogo (área da antiga morada do donatário Francisco Pereira Coutinho). Não existe muitas informações sobre a história da igreja, exceto por sua fundação que ocorreu por volta dos últimos anos do século XVII, na Vila Velha do Pereira. Seu movimento maior de fiéis é no novenário para o santo de Lisboa e Pádua, em junto. Nos finais de semana tem missas e o padre mora ao lado da igreja, em belíssima residência estilo inglês com varanda em ferro e vista para o mar.
O Cemitério dos Ingleses fica praticamente colocado com área da igreja. A história do anglicanismo no Brasil inicia-se no século XIX, no contexto da vinda da família real portuguesa para o país. A Marinha Real Britânica escoltou as embarcações portuguesas que partiram para o Brasil em 27 de novembro de 1807, ocasião da invasão napoleônica de Portugal. Após assinatura do Tratado de Comércio e Navegação (1910) que garantia um imposto menor às mercadorias britânicas importadas para o Brasil, comerciantes ingleses se estabelecera, Salvador, Recife e Rio de Janeiro. Na capital baiana, sobretudo no Campo Grande, Corredor da Vitória e Ladeira da Barra. Ainda hoje existe o Clube Inglês e a rua Banco dos Ingleses no Campo e a antiga casa dos cardeais (bispos) é em estilo inglês com varanda e arcadas em ferro.
Marcos de Noronha e Brito (conde dos Arcos), então Governador da Bahia, autorizou (1811) a construção de um cemitério na capital baiana para a realização dos rituais de sepultamento dos membros da comunidade britânica da cidade. Logo foi erguida uma capela para a realização de funerais no local; seus primeiros registros datam de 1819. Esta capela, conhecida como Igreja de São Jorge (ou Saint George's Church), foi o único templo não católico romano de Salvador, sendo o local onde a comunidade anglicana da cidade organizava seus cultos. Foi restaurado em 2006 pela Fundação Clemente Mariani. Tem uma placa no local.
O Cemitério dos Ingleses foi considerado um sítio histórico pelo Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia em 1993, sendo tombado pelo órgão no mesmo ano. Anda permanentemente fechado. Em 2009 foi lançado, no Cemitério dos Ingleses, o projeto Darwin na Bahia, que marcava o bicentenário do nascimento de Charles Darwin, que esteve na capital baiana durante sua expedição do Beagle. Dois companheiros de viagem do cientista britânico na expedição estão enterrados no local, Jones e Charles Musters, porém ambos não possuem lápides indicando suas sepulturas.
O Yatch Clube da Bahia foi fundado em 1935. O local fora uma gamboa de pesca, fábrica de leques e estaleiro. Um camarada chamado Walter Taube reuniu um grupo de amigos e fundou no local um clube náutico com local para prática de esportes – natação, velejar, etc – restaurante e área social para bailes. Ao longo de todos esses anos segue nesse tom embora os bailes tenham reduzidos. Já foi palco de grandes carnavais e réveillons.
Não sou sócio do Yatch, porém, já estive várias vezes no seu restaurante, assim como conheço o Egeu, minha neta já estudou na Aliança Francesa, trabalhei na Propeg, já fui cliente do Cato e frequento a novena de Santo Antônio. Além do que, em tempos idos, saboreava a feijoada do Grande Hotel, que era de Elmano Castro, após ir tardes de sábados na praia do Porto. E, creio, já subi a Ladeira da Barra mais de 200 vezes e também em tempos idos tomei massagem sex no Beco da Costureira.