Salvador e outras capitais brasileiras necessitam de investimentos astronômicos (sem corrupção) para melhorarem as prosperidades das famílias
Tasso Franco , Salvador |
02/01/2025 às 19:12
O discurso e sua ambiciosa meta para o segundo mandato
Foto: Valter Pontes
O prefeito Bruno Reis ao assumir seu segundo mandato na Prefeitura de Salvador fez, ontem, um discurso bem estruturado em que o foco na questão mais importante da administração pública brasileira - a prosperidade da família - foi o destaque.
Disse o prefeito que essa será sua meta para 2025/2028, não exclusiva, porém, a prioritária.
Bruno acerta em cheio no diagnóstico das gestões públicas brasileiras e Salvador é um bom cenário para se analisar essa situação, porém, o prefeito, por maior esforço que fizer se conseguir (e olhe lá) será um pequeno êxito parcial nesse objetivo.
Digo isso como certeza absoluta porque nenhum prefeito do país, mesmo SP que é a capital com maiores recursos financeiros conseguiria essa proeza se não houver um projeto nacional nessa direção com integração dos governos federal, estaduais e municipais, apoios dos Legislativos e do Judiciário, e engajamento de outros órgãos e da sociedade civil empresarial.
A questão é histórica. Nunca o Brasil, em seus 136 anos de República, tentou executar esse projeto e muito se fala, até os dias atuais, da colonização portuguesa até o Iº Império, os algozes por nosso atraso, eternos, perenes, mas, desde o IIº Império até os dias atuais, quase 200 anos sob o comando de brasileiros, continuamos como diz Gilberto Gil em sua música "em procissão como cobra se arrastando pelo chão".
Então, por maior boa vontade e esforço de sua equipe, ação política e financeira (o prefeito ainda não detalhou os projetos) elevar a prosperidade da família soteropolitana com uma população de quase 2 milhões de pobres ou baixa-renda é improvável. Pode melhorar alguma coisa aqui e acolá, mas, no geral, impossível. A Prefeitura não tem mecanismos para isso, nem recursos, e, hoje, tem um governador e um presidente indiferentes ao prefeito.
Digamos que um desses projetos fosse implantar o ensino do inglês nas escolas públicas municipais. Seria um grande projeto porque o inglês é a língua mundial da tecnologia, da rede de dados, dos mercados de empregos mundiais, da cultura, da economia. Ora, um programa dessa natureza duraria no mínimo 4 anos para dar resultados e precisaria além da base (professores, computadores, etc) o prosseguimento no ensino fundamental 2 que é de atribuição do estado para alunos dos 11 aos 18 anos.
Então se a PMS sustentar uma perna a outra perna tem que ser reforçada para continuidade. E isso não existe, nem existirá. Projetos de continuidade no Brasil nunca existiram.
A base da prosperidade numa família é a educação. Se assim aconteceram na China, na Índia, na Europa, na Ásia, EUA, Canadá, Rússia, Noruega então é só copiar os modelos exitosos e aplicar ao Brasil.
Sem isso, e o Brasil não tem projeto nacional nessa direção (cada estado e cada município faz uma coisa) não vamos adiante, como nunca fomos. Salvo exceções e as escolas de excelência na iniciativa privada.
Como um aluno do Manoel Devoto pode concorrer, mais adiante no mercado mundial (e essa é a tendência, vide a chinesa BYD, Camaçari) com alunos do Vieira e os formados na Coreia do Sul, Pequim e no Japão?
Não tem como. E a culpa, óbvio, não é sua. E, no futuro, ele vai ser empregado do estado ou da Assembleia ou no máximo de uma empresa doméstica em Lauro de Freitas.
A prosperidade da família é um tema extremamente complexo e estou curioso saber, qual a proposta em detalhe de Bruno Reis para esse milagre. A Prefeitura, hoje, não tem programa nessa direção. Todos os projetos da Prefeitura (e do estado) melhoram a qualidade de vida das famílias (construções de encostas, postos de saúde, calçamento de ruas, metrô, Mané Dendê, etc) mas não elevam a prosperidade da vida. Projetos produtivos em andamento (salvo os cursos técnicos) não conheço.
Morro na região da Barra/Chame-Chame há 55 anos e consegui saltar após 30 anos de trabalho duro, me especializando em marketing, estudando em Londres, etc, de um apartamento de 2 quartos sem garagem para um de 4 quartos com duas garagens e não conheço nenhum morador da Sabina, do Calabar, do Alto das Pombas, que eram nossos porteiros, vigilantes, lavadores de veículos, eletricistas, que tenha vindo morar em Ondina ou na Barra.
Claro que uma família pode se dar por satisfeita em morar no Calabar e até ter uma boa casa. Mas, observem, existem em Salvador, mais de 400 localidades chamadas subnormais, com milhares de pessoas sem o básico que é saneamento.
Elevar a prosperidade de uma família que mora na Baixa do Tubo para ir residir em Brotas, bairro classe média, requer educação, tecnologia, saber, investimentos, renda, etc, e isso a maioria das famílias não consegue.
E o que acontece com Salvador? Incha. Estoura de gente nas encostas, nas periferias, onde é possível erguer uma habitação. E, por mais esforço e concentração, o prefeito (sozinho) não conseguirá mudar esse quadro.
Em 1986, participei da campanha de Waldir Pires como coordenador da área de imprensa. Foi uma campanha renovadora cujo slogan era "Mudar a Bahia". Waldir foi eleito com votação astronômica. Quando chegou a Ondina, menos de um ano sentado na cadeira de governador disse uma coisa certíssima (que, para mudar a Bahia; era preciso mudar o Brasil). Mas, óbvio, uma narrativa, utópica e sonhadora.
Só que Waldir levou a sério e renunciou ao governo da Bahia para ser candidato a vice-presidente na chapa de Ulysses Guimarães e o eleito foi Fernando Collor. Todo mundo sabe o resultado: a Bahia afundou ainda mais e Collor foi apeado do governo por impeachment.
De lá pra cá o Brasil melhorou alguma coisa? Sem dúvida, melhorou. Mas, nada estruturante. Continuamos com os mesmos problemas crônicos de sempre da República Velha, ainda da época de Deodoro e Floriano: corrupção latente, educação precária, favelas e mais favelas, violência crescente assustadora, legislativos e judiciários confortáveis e por aí vai. A lista é comprida.
Entre 1997 e 2004 fui secretário de Comunicação da Prefeitura de Salvador e andamos (o prefeito era Antônio Imbassahy) a cidade de ponta-a-ponta realizando algumas intervenções (o programa estruturante de encostas começou nesta época e o metrô idem), melhorando a qualidade de vida da população que, naquela época tinha 2 milhões de almas.
Hoje, quase 30 anos depois, são 3 milhões de pessoas e muito também já se fez de 2004 a 2024 na Prefeitura, nos governos do estado e nos governos federais, mas a prosperidade das famílias cresceu pouquíssimo e os bolsões de pobreza aumentaram.
Estão, pois, postos alguns pontos nessa corrida de obstáculos para o prefeito Bruno Reis. Se ele conseguir o milagre de prosperidade das famílias de Salvador nesses próximos 4 anos se transformará num herói nacional.