Enquanto o estado do Rio corre contra o tempo para cumprir o compromisso olímpico de tratar 80% do esgoto despejado na Baia de Guanabara, uma dupla de velejadores profissionais da cidade afirma que foi vítima de um acidente com uma caixa de plástico usada para o transporte de peixe, justamente no local reservado para a raia da Rio 2016, entre a Marina da Glória e a Ilha da Lage.
O episódio envolveu o velejador profissional Breno Osthoff, 20, e Rafael de Almeida Sampaio, 35, com um barco de classe olímpica, o 49er. Com o choque, o barco acabou virando.
- Infelizmente encontrar com lixo na Baía de Guanabara é frequente. Todas as velejadas que eu dou, nos últimos dois anos, eu colido com algum tipo de lixo, que vai desde um saco plástico a grandes pedaços de madeira. Infelizmente essa é a nossa raia olímpica.
O GLOBO teve acesso ao registro de um acidente, ocorrido dia 14 de janeiro, registrado em vídeo pelos velejadores, que sofreram escoriações leves e estimaram em quase R$ 5 mil o prejuízo provocado pelo choque.
- Era um dia com perfeita condição de navegabilidade, pouco antes do carnaval. Velejávamos a uma velocidade de 10 nós, cerca de 20 km/h, que para o mar é uma velocidade alta. A colisão foi tão forte que a caixa se partiu ao meio - relata Breno.
- Não importa como aquele lixo foi parar lá. Se por descarte ou descuido. O que importa é que aquilo não deveria estar ali - reforça Rafael.
Referência na análise das condições da Baia de Guanabara para a prática da Vela, o ex-técnico olímpico e velejador profissional na classe Snipe, Ivan Pimentel alerta que, muito além do prejuízo que o lixo pode provocar em uma prova olímpica, colisões contra objetos em velocidade de competição podem ser muito perigosos.
- O atleta pode ser lançado contra o mastro, bater com a cabeça e os danos podem ser muito maiores.
Embora não estivessem competindo no momento da colisão, os velejadores classificam como "inaceitável" que um fator externo atrapalhe o atleta durante uma prova.
- É inconcebível que um fator externo a você te prejudique assim. Depois de um acidente como esse (numa prova), mesmo que você tenha a sorte de o barco não quebrar, vários atletas já passaram sua marca e dificilmente você conseguirá se recuperar e voltar para sua posição. Se elevarmos essa questão ao nível olímpico, onde se tem os melhores do mundo, é algo inaceitável.
Questionada sobre o episódio, a Confederação Brasileira de Vela diz que não há registro de casos semelhantes a esse. No entanto, afirma que "lamenta muito o ocorrido".
A falta de coleta do lixo flutuante ou submerso no local da raia olímpica já é um dos problemas crônicos que antecedem a Rio 2016. Apenas três, das 14 estruturas de recolhimento de lixo flutuante, estão ativas. Os dez ecobarcos estão parados há um mês, já que os repasses do governo estão atrasados há cinco meses.
A Secretaria de Estadual do Ambiente chegou a anunciar a contratação, sem licitação, do Instituto Rumo Náutico, da Família Grael. Porém, eles se negaram por acreditar que teriam problemas com o TCU e também por não ter a certeza de que iriam resolver o problema a tempo.
Após a negativa do Instituto, a Secretaria decidiu, na semana passada, abrir uma licitação de R$ 31 milhões na tentativa de expandir para 15 o número de ecobarreiras na baía. Mas, ainda assim, o órgão reconhece que, apesar de prioridade, elas não ficarão prontas antes do evento teste para provas de vela previsto para a segunda quinzena de agosto deste ano.
Em relação ao tratamento do esgoto despejado na Baia de Guanabara, o estado diz que a cobertura de tratamento avançou 49% nos últimos oito anos. A aposta é a construção de uma galeria de cintura na Marina da Glória, orçada em R$14 milhões. O projeto, que começou em 2014, pretende desviar o esgoto que sai das galerias pluviais na Praia do Flamengo, local próximo de onde acontecerão as provas de regatas.
O comitê olímpico da Rio 2016 diz que está acompanhando o trabalho que o governo do Rio vem realizando para cumprir os compromissos olímpicos. Diz ainda que acredita que as raias estarão limpas e em condições para os jogos olímpicos.