Coragem não faltava ao leão. Certeza de vitória também não. Do outro lado, na mesma fábula futebolística, um time feito de lata. O nome sempre soou como um empréstimo, que precisava de apêndice para lhe garantir certa identidade. Existia ainda na certidão de nascimento, borrada pela máquina de datilografar da década de 1960.
E olha aí, meu guri.
O Bahia de Feira de Santana agora é campeão. Mas a cidade, que por décadas viu o Fluminense local enfrentar um jejum, desaprendeu a torcer. Nem adianta vir com o papo de "eu sou Bahia de Feira desde pequeno" sob o risco de parecer um torcedor retardatário. Além disso, a memória de Sêo Bia entrega quem estiver mentindo, na mesma hora.
Há 42 anos, o feirense não comemorava esse título. E torcedor sem vitórias só tem duas opções: ou fica ranzinza antes da hora ou vira a casaca mesmo. O mais surpreendente é que o resultado deste Campeonato Baiano provou que torcedor precisa mais de um time do que o contrário. Se assim não o fosse, o Bahia de Feria perderia logo a primeira partida por falta de quórum.
O time seguiu em frente e revelou craques como Bruninho. Mas nem mesmo o bom desempenho do grupo garantiu casa cheia nos jogos. Com exceção para a primeira partida da final, quando a arquibancada cheia surpreendeu quem foi ao Joia. Mas ainda assim, o lado tricolor estava longe de ser do tamanho do sonho de Arnaldo Lira.
E foi este mesmo sonho que ergueu a taça nesse domingo. Sonho que se sonha só, com cada um na sua cama. A cidade acordou diferente.
O novo torcedor agora pode estufar o peito para o futebol da cidade, que sobreviveu até hoje sem muito apoio financeiro. É hora de aprender o hino do Bahia de Feira e tirar dez contos do bolso para comprar uma camisa do time no camelô.
As manchetes dos jornais amanheceram mais inéditas hoje, sem a velha previsibilidade do futebol. O futuro do time é incerto. Os atuais craques devem se despedir em breve e outras apostas virão. O que importa é que a partir desta segunda-feira, o Bahia de Feira passa a adotar seus torcedores, sem escolher sexo ou fazer distinção de cor.
Antes tarde do que nunca. Seja num corpo de leão, touro ou lata. Peito enferrujado também merece um coração.
Egberto Siqueira
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