Veja os comentários de ZédeJesusBarrêto faltando 50 dias para a Copa
ZédeJesusBarrêto , Salvador |
23/04/2014 às 23:09
Troféu da Copa percorre o Brasil
Foto: DIV
Resenhando:
- Faltam 50 dias para o começo da Copa do Mundo 2014. A taça, o troféu em ouro da Copa já chegou ao Brasil, no dia 21 passado, e vai dar um volteio pelas capitais do país até o começo da competição. Dia 30 estará em Salvador.
- A copa e as urnas neste Brasil/2014 estão entrelaçadas. De acordo com o calendário eleitoral vigente, as convenções partidárias para definição de chapas, coligações e candidatos às eleições de outubro acontecerão em plena Copa do Mundo, de 10 a 30 de junho, a bola rolando nos gramados. Tinham se dado conta disso?
‘Entonces’, sugiro que as justas manifestações por um Brasil melhor se concentrem às portas das convenções partidárias, onde estará a ‘nata’ mais ou menos rançosa dos políticos brasileiros; foquem neles, é muito mais pertinente, ao invés de insistir na tola bandeira do ‘não vai haver Copa’. Vai ter sim, queiramos ou não. Na manha ou na tora. É a Tia Dilma que garante.
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- Por falar nisso... Vazou a notícia de que dezenas, talvez centenas de policiais militares e agentes da Polícia Federal brasileiros estão sendo treinados nos EUA, por paramilitares da empresa Academy, a antiga Blackwater, produtora dos mercenários que atuaram nas guerras do Iraque e do Afeganistão, envolvidos em massacres de populações civis. O objetivo do treinamento é a Copa do Mundo, a prevenção contra atos do terrorismo e também a repressão às manifestações de rua. Que pré-clima ‘tranquilim’, hein pai ?
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- No Rio de Janeiro, passado aquele primeiro impacto ‘pacificador’ do processo de ocupação das comunidades (antigas favelas) nos morros pelas forças de segurança, a violência voltou a aumentar na capital carioca, com tiroteios nas vielas, disputa de espaço entre as gangues das drogas, o medo se espraiando e o clima de confrontos ganhando espaço na mídia nacional e internacional.
Em Salvador, as vísceras ainda estão expostas após uma greve de dois dias da Polícia Militar, na semana santa, que resultou em mais de uma centena de homicídios em 4 dias na RMS, mais dezenas saques de lojas e mercados, inúmeros roubos de carros, a população à mercê de baderneiros, ruas vazias à noite, cenas horríveis, o medo instalado. As forças armadas ocuparam pontos da cidade, buscando o restabelecimento da normalidade, que nos últimos anos não significa tranqüilidade. Salvador é uma das capitais mais violentas do pais. Com ou sem a PM em atividade. Infelizmente.
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“Se eu tiver de assistir aos jogos ladeado por seguranças, por militares, nem irei ao Brasil. Prefiro assistir pela tevê” (palavras do ex-jogador francês Michel Platini, atual presidente da UEFa)
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- Para os dois jogos mais interessantes da primeira fase da Copa, que serão disputados na Arena Fonte Nova, em Salvador – Espanha x Holanda (dia 13/jun) e Portugal x Alemanha (dia 16 jun) –, não há mais ingressos disponíveis. Lotação esgotada no estádio, 50 mil pessoas. Restam entradas para França x Suíça (dia 20) e para o ‘clássico’, o baba Irã x Bósnia (dia 25, pós São João). Os iranianos já teriam reservado todos os ingressos mais caros, os camarotes especiais regados a bom uísque e acepipes. As elites do petróleo têm poder.
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- Até agora, as novas ‘arenas’ construídas para a Copa do Mundo trabalham no vermelho, dizem, e o ‘preju’ é cabeludo. O Castelão de Fortaleza já estaria operando com um rombo de mais de 15 milhões de reais. Segundo balanço recente, o déficit no Maracanã já ultrapassaria os 46 milhões.
Na Bahia ninguém fala no assunto, até porque o Governo Estadual , que mandou implodir a saudosa e velha Fonte Nova, está bancando a tal nova Arena reconstruída e ativa desde o ano passado, com gordas mensalidades e por anos a fio pagas com o dinheiro do povo. Imaginem o que vai acontecer, depois da copa, com os estádios de Brasília (o Mané Garrincha), de Manaus (a Arena da Amazônia), a Arena Pantanal ... Nesses locais aí nem há times na primeira divisão do Campeonato Brasileiro, o futebol não encanta tanto assim. Como esses espaços, caríssimos, vão se manter?
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- O atacante brasileiro Neymar, astro maior da seleção de Felipão que vai disputar a Copa do Mundo e atleta do Barcelona, da Espanha, está fora dos jogos finais do campeonato espanhol, após uma lesão no dedo vizinho ao mínimo, do pé esquerdo, agravada no jogo contra o rival Real Madrid pela Copa do Rei, em que o Barça perdeu por 2 x 1. Nada que preocupe com relação a Copa; talvez até sejam bem vindas essas duas, três semanas de molho ou descanso para que o craque chegue tinindo e faminto de bola quando a copa começar, em junho. Torcemos.
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Historiando:
- Por 12 anos seguidos, de 1938 a 1950, a FIFA não realizou a Copa do Mundo em razão da IIª Grande Guerra (1939/45) que devastou a Europa, alastrou-se pelo norte da África e Ásia, e arruinou a economia do planeta. Com Hitler e o nazi-fascismo derrotados, o Japão sob o horror de duas bombas atômicas (uma em Hiroshima e outra em Nagasaki), a humanidade em choque com o extermínio de mais de 50 milhões de pessoas, a competição só voltou a acontecer em 1950, e na ‘distante’ América do Sul, mais precisamente no Brasil.
- Em maio de 1940, às vésperas de Hitler ocupar a França, o presidente da FIFA, Jules Rimet, espertamente, transferiu a sede da entidade para Zurique, na Suíça, um país neutro. Lá foi escondida a taça, dizem que debaixo de uma cama, levada em segredo pelo presidente da Federação Italiana de Futebol (a Itália era a Campeã do Mundo), Ottorino Barassi, para preservar o troféu dos saques de guerra.
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- Em maio de 1949, num trágico acidente aéreo, morreram todos os atletas do Torino, time penta-campeão italiano e base da seleção do país. Um ano depois os italianos, ainda traumatizados, vieram para a Copa no Brasil de navio, em 14 dias de viagem de Nápoles a Santos.
Também chegou ao Brasil de navio a delegação da Inglaterra, numa viagem de 31 dias de Londres ao Rio de Janeiro, com escalas em Paris, Lisboa, Dakar e Recife. Era a primeira copa do time inglês e a primeira vez que os ‘criadores’ do futebol jogavam na América.
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- Em 1950, o Brasil tinha quase 52 milhões de habitantes, 64% vivendo em zonas rurais. O país começava a se modernizar, no entanto a metade da população continuava sem saber ler e escrever. Emilinha Borba era a ‘Rainha do Rádio’ e a TV ainda não estava no ar.
O general Gaspar Dutra era o presidente, mas, duas semanas antes de começar a Copa, o ex-ditador gaúcho Getúlio Vargas, deposto no pós-guerra, em 1945, saiu candidato com o apoio popular pelo PTB às eleições presidenciais marcadas para outubro daquele ano, as quais venceu com 3,8 milhões de votos, que correspondiam a 49% do total. Getúlio tinha 68 anos.
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- O Brasil foi confirmado como sede da Copa de 50 no congresso da FIFA realizado dois anos antes, em Londres. Para a competição, foram construídos os estádios do Maracanã, no Rio, o maior do mundo, e o Independência, em Belo Horizonte. Abrigaram jogos, ainda, o Pacaembu (SP), a Ilha do Retiro (Pe), o Durival de Brito (PR) e o Eucaliptos, em Porto Alegre.
A Fonte Nova, garantia do governador Octávio Mangabeira, não ficou pronta em tempo e só foi inaugurada em 1951. Treze seleções participaram do mundial.
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- No campo de jogo, duas grandes surpresas aconteceram.
A primeira, a maior zebra da história, a vitória do time quase amador dos EUA sobre os ‘donos’ do futebol, a poderosa Inglaterra, por 1 x 0, no Independência (MG), numa partida em que só um time jogou e atacou o tempo inteiro, o inglês, mas ... Segundo o capitão Billy Wright, após o encerramento do jogo: ‘poderíamos ficar jogando o dia inteiro que o gol não sairia’. Caprichos dos deuses da bola.
A segunda grande surpresa foi o ‘Maracanazzo’, a tragédia do dia 16 de julho, a grande final Uruguai 2 x 1 Brasil, de virada. Algo inesquecível para os 200 mil torcedores que conseguiram tomar o Maracanã, ainda com suportes de obras inacabadas, mais uns 30 mil, no mínimo, que se postaram do lado de fora, nos arredores do estádio, e o resto do país inteiro de ouvidos colados nos rádios de válvulas (ainda não existiam os transistores portáteis), um país em prantos.
- Começamos a perder o título dois dias antes, fora de campo, depois de uma vitória estonteante diante da Espanha (6 x 1), com um show de bola de uma equipe que tinha Barbosa, Augusto, Juvenal, Bauer, Danilo, Friaça, Zizinho, Jair da Rosa Pinto, Ademir (o artilheiro da Copa com 9 gols)... e ainda Nilton Santos, Eli, Maneca, Baltazar... um elenco fantástico.
Dali veio a euforia do já ganhou. Jornais estampavam posters do time ‘já campeão’, a concentração foi invadida por políticos e perús de todo naipe apoiados pela mídia esportiva, sobretudo a radiofônica, mas nada haviam combinado com o matreiro o bom time do Uruguai.
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- Depois de um primeiro tempo murrinhento e bem truncado pelos uruguaios, o Brasil marcou logo na saída da segunda etapa, com Friaça deslocando o ótimo goleiro Máspoli, após enfiada do grande Zizinho (o ídolo de Pelé). Mas foi explorando o lado esquerdo defensivo brasileiro, em cima do parrudo e viril Bigode, que os Uruguaios viraram. Giggia recebeu de Obdúlio Varela, fugiu da tesoura aplicada por Bigode, foi ao fundo e rolou para a chegada de Schiaffino que bateu de prima, antes da chegada de Juvenal, empatando, aos 21 minutos. O Brasil em cima, empurrado pela torcida, atacando.
Mas... num contragolpe, Julio Perez e Giggia envolveram Bigode, que foi ao fundo mais uma vez e , ao invés de cruzar como o fizera antes, bateu forte entre Barbosa e a trave, quando já chegava a cobertura de Juvenal, desempatando para os uruguaios e calando o Maracanã e o Brasil inteiro, a 12 minutos do apito final. Foi o único chute em gol do ponteiro uruguaio durante o jogo.
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- O ‘príncipe’ Danilo Alvim, nosso meiocampista, deixou o gramado, meia hora depois, sozinho, ainda em prantos. O Brasil em lágrimas. Foi assim.
- Que dizer agora, 64 anos depois? Que em Copa do Mundo nem sempre o campeão é o melhor time e que jogo não se ganha de véspera. Contenham-se as euforias dentro e fora dos gramados. No mais, reconhecer que os ‘hermanos da celeste olímpica’, à época, tinham uma equipe respeitável e guerreira: Máspoli, Tejera, González, Gambetta, o capitão Obdúlio Varela, Ghiggia, Julio Perez, Schiaffino ... lendas uruguaias. Esquecer... como ?
Agora, também vemos seleções fortes, com condições de enfrentar o escrete de Felipão de igual para igual. Sem otimismos exagerados, sem favoritismo, pois.
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zédejesusbarrêto é jornalista e escrevinhador, baiano