Com o voto do ministro Carlos Ayres Britto, a maioria dos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) já se manifestou favoravelmente à possibilidade de antecipação do parto no caso de fetos com anencefalia.
O placar do julgamento, retomado hoje, está em 6 a 1. Ainda faltam votar três ministros --Gilmar Mendes, Celso de Mello e Cezar Peluso.
Assim, o resultado está praticamente estabelecido, já que é improvável que os ministros que já votaram retifiquem seus votos (o que podem fazer até a declaração do resultado).
Ayres Britto resumiu o debate dizendo que "se todo aborto é interrupção de gravidez, nem toda interrupção de gravidez é um aborto para fins penais". O caso em questão, disse, é atípico e, assim, não deve ser entendido como o aborto proibido em lei. Mas como um aborto em linguagem corrente.
De forma poética, o ministro argumentou que antecipar o parto no caso em questão não é um ato que imepede o desenvolvimento de uma "pessoa humana no sentido biográfico". "Metaforicamente, o feto anencéfalo é uma crisálida que jamais chegará em estado de borboleta, porque não alçará voo jamais", disse.
O ministro passou, então, a discutir a situação da gestante, grávida de um feto que não sobreviverá. "Dar à luz é dar à vida, não é dar à morte. É como se fosse uma gravidez que impedisse o rio de ser corrente (...) É um organismo prometido não ao registro civil, mas a uma lápide mortuária."
Em seguida, Ayres Britto disse que não se pretende obrigar ninguém a abortar o feto anencéfalo, mas abrir essa possibilidade a quem quiser. "O martírio é voluntário, quem quiser assumir a gravidez até as últimas conseqüências que o faça, ninguém está proibindo."
O ministro citou a inexistência de definição, na legislação brasileira, do início da vida. Disse que não basta a união de espermatozóide e óvulo. "A constitutividade vital do embrião está nessa entidade mágica chamada útero."
VOTOS
O primeiro ministro a se manifestar sobre o aborto de fetos anencéfalos, ontem, foi o relator da ação Marco Aurélio Mello. Em um voto que durou mais de duas horas, ele afirmou que "obrigar a mulher a manter a gestação [de feto anencéfalo] assemelha-se, sim, à tortura e a um sacrifício que não pode ser pedido a qualquer pessoa ou dela exigido".
A ministra Rosa Weber e o ministro Joaquim Barbosa falaram em seguida e seguiram o voto do relator. Em seguida, votou o ministro Luiz Fux, que afirmou que não entraria na discussão sobre a valoração das vidas. "Não me sinto confortável de fazer a ponderação de que vida é mais importante, se a da mulher ou a do feto."
Já a ministra Cármen Lúcia afirmou que qualquer que seja a decisão da mulher sempre será uma "opção de dor", e também votou a favor da antecipação terapêutica do parto no caso de fetos comprovadamente anencéfalos.
Ainda no primeiro dia de julgamento, o ministro Ricardo Lewandowski foi o único a votar contrário a ação. Para ele, só o Congresso Nacional poderia mudar a lei e permitir o aborto nestes casos. Lewandowski foi o último ministro a se manifestar ontem.
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