Cultura

A HISTÓRIA DOS BAIRROS DE SERRINHA, CAP 19: O CENTENÁRIO BECO DA LAMA

A viela passou a ser beco no governo Antonio Pinheiro da Mota (1912/15) com derrubada de casas
Tasso Franco , Salvador | 30/03/2023 às 09:16
Beco da Lama, hoje, calçado com pedras portuguesas
Foto: BJÁ
                                           
  O Beco da Lama é a pequena rua mais famosa de Serrinha. O registro oficial - ainda sem esse nome - data do governo municipal de Antônio Pinheiro da Mota, entre 1912 e 1915, quando a Prefeitura solicitou um crédito especial a Câmara para comprar umas casas e ampliar a viela entre a Praça Manuel Victorino e o Largo da Federação.

  O mais provável é que o local onde hoje existe o beco - ainda um local de moradias - existe desde meados do século XIX quando o fundador do povoado e depois Vila de Serrinha, Bernardo da Silva, tinha erguido uma capela - atual igreja matriz de Sant'Anna, sua casa de morada - ao lado da matriz, prédio onde funcionou a sede da Prefeitura -, o tanque da Nação - área do antigo mercado municipal - e outras pessoas construíram casas de comércio; e abriu-se a rua a Direita (atual Antônio Rodrigues Nogueira) que era a trilha das boiadas.

Essa estrada das boiadas tinha várias direções tendo como centro a praça Luís Nogueira - ainda sem esse nome - a rua Direita - rumo as fazendas ao Norte e ao Sul -, a rua da Estação que nasce despois de 1880 com a implantação da Rede Ferroviária, bem como caminhos a Leste, quem vinha (ou ia) de Água Fria, Irará e Lamarão; e ruas que se direcionavam ao Largo do Castelo - atual Miguel Carneiro.

É provável que essa área do Beco da Lama tenha seus primeiros moradores quando o Sítio de Senhora Sant'Anna de Serrinha conquista a condição de Distrito de Paz de Serrinha (Lei provincial 67 de 1º de junho de 1838) e a capela é elevada a Freguesia, até então, filial da Freguesia de São João Baptista de Água. É a partir desta data que a capela é ampliada com mais altares e ganha status de igreja, já com um capelão Francisco Furtado de Mendonça.

Em 13 de junho de 1876 - ou seja, 38 anos depois - Serrinha conquista a condição de Vila e se emancipa de Irará (Purificação dos Campos). E vai se tornar cidade em 30 de junho de 1.891. Portanto, foram vários (e lentos passos) nessa direção.

Enquanto se dava a organização político administrativa, o núcleo urbano ia crescendo. Numa viagem feita em 1893 por ordem do governador Rodrigues Lima, o diretor do Arquivo Público da Bahia relatou sua impressão sobre Serrinha no livro "Memórias Sobre o Estado da Bahia": - Existem boas edificações de casas térreas envidraçadas e seis sobrados formando diversas ruas asseadas e calçadas e três praças, das quais, a mais importante é a Manuel Victorino .

Essas três praças citadas por Viana era: a da Estação (onde desembarcou) atual Lauro de Freitas; a principal Manuel Victorino (Luís Nogueira) e a do Castelo (atual Miguel Carneiro). O castelo ou castelinho era a casa de Miguel Carneiro (Pai Geza).

NASCE O BECO DA LAMA

A primeira referência que se tem do Beco da Lama data da gestão de Antônio Pinheirto da Mota (1912/1915) quando solicitou a Câmara um crédito suplementar para compra de casas a serem derrubadas permitindo acesso de melhor qualidade ao Largo da Federação. Ou seja, entre a Praça Manuel Victorino e o Largo da Federação certamente havia uma viela para pedestres (e, provavelmente, animais de carga) e essa viela foi alargada e constituindo-se num beco que permitia a passagem de gente e de carroças.

A população - por certo - colocou o nome popular de Beco da Lama porque quando chovia a passagem das pessoas e das carroças e animais de carga que abasteciam a feira livre da Manuel Victorino formavam lama, era um lamaçal, e os moradores reclamavam muito na Intendência.

Registre-se, ainda, que as casas de morada foram dando lugar a casas de comércio uma vez que o beco tinha um bom trânsito de pessoas (fregueses) e, assim, na quadra do século XX entre 1920/1940, o beco já tinha mais casas comerciais do que residenciais.

Entre os pioneiros estavam Isidório Andrade, Sinfrônio Lopes, Vadinho Campos, o bar do Romão, uma relojoaria, o snokker de José Jardineiro e a morada Maria de Thiome, conhecida como dona Maria do Mingau. A partir dos anos 1950 chegaram as Lojas Cruz de Tuica e Iron, que marcaram época no beco. Dona Maria de Thiome morreu com mais de 100 anos, recentemente, e deve ter sido a última moradora do beco.

Quando eu era menino, no final dos anos 1940 e início dos anos 1950, o beco já era calçado a paralelepípedos e é provável que isso tenha acontecido na urbanização da área com a construção do Mercado Municipal, começa na gestão Nenenzinho e concluída com João Barbosa de Oliviera. Em 26 de junho de 1950, o governador Octávio Mangabeira esteve em Serrinha com Lauro Farani Pedreira de Freitas (candidato a governador) para inaugurar o Mercado Municipal e os calçamentos das ruas Agenor de Freitas e Araújo Pinho.

É provável que o Beco da Lama tenha sido calçado nesta data. O certo é que o beco entrou na história de Serrinha como uma área comercial agitada, folclórica e até hoje é assim. Atualmente está calçado com pedras portuguesas e está se torno um pólo comercial na área de informática com várias lojas desse segmento, mas, há uma diversidade com café, farmácia, mercadinhos e outros.

Viva o beco centenário, o mais popular e querido da cidade. Só o snooker de Jardineiro dá pra contar muita história e Maninho Pintor, um dos bambas da época, está presente para referendar o que digo, lembrando que Zezé Jardineiro foi um dos mais ariscos jogadores de futebol do glorioso Fluminense da Serra. E meu avô João Paes - no início do século XX - atravessava diariamente esse beco para ir ao seu Café Cruzeiro, no Largo da Federação e jogava mãos de gamão no Bar de Romão.