‘Fratura de confiança’ fez Lula demitir comandante do Exército, diz ministro da Defesa
Tasso Franco , Salvador |
22/01/2023 às 09:10
Ministro da Defesa, José Múcio
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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva demitiu neste sábado, 21, o comandante do Exército, general Júlio César de Arruda, e nomeou para a chefia da Força Terrestre o comandante militar do Sudeste, general Tomás Miguel Ribeiro Paiva. O Exército não informou o motivo da exoneração de Arruda, que deixa o cargo apenas 23 dias após assumir e em meio a um clima de tensão envolvendo o atual governo e os militares após os atos golpistas do dia 8 de janeiro em Brasília.
O ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, confirmou na noite de ontem que a saída de Arruda se deve a uma quebra de confiança com o governo. “Evidentemente, depois desses últimos episódios, a questão dos acampamentos, a questão do dia 8 de janeiro, as relações, principalmente do comando do Exército, sofreram uma fratura no nível de confiança”, afirmou Múcio. “Precisávamos estancar isso logo no início desse episódio, até para que nós pudéssemos superar esse episódio.” O ministro deu a declaração no Palácio do Planalto, após reunião com Lula.
Segundo relatos colhidos no Exército e no Planalto, Arruda foi demitido por três fatores principais. Primeiro, Lula ficou irritado com a resistência no Comando do Exército de permitir a prisão no acampamento de bolsonaristas em frente ao Quartel-General em Brasília, na noite da invasão e depredação das sedes dos Poderes. Pesou também para a demissão do comandante os fortes indícios de que o Comando Militar do Planalto, ligado ao Exército, falhou significativamente na contenção dos ataques.
Coronel Cid
O terceiro fator, visto como a gota d’água nas relações de confiança, foi a resistência de Arruda para exonerar o tenente-coronel Mauro Cesar Barbosa Cid, conhecido como “coronel Cid”. Fiel escudeiro de Jair Bolsonaro e ajudante de ordens do ex-presidente, Cid foi nomeado para chefiar o 1.º Batalhão de Ações de Comando do Exército em Goiânia. Foi grande a pressão para que a nomeação fosse cancelada por Arruda, o que não ocorreu.
O general foi demitido um dia após ele e os comandantes da Marinha e da Aeronáutica se reunirem com Lula e os ministros da Defesa e da Casa Civil, Rui Costa. De acordo com ministros ouvidos pela reportagem, houve um clima de forte tensão entre membros do governo, com discussões sobre a anulação da nomeação.
Veja o que foi discutido em
Reportagem publicada na sexta-feira pelo site Metrópoles revelou dados de investigações que correm no Supremo Tribunal Federal (STF) envolvendo Cid e transações financeiras – muitas delas em espécie – que o coronel realizava para Bolsonaro e a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro.
O Estadão tentou contato com Arruda, mas seu telefone estava desligado. O ministro da Defesa esteve pela manhã com o comandante demitido e depois se reuniu com o seu substituto. “Conversamos hoje com o general que estava no comando logo cedo, o general Arruda, que eu faço as minhas melhores referências. E por isso eu queria apresentar o seu substituto, o general Tomás, que hoje é o novo comandante do Exército”, disse Múcio, sem responder aos questionamentos da imprensa.
Tomás Paiva, que agora assume o comando do Exército, é oficial de infantaria, tido como um dos nomes mais moderados da caserna e com boa aceitação no futuro governo, especialmente porque teria desenvolvido relações mais próximas com o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB). Tomás foi ajudante de ordens do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Sempre nutriu relações com os tucanos, desde então.