Crônica do Rasta do Pelô revela como anda a classe C emergente e as dificuldades do lazer
Dona Céu - minha querida esposa - apoquentou tanto meu juízo que fizemos um esforço conjugado, como diria Marcos Medrado com o seu 'unindo forças' e decidimos assistir ao musical de Cláudia Raia no Teatro Castro Alves, lá na fila Z6, que é a mais barata. Ainda pagamos meias-entradas porque eu já estou acima dos 60 de vida e a esposa menos que isso, porém, tem uma carteira de estudante da ASES, de um curso de new-looks-caleleireira na Escola do Círcuito Operário e arranjou essa benesses.
Foi uma noite chic e nos preparamos para isso porque a classe C emergente está sofrendo bastante com essa medonha crise, os turistas sumiram do Pelourinho, as tocatas do meu tamboriam estão escassas e ainda bem que estou me virando com outras atividades vendendo churros e biscoitos na Av Joana Angélica, na boca da Estação da Lapa, o que tem me dado uma renda extra.
Minha esperaça é que, estou a cada dia mais confiante numa promessa de doutor Zéu, o qual ficou de me arrumar uma boquinha num tribunal e estou só aguardando a nomeação, agente de portaria que seja, diga-se uma área que sou bom. Ou alguma coisa na Casa das Leis pra ajudar aquelas meninas no cerimonial.
Daí que, até fazendo conta nesse capilé futuro que, provavelmente virá, desembolsamos R$140,00 para ver dona Claudia Raia, um espetáculo maravailhoso, moças e rapazes glamurosos danaçando no palco, tudo de bom.
Logo quando chegamos ao TCA a primeira dificuldades foi estacionar nossa Brasília ao lado do teatro porque naquele estacionamento do Campo Grande cobrava-se R$28,00 e eu diesse a Céu, "é uma roubalheira e vou colocar nosso carro é na rua".
- E se roubarem , questionou.
- Quem vai quer levar esse caro como tantos outros mais bonitos - respondi.
Quando estava estacionando embaixo de uma árvore vizinho ao prédio de doutor Jalon apareceu logo um guardador com um bilhete em mãos cobrando a taxa de R$10,00.
- Vou lhe pagar R$5,00 na saída se você estiver aqui olhando meu carro", disse.
O cara olhou para mil e respondeu: - Tomara que risquem seu carro com um prego.
Quis dar um carreirão no moleque mas Céu me conteve. Combinei de pagar R$7,00 porque Céu tinha R$2,00 na bolsa e me ajudou.
E lá fomos nós para o teatro, Quando chegou no foyer Céu quis fazer um look de sua roupa para mandar para sua irmã Rilza Cervejão e tome clic. - Quel tal você gostou, perguntou-me.
-Você tá parecendo com Encarnação de Velho Chico com esse preto fechado,. Só falta o pente espanhol no cabelo e um véu - arreliei.
- Só não lhe dou uma caqueirada porque estamos no teatro - zangou-se.
Nisso deu um calor enorme na mulher e ela pediu para comprar uma água na cantina do local. A fila estava enorme e falei pra ela: - Não dá. Vamos procurar um bebedouro.
- Que bebedouro! Isso aqui não é o ICEIA, o Pinto de Carvalho. Entre na fila e compre uma garrafinha d'água.
E lá fui eu. Depois seguimos para o interior do TCA e perguntamos a mocinha que fica na entrada onde ficava a fila Z6-34 e 35.
- É lá no céu moço. O senhor pode subir por alí - apontou.
Quando chegou na cadeira com a letra Z observei se já tinha chegado na fila do nosso lugar, um senhor de blazer nos disse: - Suba mais seis degraus.
Pronto nos acomoados e assistimos o show numa boa. Bati tantas palmas que fiquei com as mãos doendo. Realmente, dona Claudia é de tirar o fôlego e os figurinos que usou durante o espetáculo muito bonitos.
Após o show, de volta a Brasília, Céu então disse que para fechar a noite gostaria de jantar fora nalgum lugar bacana.
Sugeri irmos ao bar e restaurante do Tirso, alí perto do teatro e a esposa esperneou: - Olhe se vou desfilar com meu look no bar do Tirso, ficar no meio da rua próximo a Ladeira da Fonte com ônibus passando e jogando fumaça na gente.
- Então vamos a Casa da Itália ? - fiz nova sugestão.
-Deus me defenda. Lá é bom, a comida é excelente, tem uma pizza deliciosa, mas quero ir para a Barra, para um lugar badalado, quiçá o Oui ou a Casa Vidal.
- Endoidou mulher! Com que dinheiro a gente vai pagar a conta do jantar? - questionei.
- Eu tenho R$70,00 na bolsa e creio que você ainda tem algum capilé no bolso - respondeu.
- Tenho R$15,00 e esse dinheiro só dá pra tomar duas cervejas no Caranguejo do Farol, que também é um ligar chic, falei.
- Então, já que não podemos ir no Oui - falou como se fosse uma francesa - vamos ao Caranguejo.
-E lá fomos nós. Parei a Brasília na Marques de Leão e o guardador quis logo me tomar R$10,00. Repeti o que disse ao guardador do TCA que daria R$5,00 na volta. Ele consentiu. Ainda bem.
Céu foi logo dizendo que não iria quebrar patinhas de caranguejo nem por sonho. Iria pedir um Filé Le Cirque com batatas souté e tomar uma gelada.
A questão é que o capilé só dava pra um filé. Então, dividimos numa boa. Quem não gostou muito foi o garçom, um camarada chamado Paulo Mocofaia, que queria nos vender dois filés.
O certo é que a conta fechada com as cervejas deu R$74,00 e dona Céu gastou seus R$70,00 e eu ainda interei com R$4,00. Restava a gorjeta do garçom e dei R$5.00. No final só sobru R$5,00 que dei de bom coração ao guardador de carros.
Diria que foi um complemento de noite glamurosa nossa esticada, com vista para mar, curtimos a mil tanto no TCA quando no Caranguejo e só não foi melhor porque quando já estava chegando em casa, sem 1 conto no bolso, pegando a Freitas Henriqaue de Baixo, o pneu traseiro daBrasilia furou.
Sorte que era uma ladeirinha e deu para puxar o carro até a porta de casa, com a jante fedendo de fumaça e dona Céu com os sapatos em mãos.
Mas, que foi uma noite maravilhosa, isso foi.