Valdir Barbosa é cronista
Valdir Barbosa , da redação em Salvador |
30/06/2014 às 09:52
Júlio César tirando pesadelo das costas, herança de 2010
Foto: Ricardo Matsukawa / Terra
As luzes estavam por acender, a cortina viria se abrir no Itaquerão, quando grafei o texto que intitularia: Sabedoria Popular. Desde então, atores vêm brilhando no palco das doze Arenas, onde ocorre o maior certame desportivo do planeta.
Em seguida à rodada de ontem, quando novos times foram eliminados, de todos quantos começaram a frenética corrida, na qual não se pode perder duas vezes, no final restarão apenas dois concorrentes. A fase de oitavas de final aberta por Brasil e Chile, além de Uruguai e Colômbia definiu os dois primeiros de cada uma destas disputas, como protagonistas da próxima partida que levará um deles adiante.
O Uruguai mordido pela punição, que muitos acharam deveras severa, imposta ao seu maior jogador na atualidade, depois que Luis Suáres abocanhou literalmente o ombro de defensor italiano, quando a Azurra, tetra campeã do mundo foi despachada da Copa, não apresentou a mesma garra de outras eras sucumbindo, sem muita dificuldade nos lances, um deles encantador, da noite inspirada de James, o artilheiro colombiano.
Por seu turno, o Chile veio ao encontro do time brasileiro, com garras e dentes afiados. Depois do gol atribuído ao nosso guerreiro David Luis, após cobrança de escanteio, quando a bola resvalou na cabeça de Thiago Silva, que a mim pareceu ter sido obra da panturrilha de jogador adversário, a equipe nacional não se encontrou em campo.
Neymar, uma das grandes estrelas mundiais, não esteve em tarde iluminada, quem sabe em face de lesão, por entrada desleal logo no início da partida. Nossos artilheiros, um após outro, Fred, mineiro de nascimento e Jo, atleta do Atlético das Alterosas, não conseguiram achar o caminho das redes adversárias, no íntimo Mineirão.
Por conta disto, o sofrimento dos brasileiros todos se estendeu, desde o tempo normal, passando pela prorrogação, até quando chegou a famigerada e impiedosa disputa de pênaltis, onde tudo pode acontecer.
Então, a roda gigante que começou sua descida para o goleiro Julio Cesar, quatro anos atrás, pondo-o no chão revelou nesta tarde de sábado passada, ser possível lhe colocar de volta em patamares elevados, quem sabe permitindo, ao fim e ao cabo das três partidas faltantes, reocupe os píncaros da glória.
Sim, porque numa sucessão de defesas espetaculares resolveu sozinho a parada, defendendo chute à queima roupa, praticamente no fim do tempo normal e dois pênaltis. Além disto, imagino, energia invisível vinda da ponta de seus dedos, pôde empurrar duas vezes a bola para o travessão, quando tinham o endereço certo das cordas, no arremate do camisa nove, aos derradeiros segundos da prorrogação e na patada deste, o ultimo cobrador das penalidades.
Ao explodir a bola, no poste esquerdo guarnecido por Julio explodiram os corações dos mais de duzentos milhões de brasileiros, naquela hora em pré-síncope. O resgate da derrota contra os laranjas, na ultima copa, veio em forma de desbotar a camisa encarnada dos chilenos, que tiveram sua estrela apagada pela atuação memorável do vilão de ontem e herói do agora.
Assim é a vida, com trabalho e fé, tudo pode mudar. O treze, que deveria ter sido a sorte dos adversários, quando reserva que usava a vestimenta com este numeral entrou em campo, fez soprar a roda da fortuna para o lado do nosso César, então, a Julio, o que é de Julio. Os méritos todos são dele, pelo êxito desta empreitada que poderá nos fazer hexa campeões.
Certo é que, empolgado e ainda impregnado pela adrenalina que me consumiu, ao assistir dita peleja emocionante, quase me esqueço de falar do mote que me empurrou para frente das teclas, responsáveis por derramar meu pensamento na tela. Portanto, volto a ele.
Caminho, ainda manhãzinha, no entorno de meu refúgio agradecendo a Deus, por não estar chorando, no pé do caboclo, a derrota do time brasileiro. Acho-me no Campo Grande, onde a praça que guarda seu nome e expõe o imponente herói da libertação baiana, já se prepara para os festejos do Dois de Julho, sem dúvida a data da verdadeira independência do Brasil. Assim como da vez passada, quando escrevi o texto anterior, chuva benfazeja, embora fria, molha meu corpo.
Sigo pensando na vitoria suada, para o Corredor da Vitória, onde as arvores centenárias me servirão de abrigo, além de buscar o portal da Igreja que guarda a Santa Milagrosa das Conquistas, no afã de agradecer por tudo, como costumeiramente ocorre, hoje, em especial, pela dádiva que fez de Julio o herói.
Encontro de novo o ambulante que afirmou, ao lhe haver perguntado lá atrás. E aí, o que acha da copa?, no que respondeu: “É doutor, já roubaram demais agora é torcer pelo Brasil”. Então questiono. E aí o que achou do jogo de ontem?
Disse-me: “É doutor, quando eu vi, camisa vermelha, estrela, o cara entrando com a treze pensei: vão acabar com o Brasil. Ainda bem que teve a trave, arrematando: é isso, e em outubro tem eleição”.
Saí sorrindo baixinho e pensando, como o professor Raimundo. Eh! Cabra bom! Queria ter um filho assim.
E que venha a Colômbia.