Esporte

NA VARANDA DA COPA: Brasil se veste de canarinho, por ZÉDEJESUSBARRÊTO

Brasil é um dos países favoritos mas tudo poderá acontecer
ZédeJesusBarrêto , Salvador | 04/06/2014 às 12:35
Goiana buzina no "baba" do Brasil 4x0 Panamá
Foto: Ricardo Matsukawa / Terra
Resenhando: 

Tás atentos? Estamos a poucos dias da abertura da Copa do Mundo no Brasil! Sò agora, aqui e ali, estamos a ver (belo lusitanismo) carros e janelas com bandeirolas, bairros enfeitando-se e pessoas pelas ruas vestidas de verde/amarelo. Não há ufanismo, mas uma certeza surda de que temos bom time, bem dirigido e com possibilidades de conquistar o troféu, por sinal bonito. Mas é futebol, jogo de bola e... 

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Mãe Preta já dizia: “ Ah, meu fio, jogo e dinheiro é coisa de Exu”.

No panteão afrobaiano Exu é o mensageiro, o danado, o esperto, o “farinha pouca, meu pirão primeiro”, o inesperado, o dono das encruzilhadas.

Assim é o futebol. Jogo, imprevistos, surpresas. Além do mais, a bola é redonda, sem princípio nem fim, tem desígnios mas não tem juízo.

Nelson Rodrigues atribuía os mistérios do futebol ao “sobrenatural de Almeida”. Quem sabe ? A bola é signo do eterno, abriga encantamentos.

Que se diga: Diante do incompreensível do futebol palavras não passam de meras bestagens. Pero... o gostoso da vida é temperado por insignificâncias!

E deve ser por essas e outras que o futebol é isso que é: um dos maiores, senão o maior espetáculo da terra! Jogo, brincadeira, esporte, arte primitiva pura e também “bussiness”; integra hoje o que se chama de ‘indústria do entretenimento’, gera muita grana. 

Show da vida! Paixão. Sem bola nem sei se o ser humano sobreviveria. Imagina-se que foi tentando desenhar uma bola que descobrimos a roda. Que seria dessa vida não fosse a bola? Que restaria dessa (des)humanidade sem esse maldito/bendito futebol ?
No mais, na mente o que repetia a sábia Mãe Preta: “Dinheiro e jogo, meu fio, é coisa de Exu vadio. Num dá pra imaginar”.

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Digo-lhes ainda: Vitórias e derrotas no futebol são artes do imponderável, do imprevisível. Ganhar e perder são artimanhas, estripulias do desconhecido.
E cito, de quebra, o ex-craque dos gramados e hoje craque também das letras, o Tostão : ...” O imponderável não é destino nem mistério. Faz parte do jogo, da vida. São lances corriqueiros, freqüentes, que não sabemos onde e quando vão ocorrer. O imponderável não torce para ninguém . Espero que esteja do lado do Brasil na Copa!’ ... Amém!

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Pra aquecer, o jogo- treino contra o Panamá, no Serra Dourada, terça, Brasil 4 x 0. Neymar desequilibrou. Fez gol, deu chapéu, banho de cuia, quedas de asa e um passe de calcanhar para o gol de Hulk que ... Deus lhe benza, garoto. Que repertório de jogadas! Dia 6, outro amistoso com a Sérvia, no Morumbi, apronto. 

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Tia Dilma tem repetido que faremos ‘A Copa das Copas’. Pelo menos do lado financeiro ela tem razão. O mundial baterá todos os recordes históricos do evento. A copa mais custosa, mais lucrativa, a mais vista – cerca de 19 mil jornalistas credenciados e 3,5 bilhões de humanos de olho na telinha mundo afora -, a de tecnologia mais sofisticada, a dos craques mais caros, a de maior premiações: o campeão receberá U$ 35 milhões. A renda da Fifa com a Copa 2014 já passa dos 4 bilhões de dólares.

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Em termos de Brasil, a dúvida: herdaremos mais legados ou dívidas? 

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Leio que, em Cuiabá, o Exército disponibilizou 500 colchonetes para que os visitantes dormirem em dias de jogos, pois não há leitos suficientes em hotéis ou pousadas, mas o governo do Mato Grosso ainda estuda os locais onde os ditos estarão disponíveis. 
Lá, um problemão a resolver de última hora: parte dos cabos de fibra ótica instalados na Arena Pantanal teria sido destruída por tratores que fazem obras nos arredores. Tida como um ‘elefante branco’, depois da Copa, a Arena Pantanal tem já um futuro traçado: deve se transformar no ‘maior palco de shows sertanejos do planeta’, abrigando rodeios e festivais de música country. O Itaquerão fica ‘pronto’ a seis dias da Copa, garantem.
 
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No Nordeste, o aeroporto de Natal foi ‘inaugurado’ sem permissão/condições de receber vôos internacionais. Um caos nos primeiros dias. No aeroporto de Salvador, tapumes e restos de obras inacabadas e/ou suspensas atravancam até o fluxo de pedestres, usuários. No Rio, as ‘reformas’ no aeroporto internacional teve a presença da presidente Dilma, placas de ‘inauguração’ e corredores de tapumes grafitados escondendo escombros e malfeitos. “Aeroportos são grandes rodoviárias”, disse a presidente-candidata na ocasião, apropriadamente. Onze aeroportos nas grandes cidades do pais estão funcionando a meia-boca. Tipo rodoviária mesmo, padrão Brasil. 

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Enquanto isso, em Santa Cruz Cabrália, litoral Sul da Bahia, os alemães concluíram alojamentos, CT moderníssimo com campos de treinamento para sua seleção. Euros germânicos, claro. Tudo em cinco meses e com condições adversas: chuvas torrenciais, ventanias, enchentes, estradas destruídas ... 

Os croatas, adversários na estréia, chegaram e estão em Praia do Forte, litoral norte. Jopgam um amistoso treino dia 6, em Pituaçu, contra a Austrália. Os suíços concentram-se em Porto Seguro, ao Sul, pouco acima dos alemães. 

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As seleções e autoridades estão chegando ao Brasil pelas bases militares nos estados e são escoltadas até hotéis e CTs pelas Forças Armadas, que também farão a segurança desses locais.

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O Ministro das Comunicações Paulo Bernardo cacetou Ronaldão, o ‘envergonhado’, mas admitiu que boa parte das obras projetadas para a Copa não será entregue até a abertura do mundial. Confessou que, durante uma reunião para decidir sobre a preparação do País para sediar a competição, ainda no governo Lula, propuseram a decretação de feriados em dia de jogos como forma de resolver problemas de mobilidade urbana. “Vai todo mundo pra casa, não fica carro na rua e acabou o problema”. Pt. 

Sobre o ‘pontapé na bunda’ sugerido pelo Jérome Valcke, comentou: 
“Em alguns momentos eles resvalaram para a grosseria... E isso inclusive depõe contra eles, porque todo mundo sabe que cartola de futebol é meio mafioso”. Bom. 
O tal Valcke, secretário Geral da Fifa, no contrapé : “Não somos responsáveis pelo que ocorre num país... Somos bem claros que nenhum dinheiro pago pela Fifa pode ser ligado a qualquer caso de corrupção". Sim. Na semana passada, a neta de João Havelange, Joana Havelange, publicou em uma rede social que "o que era para ter sido roubado, já foi". O que resta no galinheiro é só titica. 

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- Ufa, decidido: Vai acontecer sim um ‘fan-festinha’ em Salvador, durante a Copa, no Farol da Barra. A ‘fan’ acontece em dias de jogos na Fonte Nova, quando tiver jogo do Brasil , nas semifinais e final. O melhor das atrações anunciadas são as bandas percussivas do Ilê Aiyê, Olodum, Malê Debalê e Muzenza, puro afrobaiano. 
- Enquanto isso, a Defensoria Pública do Estado da Bahia denuncia o que chama de ‘limpeza humana’, na Capital: a retirada das ruas do Centro Histórico e arredores da Arena Fonte Nova de mendigos, usuários de drogas e moradores de rua. As ações estariam acontecendo na madrugada e as abordagens ocorrem sob viadutos e marquises, por agentes municipais, desde o começo do ano, mas só agora ecoa. A questão é saber para onde estão levando essa gente e que tratamento tem sido dado a eles. 

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Quanto ao quesito manifestações previstas, o MTST – Movimento de Trabalhadores(?) Sem Teto, através do líder Guilherme Boulos, ameaça manguear a abertura do evento, dia 12, em São Paulo, no Itaquerão: ‘Faremos um junho vermelho!’, bradou. Tá avisado. 

Os manifestantes tidos como mais radicais, tipo os Black blocs, estariam bem monitorados pela área de inteligência da Polícia Federal e a Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Não obstante, em entrevistas sob anonimato e pelas redes sociais os porta-vozes do grupo dito anarquista prometem implantar ‘o caos, o terror’ durante a Copa e dizem que, para tanto, contam com o apoio do PCC- Primeiro Comando da Capital, facção de criminosos que comandam ações de dentro dos presídios:
“O caos que o Estado tem colocado na periferia, por meio da violência policial, na saúde pública, com pessoas morrendo nos hospitais, na falta de educação, na falta de dignidade no transporte, na vida humana, é o caos que a gente pretende devolver de troco para o Estado. E não na forma violenta como ele nos apresenta. Mas vamos instalar o caos, sim. Esse é um recado para o Estado.” Valha-me Deus! 

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Do lado de cima, o Governo anuncia que está preparado para o que der e vier. ‘Não vamos tolerar badernas!’, palavras de Dilma, a Comandante Chefe das Forças Armadas Brasileiras. 

Não duvidamos, pelo que temos visto de armas, equipamentos e homens fardados tomando conta das cidades. Terra, ar e mares vigiados e controlados. Dois bilhões foram gastos em segurança pública. Tememos sim os confrontos. 

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Pelo menos dez chefes de Estado e de governo que virão ao Brasil em função da Copa já solicitaram reuniões com a presidente Dilma Rousseff, entre junho e julho e esse número deve crescer, de acordo com o avanço, na competição, de seleções com forte tradição no futebol, como França e Espanha. 

A presidente Dilma tem agenda com o presidente do Irã, Hassan Rouhani, dia 16, e logo embarcaria para Salvador, onde estarão a chanceler alemã, Angela Merkel, e o primeiro-ministro português, Pedro Passos, para ver Alemanha x Portugal na Arena Fonte Nova. Já há bizu de que ela, a Dilma, não irá a Salvador e caberá ao governador Jaques Wagner fazer as honras. Motivo? Bem, para a final da Copa, em 13 de julho, confirmaram presença no Maracanã dois pesos-pesados: Xi Jinping (China) e Vladimir Putin (Rússia).
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Os tabus das Copas : 

Quem vence a Copa das Confederações não consegue ganhar a Copa do Mundo seguinte. Caberá ao Brasil quebrar a escrita. 

O craque escolhido como melhor do mundo pela Fifa sempre fracassa na Copa. No caso, é o ‘gajo’ Cristiano Ronaldo que, às voltas com uma dura tendinite patelar, já chega meio baleado para a competição. 

Outra: Seleções européias jamais venceram Copa disputada na América. Um desafio para Espanha, Alemanha, Itália, França ... entre as favoritas. 

E todo cuidado é pouco com os jogos-treinos pois há riscos de lesões inesperadas que tiram craques da competição em cima da hora. A Itália já perdeu Montolivo, e o México o meia Luis Montes, semana passada, ambos com fratura na perna. Mas o maior desfalque, até agora, é o atacante artilheiro Falcão Garcia, maior astro da Colômbia. 

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As zebras : O Chile, bem treinado, arrumadinho, latino-americano. A Bélgica e a Suíça, ambas muito bem nas eliminatórias européias. O Japão, melhor da Ásia; e Costa do Marfim, equipe africana do meia Yayá Touré, um dos melhores do mundo.

Vamos dar um ‘rolezinho’ apreciando os primeiros adversários do Brasil: 
- A Croácia, do astro Modric ( meio campista do Real Madrid), lida com contusões - o lateral Strinic, os meias Kranjcar, Mate Males e Ilicevic -, além suspensões e punições: o zagueiro Simunic está fora por ter feito gestos nazistas no fim do jogo de classificação pelas eliminatórias e o atacante Mandzukic está suspenso do primeiro jogo por cartões. Olho graúdo nesse time de camisas quadriculadas, o adversário na abertura da Copa, dia 12, em São Paulo. Corre muito. 

- O México mostrou-se desarrumado nas eliminatórias, sofreu pra se classificar, mas exibiu uma boa equipe no amistoso contra o Equador, 31 passado; dois dias depois levou 1 x 0 da Sérvia, em Chicago, mesmo jogando melhor. É um time briguento, tem bom passe, saída rápida, jogadas ensaiadas e chuta muito de fora da área, com precisão. Um perigo, o Brasil costuma se engasgar com eles. 
- E tem ainda o africano Camarões, mais modesto. Os jogadores ameaçaram greve por causa de premiação e de familiares que devem acompanhá-los na copa. Mas, semana passada, empataram ( 2 x 2 ) num amistoso contra a poderosa Alemanha e o artilheiro Eto’o marcou. 

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Historiando 

Tempos cinzentos aqueles de 1974, plena ditadura, quando já tínhamos bem mais consciência do que acontecia nos porões do DOPS, da PF, da OBAN, nos quartéis. Sabíamos da matança no Araguaia, do extermínio de supostos ‘inimigos’ pelo regime, dos presos, da briga intestina entre liberais e radicais dentro das Forças Aramadas, do poderio totalitário da repressão. Havia um medo difuso instalado, mas resistíamos ... 
Lembro-me do jornalismo heróico e bem feito, com belas reportagens e boa linguagem da Tribuna da Bahia, do Jornal da Bahia, das bem montadas sucursais dos jornais do sul, os jornais ‘nanicos’ que proliferavam driblando a censura, os belos e libertários carnavais da Praça Castro Alves, o encontro dos trios, a volta gloriosa de Caetano e Gil, os Novos Baianos, o Julinho de Adelaide de Chico, o orgulho negro nascendo com força nos bairros de Salvador, a vontade de vencer as trevas, ver renascer o dia ... e o tricolor campeão brilhando na velha Fonte. 

Foi o ano da surpreendente copa do time da Holanda com seu carrossel, a ‘laranja mecânica’ comandada por Cruijff e Neeskens, em transmissão direta, tevê a cores, e, no final, a extraordinária Alemanha de Beckenbauer, Overath, Breitner, Muller ...campeã, em Munique, numa partida inesquecível contra os holandeses (2 x 1). O time brasileiro, campeão do mundo, que pra lá mandamos era um grupo individualista, presunçoso e mal preparado por Zagallo, onde os egos de Paulo Cesar, Jairzinho, Rivelino, Luis Pereira, Marinho e Leão ..., em conflito, amiudaram nossa bolinha. Vimos o time surrado na bola e no pau pelos holandeses.

Em 1978, ainda sob o governo militar, aconteceu a primeira greve dos metalúrgicos em São Bernardo dos Campos, comandada pelo operário Luis Inácio da Silva, o Lula. A Copa foi na Argentina do ditador general Videla, um regime militar ainda mais duro que o brasileiro. No futebol, tínhamos um grupo renovado de bons jogadores (Toninho, Oscar, Amaral, Nelinho, Cerezzo, Zico, Roberto Dinamite, Dirceu e a pérola mineira, o Reinaldo) sob o comando ‘mão-de-ferro” de um homem de confiança dos militares no poder, o Claudio Coutinho. 

Saímos da competição sem uma derrota sequer, mas nada mostramos de futebol além de disciplina tática e força. A campeã foi a Argentina, na tora, com toda sorte de pressões, dentro e fora de campo, a árbitros e adversários. A Copa dos Generais, em gramados horríveis e arquibancadas exultantes de ‘patriotismos’. Mas não esqueçamos : ‘Los hermanos’ possuíam um timaço: Fillol, Pasarella, Tarantini, Ardiles, Mário Kempes, Ortiz, Luque ... 
O sonho do tetra seria em 1982, com Telê Santana à frente de uma equipe de sonhos. 
Ah, 82 !!! **