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Da Redação , Salvador |
15/12/2024 às 10:38
Debate sobre a IA na ABI
Foto: BJÁ
“Decifra-me ou te devoro”. A manchete da 6ª edição da Revista Memória da Imprensa, lançada na tarde deste sábado (14) pela Associação Bahiana de Imprensa (ABI), desafia o leitor a pensar sobre o futuro do jornalismo e da comunicação em tempos de Inteligência Artificial. Financiamento para o jornalismo local, mercado, modelos de negócio, desinformação e principais tendências foram alguns dos assuntos debatidos pelos especialistas convidados.
Além da discussão sobre os impactos da tecnologia na área, o evento, transmitido ao vivo pelo canal da ABI, celebrou o legado de comunicadores que fizeram história na imprensa da Bahia e do Brasil, em um encontro vibrante e cheio de afeto, ao som do maestro Fred Dantas e banda.
O presidente da Associação, Ernesto Marques, iniciou o lançamento com uma explicação do projeto Memória da Imprensa, que nasceu há 18 anos como uma série de documentários sobre grandes nomes do jornalismo baiano, e transformou-se em revista em 2020. Ernesto também falou sobre o tema da edição, antecipando o debate com um alerta sobre a necessidade de refletir com urgência e criticidade.
“Apenas 2 anos depois do lançamento da Open AI, decifrar este enigma se tornou uma imposição em qualquer área. […] Decifrar o enigma não se resume ao manejo dócil e até servil, de tão acrítico, da ferramenta sedutora que encanta enquanto aprende a superar o usuário”, advertiu ele
Articulistas da edição, Gabriela De Paula, Pyr Marcondes, Lucas Reis e Suzana Barbosa trouxeram os argumentos das páginas da revista ao Auditório Samuel Celestino, no terraço da ABI. A fotojornalista Margarida Neide e o jornalista José Raimundo representaram o time de entrevistados do sexto número da publicação, formado também por Paulo Roberto Sampaio, Perfilino Neto e Clementino Heitor de Carvalho.
Um fotoclipe sobre a invasão da Universidade Federal da Bahia pela polícia militar, em 2001, abriu o bloco que homenageou três mestres da fotografia – Milton Mendes, Manoel Porto e Manu Dias, autores do ensaio “3M”, estampado na revista.
Os participantes aplaudiram a família de José Carlos Teixeira, falecido em outubro. O jornalista foi homenageado nas páginas da revista com um texto emocionante assinado por seu filho, João Pedro Pitombo, lembrando a força da escrita de Teixeira e seu legado como exemplo de ética e criatividade, além de uma charge de Borega e dos depoimentos da viúva Lenilde Pacheco e dos amigos Zé de Jesus Barreto, Pedro Formigli, Paolo Marconi, Carlos Navarro e Adilson Borges.
Debate
A roda de conversa começou com colocações da jornalista especializada em tecnologia e inovação e palestrante TEDx, Gabriela de Paula. A jornalista defendeu a posição de que a escalada da IA generativa traz um destaque maior ao domínio da linguagem, que tende a substituir a programação como interface homem-máquina a partir dessas tecnologias. Da mesma forma, ela acredita que as habilidades de articular, interpretar e questionar do jornalista também se tornam mais importantes nesse contexto.
“Eu queria muito provocar vocês sobre essas oportunidades que estão escondidas para nós que somos perguntadores, curiosos, temos esse senso de necessidade de investigar. A máquina tende a ter um banco de dados muito grande e ter respostas para a gente, mas a gente precisa de quem faça essas perguntas”, ponderou a diretora do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado Bahia (Sinjorba).
O presidente da Associação Baiana do Mercado Publicitário (ABMP) e doutor em Comunicação, Lucas Reis reiterou a ênfase nas oportunidades levantadas pela IA, apontando ainda algumas preocupações como os direitos autorais do conteúdo usado para “alimentar” os programas generativos, mas também ressaltando o despreparo de muitos jornalistas e veículos para aproveitar bem as oportunidades nesse âmbito.
“69% dos jornalistas nunca receberam treinamento para usar Inteligência Artificial generativa no seu trabalho, mas a maior parte já usa. Então, você tem vários profissionais usando sem serem treinados, e sem existir uma política sobre como usar essa inteligência artificial”, pontuou ele, demonstrando visível preocupação com as implicações éticas.
Essa necessidade de adaptação foi enfatizada pelo jornalista, investidor e palestrante Pyr Marcondes, que resumiu os argumentos do seu livro “Jornalismo 4.0”, lançado pela plataforma Aurora, da startup de mídia Alright, empresa com a qual a ABI firmou parceria para combater os chamados desertos de notícia e promover o fortalecimento do jornalismo local.
Pyr falou sobre a urgência de renovação dessa área, que ele acredita enfrentar um conservadorismo muito forte no que tange aos processos. “Acho que temos tudo para usar [a IA] da melhor forma possível e não deixar que ela nos use da pior forma possível. Então, quando eu digo que ‘haverá jornalismo 4.0 ou não haverá jornalismo’, é porque não haverá jornalismo sem tecnologia”, afirmou.
A professora da Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia (Facom/UFBA) e coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura Contemporâneas (PósCom/UFBA), Suzana Barbosa, falou sobre o jornalismo local nesse cenário de plataformização e IA. Suzana advertiu para a fragilidade dos jornais locais diante desse cenário, e a necessidade especial de renovação nesse nível.
“As empresas locais estão descapitalizadas e muito dependentes daquilo que é ofertado pelas chamadas big techs. Elas não têm como fazer frente a isso. A valorização das marcas, do seu jornalismo, dos profissionais, me parece que é o caminho que se indica para seguir”, sugeriu ela.
O debate foi movimentado por rodadas de perguntas do mediador, Ernesto Marques, e do público, resultando em discussões sobre regulamentação das Big Techs, ensino de jornalistas em formação, mudança dos modelos de negócios dos veículos e legislações para conter consequências negativas do uso da Inteligência Artificial Generativa na esfera da comunicação.
A 6ª Revista Memória da Imprensa foi editada por Biaggio Talento e teve coordenação editorial de Ernesto Marques e Jaciara Santos, diretora de Comunicação da ABI. A Bamboo Editora assinou o projeto gráfico e a revisão foi feita por Guido Krieger e Raulino Júnior.