Desde a descoberta do suposto sepulcro do discípulo de Jesus na Galícia, cada viajante opta por fazer seu próprio caminho até Composte
Nara Franco , Rio |
21/07/2018 às 17:01
Caminho para Santiago de Compostela
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A viagem seguindo as setas amarelas que levam a Santiago de Compostela —revela o norte da Península espanhola através de paragens carregadas de história e beleza. O Caminho de Santiago é uma experiência única e enriquecedora e o jornal El País, separou curiosidades dessa jornada.
A primeira diz respeito ao traçado do caminho. Em 829, um pastor encontrou um sepulcro num lugar remoto da Galícia. Informou ao bispo Teodomiro, que por sua vez contou ao Rei Afonso II. O monarca decide ir pessoalmente ao lugar para comprovar a descoberta, que pode significar uma mudança drástica na situação de isolamento de seu reino. Seu séquito segue a trilha que até então era o único caminho de Oviedo a Galícia. O trajeto passava por Grado, Cornellana, Salas e o porto do Palo até entrar na Galícia por A Fonsagrada. É o que agora chama-se Caminho Primitivo, a mais antiga das rotas de peregrinação a Compostela.
Desde a descoberta do suposto sepulcro do discípulo de Jesus na Galícia, cada viajante opta por fazer seu próprio caminho até Compostela. Algumas rotas e vias foram se tornando mais populares e outras não. Por isso, a trilha pode ser feita de diversas maneira. Em 1993, a Unesco incluiu o Caminho de Santiago na lista de patrimônios mundiais e concedeu a distinção ao Caminho Francês, o mais transitado desde a Antiguidade. Hoje, ele continua sendo o mais frequentado.
Com a fama do Caminho vieram os albergues. Qualquer casarão na beira da rota pode se transformar em hostel. No município de Sarria (Lugo), no trecho galego do Caminho Francês, há nada menos que 30 albergues (27 privados e três públicos). Sete deles ficam lado a lado na rua Maior.
Hoje, montar a trilha ficou muito fácil por causa do celular. “Antigamente, esses espaços eram mais compartilhados. Agora, as pessoas estão menos presentes no jantar e mais atentas ao celular”, reconhece com tristeza um dono de albergue ouvido pelo jornal. As novas tecnologias também provocaram uma mudança de hábito: agora os viajantes reservam alojamento pelo site Booking, mandam e-mails para pedir cama, conectam-se pelo Facebook para solicitar um lugar nos albergues. Se o viajante quer voltar para casa com uma prova que fez o caminho, a Compostela é o documento que certifica que a pessoa fez o Caminho por devotionis affectu, voti vel pietatis causa (por devoção, por voto ou por piedade). Trata-se de um pergaminho em latim emitido pelo Escritório do Peregrino de Santiago em nome da Igreja e que só é entregue a quem demonstrar, com a credencial de peregrino, ter concluído os 100 últimos quilômetros a pé ou a cavalo, ou os últimos 200 km de bicicleta. E a pessoa deve assegurar que fez a peregrinação por motivos religiosos. Há um documento diferente – o certificado de visita à cidade de Compostela – para quem faz o Caminho por motivos não religiosos. Uma espécie de certificado de peregrinação civil.
Desde o ressurgimento das peregrinações à Compostela foi escrita uma infinidade de guias, romances, ensaios e tratados sobre o fenômeno do Jubileu Compostelano. Mas, de uma forma ou de outra, todas as publicações bebem na mesma fonte: o estudo mais rigoroso e detalhado já feito sobre o tema. Trata-se de Las Peregrinaciones a Santiago de Compostela (As peregrinações a Santiago de Compostela), monumento literário escrito por três medievalistas de prestígio internacional: Luis Vázquez de Parga, José María Lacarra e Juan Uría Riu e publicada pela primeira vez em 1948.
E quem foi o primeiro peregrino? A História concedeu esse título a um tal Gotescalco, arcebispo de Le Puy, que partiu da Aquitânia no ano 950 acompanhado de uma grande comitiva. Aquela viagem deu impulso à grande corrente de peregrinos procedentes da França. Muitos séculos depois, em 1668, o príncipe italiano Cosme de Médicis empreenderia uma das primeiras jornadas de peregrinação turística documentadas. Um documento de 1312 detalha como o francês Yves Lebreton cumpriu os requisitos da visita em nome da condessa de Artois.
Uma das histórias mais encantadoras do caminho se refere à tumba do apóstolo. São Clemente, arcebispo de Compostela, escondeu a arca com os restos mortais do apóstolo tão bem que ela esteve perdida por mais de 300 anos. Reapareceu em 1878, durante as obras de reforma do altar da catedral realizadas pelo cardeal Payá e Rico, quando os trabalhadores perfuraram a abóbada oculta e encontraram os ossos de três homens. Em 1884, o papa Leão XIII respaldou quatro anos de trabalhos científicos com a bula Deus Omnipotens, reconhecendo que os restos encontrados eram efetivamente do apóstolo e de seus dois discípulos.
Logo após Ayegui, e pouco antes do mosteiro de Irache, em Navarra, encontra-se a famosa fonte do Vinho, construída por uma vinícola, a Bodegas Irache. É um dos pontos mais conhecidos do passeio. A fonte fica ao lado de outra, de água, recordando aquele gratificante e reparador fruto da videira que servia de combustível para os caminhantes primitivos. Assim, o monumento recupera ao menos metade da oferenda tradicional oferecida pelos hospitaleiros na Idade Média, que nunca negavam aos peregrinos um pedaço de pão e um copo de vinho.
O poder revigorante desta nova era dourada dos Caminhos se manifesta em Foncebadón, que em 1990 era um vilarejo abandonado e em ruínas. Hoje possui dois restaurantes, três albergues privados, outro paroquial, um hostel e um supermercado. E quase todas as casas de sua rua Real foram restauradas.
No século XV, as peregrinações de cavaleiros estavam na moda. Um de seus episódios mais famosos ocorreu na ponte sobre o rio Órbigo (León), uma das mais belas do Caminho Francês. Em junho de 1434, ano jubilar, o nobre Suero de Quiñones, de León, subiu na ponte e desafiou qualquer cavaleiro que quisesse cruzar a ponte a enfrentá-lo. Durante um mês, dom Suero e seus homens guerrearam com quem topasse a parada. Ao que parece, só um adversário morreu. Após esse suposto ato de valentia, conhecido