Só um 0x0, até agora, o que significa uma nova vida para o futebol com os times jogando pra frente e querendo vencer. E, óbvio, vencendo.
ZédeJesusBarrêto , Salvador |
16/06/2014 às 15:40
A chanceler alemã, Angela Merkel, foi cumprimentar os jogadores apos 4x0
Foto: Facebook
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Bola que rola nos gramados, pois, e a Copa saiu da varanda. Mesa posta, papo que rola.
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Os ‘alemão!’
Sol a pino, 30 graus, veranico de inverno bem baiano, manhã de caos no trânsito da cidade, arquibancadas da Fonte Nova cheias e bem divididas entre ‘gajos’ e ‘chucrutes’, a presença nas cabines ‘de honra’ da chanceler Ângela Merkel, do atrasadinho governador da Bahia Jaques Wagner e da cúpula da Fifa (Blatter e Platini)...
E a equipe alemã destroçou o time português por sonoros 4 x0, em ritmo de treino. Prevaleceu a escola coletiva, pragmática, objetiva germânica sobre o individualismo e o desentrosamento dos ‘portugas’ em campo, vestidos num uniforme vermelho e preto (?) esquisito.
O primeiro gol resultou de um pênalti cometido pelo lateral J.Pereira sobre o avante Gotze, bem parecido com aquele sobre Fred, tão comentado: Muller bateu e fez 1 x 0, aos 11 minutos. Aos 31, após cobrança de escanteio, o zagueirão Hummels testou forte e fez 2 x 0, com os alemães tocando a bola sob a batuta do meia Ozil, num ritmo cadenciado porém intenso e os lusos sem conseguir acionar o astro Cristiano Ronaldo, marcado em cima e sem criar nada.
Aos 36, o ‘gajo’ brasileiro Pepe perdeu o juízo: deu uma mãozada no rosto do adversário e, não contente, com o rival (Muller) caído foi lá, deu-lhe uma leve cabeçada e desferiu-lhe impropérios, acusando-o de simulação. Os dois bateram boca e o árbitro mandou Pepe mais cedo pro chuveiro, acabando assim qualquer chance de possível reação do time ibérico. Já em ritmo de coletivo, Muller ampliou para 3 x0 aos 45’. Na segunda etapa, sem fazer força, poupando-se, a Alemanha fechou o caixão ( 4 x0), outro gol de Muller, o artilheiro da Copa com 3 gols.
Os alemães, com o placar, confirmam o favoritismo, é um dos candidatos ao título, sem dúvida com seu futebol que não encanta mas é extremamente eficiente. Além de perder o jogo, Portugal perdeu também o experiente e tresloucado zagueiro Pepe, expulso, e também o lateral esquerdo Coentrão, com distensão muscular na virilha. Desfalques significativos para uma equipe ( melhor, um time) já limitado. Um passeio alemão em Salvador.
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Brasil x México
A cada jogo que vemos, nessa Copa surpreendente, mais ficamos apreensivos com o desempenho do time do Felipão que, nessa terça-feira à tarde, enfrenta o México. Não que os mexicanos sejam uma maravilha, não são, mostraram pouco contra Camarões (1 x 0) em Natal. Mas venceram com autoridade, tiveram dois gols anulados; defendem-se de forma compacta, contragolpeiam organizadamente, em velocidade, pelas laterais do campo e chutam muito de longe. Brigam muito pela bola. Têm um histórico de dificultar os jogos contra o Brasil, ultimamente e conhecem bem nossos pontos fracos. De olho nos atacantes Peralta e Giovani dos Santos.
E mostramos pontos fracos na estréia, sim. Nossos laterais, sobretudo o Dani Alves, que avançam muito, precisam de uma cobertura mais eficiente, mais rápida, a ser feita por um dos apoiadores, meiocampistas. Nosso meio campo não mantém a mesma garra, a mesma marcação, a mesma intensidade de jogo e ocupação dos espaços durante todos os 90 minutos; às vezes parece que há um desligamento e começamos a perder os rebotes, as divididas, a meia cancha. Isso pode ser fatal. A pegada deve ser mantida, sempre, ou entregamos o jogo.
Individualmente, assustei-me com algumas falhas do goleiro Júlio Cesar no jogo de estréia; uma saída em falso, numa bola alçada e duas enjoadas feias de bolas chutadas de longe e rebatidas por ele para a frente da área, inadmissível num bom goleiro, de seleção. Hulk, o mais fraco tecnicamente da equipe, jogou muito abaixo do que normalmente rende da seleção; será que sentiu o peso da Copa? Fred, o nosso centroavante, quase não tocou na bola na partida contra a Croácia, isolado e preso entre os zagueiros, sem mobilidade, sem agilidade, sem buscar o jogo.
É urgente corrigir isso, já mostrar evolução, avanços, melhoria de equipe, conjunto nesse jogo contra o México ou ... não iremos muito longe na competição. Copa são sete jogos apenas, uma competição curta onde não se pode errar. Qualquer bobeira, coletiva ou individual, pode ser fatal. Se ganharmos do México estaremos classificados, mas na fase seguinte pegamos de cara uma pedreira (pode ser Holanda, Espanha ou Chile); e aí, ‘cumpade’, é ‘perdeu,cai fora’. Tá ligado ?
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Dentro de campo
Primeira rodada quase concluída, já podemos dizer que temos no Brasil, em campo, uma copa de alto nível técnico, mesmo com ausências de grandes atletas – como Falcão Garcia da Colômbia, Ribery da França, Montolivo da Itália, Thiago Alcântara da Espanha, Reus da Alemanha, Walcott da Inglaterra, Jesus Navas da Espanha, Van der Vaart da Holanda, todos esses por lesões, e mais o Ibrahimovic da Suécia, porque o pais dele, a Suécia, não se classificou.
Jogaços, surpresas, gols de placa, grandes viradas de placar, emoções, arquibancadas vibrando, erros de arbitragem, polêmicas... tudo o que faz do futebol um esporte de multidões inigualável.
Nenhum 0 x0, até agora, nada de empates, as equipes estão buscando vencer sempre, uma média de gols por partida excelente, acima de três, uma competição que começou a todo vapor, pra frente, arrepiante.
Melhor jogo :
Sem dúvida, até agora, a goleada da Holanda (5 x 1) na Espanha campeã do mundo, dia 13, na Fonte Nova. Uma primeira etapa igual, lá e cá, disputada, bem jogada e a Espanha abriu o marcador, poderia até ter definido o jogo, mas... a Holanda voltou arrasadora na segunda etapa e fez quatro gols, relembrando o futebol intenso e envolvente do ‘carrossel holandês’, a ‘Laranja Mecânica’ de 1974, com Cuijff e Neeskens comandando. Foram 45 minutos pra não esquecer, show de bola de Robben, Van Persie, Blind, Snneijder... e do treinador Van Gaal, no banco. A atual campeã do mundo foi batida e humilhada.
Ótimo jogo também foi Itália 2 x 1 Inglaterra no abafamento de Manaus (que belo estádio), sábado à noite, com o veterano meia Pirlo desfilando classe, técnica e inteligência em campo, sem errar um só passe no jogo inteiro. Bonito de ver o duelo dessas duas tradicionais escolas européias.
Golaços :
Já foi para os anais da história como um dos gols mais bonitos de todas as copas aquele feito por Van Persie, de cabeça, na goleada contra a Espanha, empatando o jogo em 1 x 1, ainda no primeiro tempo, em Salvador. O lançamento longo e preciso, de 40 metros, do lateral esquerdo Blind, que encobriu a zaga espanhola e foi acompanhado pelo atacante holandês como um felino, de olhos abertos, que, ao perceber a saída do goleiro Casillas, voou de peito erguido em direção da pelota tocando-a de cabeça por cima do goleiro, acompanhando sua trajetória com olhar até as redes, o corpo impávido já a deslizar no gramado: Ousadia, equilíbrio, agilidade, inteligência, perspicácia, técnica pura. Beleza, arte.
Bonitos também os dois gols de Robben na mesma partida, exibição de rara habilidade com a bola e velocidade de raciocínio; e também o gol de Oscar no jogo de estréia, o terceiro do Brasil, de bico, no cantinho.
Surpresas
Além da goleada holandesa sobre a Espanha, inimaginável, teve também a ‘zebra’ da Costa Rica (3 x 1, de virada) pra cima do envelhecido Uruguai de Lugano, Forlan, Cavani... com Luis Suarez, ainda machucado, olhando do banco.
Os craques
Destaques nessa primeira rodada para o maestro Pirlo, dando aula de futebol pela Itália; os avantes Van Persie e Robben da Holanda,que brilharam na goleada contra a Espanha; o atacante costariquenho Campbell desequilibrou contra o Uruguai; Benzema, o finalizador da França. Pelo Brasil, os melhores foram Oscar e Neymar. Messi fez um gol a seu estilo mas ficou devendo, na estréia. Cristiano Ronaldo, o ‘Melhor do Mundo’ em 2013 não jogou nada. Na Alemanha, destaque para Muller, com três gols, e o meia Ozil, a cabeça pensante da equipe.
Arbitragens
Árbitros são humanos sempre erram, sempre erraram, em todas as copas. Hoje esses erros parecem escandalosos porque temos 20, 30 câmaras a mostrar cada lance em detalhes.
São erros de interpretação, como o pênalti em Fred no jogo de estréia (discutível), o pênalti marcado em favor da Espanha sobre o atacante Diego Costa (que não existiu), o gol terceiro da Holanda, quando o goleiro Casillas foi claramente empurrado por Van Persie na bola alçada sobre a área espanhola ... Erros ainda mais grosseiros como a invalidação de dois gols mexicanos (ambos do ‘brasileiro’ Giovani dos Santos, por marcação equivocada do bandeirinha colombiano, que deu impedimento, talvez por má visão do lance ou desconhecimento da regra. Boas arbitragens também, como a do tranqüilo e seguro africano Noumandiez Doue (Costa do Marfim) no jogo Chile x Austrália, na Arena Pantanal.
E já funcionou a tecnologia empregada pela Fifa nessa copa, para dizer com exatidão se a bola entrou, ultrapassou ou não a linha de gol, no jogo França 3 x 0 Honduras. O segundo gol (conclusão de Benzema que se chocou na trave, o goleiro hondurenho tentou tirar e acabou tocando mal na bola, que entrou) foi confirmado na base do toque eletrônico, pelo árbitro brasileiro Sandro Meira, que teve ótima atuação. Valeu!
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Fora de campo
Digna de louvação a interação da torcida holandesa, os laranjas, com Salvador. Marcaram presença no Pelourinho, festejando antes e depois, e na Barra, na praia do Porto, no Fan Fest do Farol, com alegria contagiante e colorido.
No Pelô, nem aí pro assédio dos pedintes e a ação dos larápios; na Barra, a tropeçar nos buracos das obras inacabadas, a se perder pelos corredores de tapumes e ruas atravancadas.
Ê Bahia dos meus pecados!
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No Rio Grande do Norte, além da greve dos rodoviários, fora de tempo, as chuvas causam estragos em Natal, com deslizamento de encostas, alagamentos, transtornos e cidades do interior já em estado de calamidade. O torcedor enfrenta muitos problemas até chegar a Arena das Dunas.
Ainda em Natal, há o ‘mico’ do porto que não pode receber navios com turistas porque eles não passam sob uma ponte recém construída com altura insuficiente para a passagem de transatlânticos. E agora, destrói a ponte? Quem quer ir ao RGN de navio tem de descer em Recife e pegar buzu. Pode, creuza?
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O tal rigor do ‘padrão Fifa’ foi mesmo pras cucuias no Brasil: Jogo começado em Brasília, Suiça x Equador, e filas intermináveis de torcedores para entrar no estádio Mané Garrincha.
No Beira Rio, jogo França x Honduras, cadê o som? Não teve hino dos países tocado, os torcedores franceses entoaram na goela, durante o show de bola dos ‘Bleus’, o belo ‘La Marselhesa’.
No jogo da Argentina, no Maracanã, faixa nas arquibancadas reivindicando a propriedade argentina sobre as Ilhas Malvinas. Na Arena Pernambuco uma torcida organizada da Costa do Marfim entrou com instrumentos musicais e fez barulho na partida contra o Japão. Ué, afrouxaram as pregas ? Já vale tudo?
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E teve a festinha dos croatas no resort em que estão hospedados, em Praia do Forte, litoral norte da Bahia, com tudo mundo nu na piscina madrugada a dentro. As fotos dos branquelos ‘bombaram’ nas redes.
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Quiéiiisso?!
Mas ‘mico’ maior de copa, até aqui, e de repercussão mundial, são as vaias e xingamentos dirigidos a presidente Dilma, em vários estádios brasileiros, sobretudo em São Paulo, na abertura, com ela presente.
Uma grosseria, que nos envergonha como brasileiros, essa coisa de mandar a presidente ‘tomar no ...’ Só nos apequena como nação. Também entendo como uma indecência se querer tirar proveito político-eleitoreiro do fato, responsabilizando as chamadas ‘elites’ ou a ‘classe média’ (seja lá o que isso for) pelas agressões à presidente-candidata, fazendo-a de ‘coitadinha’, digna de pena. Virou mote de palanque. Ora, tudo isso é muito constrangedor para o país.
Estupidez e cretinismo à parte ... diante da beleza e da harmonia do jogo de bola em campo, bem jogado, essa querela política se mostra ridícula (com rima e tudo).
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Deixo duas citações, para reflexão:
- “ É um equívoco associar a seleção ao governo. A sociedade amadureceu, derrotas e vitórias dentro de campo não são mais um projeto de nação”. (Ronaldo Helal, sociólogo da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, co-organizador do livro ‘Copas do Mundo: Comunicação e Identidade Cultural no País do Futebol”)
- “ A Copa não é de governo nenhum, nunca será, nem governo nenhum vai ter a desfçatez de tomar para si um feito que, em última análise, é do povo brasileiro e ninguém mais pode apropriar-se dele. [...] Se ganharmos a Copa, não terá sido o governo, teremos sido nós, como aconteceu todas as vezes em que ganhamos. E- bato na madeira – se perdermops, terá sido o governo, nem que seja por pé-frio”. ( do escritor, jornalista e acadêmico João Ubaldo Ribeiro, em sua crônica dominical ‘A contratorcida’).
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A Copa em campo está bonita, bem jogada. Sejamos dignos dela.
Até mais logo, resenhando a partida Brasil x México; espero que seja com um triunfo verde-amarelo, convincente.
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