Ao anunciar em sua visita ao México nesta semana o início de negociações para um acordo comercial amplo com o país, a presidente Dilma Rousseff afirmou que o Brasil faria um "esforço maior" para ampliar e diversificar seu comércio externo.
Ao anunciar em sua visita ao México nesta semana o início de negociações para um acordo comercial amplo com o país, a presidente Dilma Rousseff afirmou que o Brasil faria um "esforço maior" para ampliar e diversificar seu comércio externo.
Mas analistas ouvidos pela BBC Brasil se dividem sobre os efeitos do acordo e listam dificuldades para que o governo de fato se abra mais ao comércio global.
Longo caminho
O novo acordo com o México começará a ser negociado em julho e poderá levar vários meses para ser concluído, segundo diplomatas. Para vigorar, ele também terá de ser aprovado pelos Congressos dos dois países.
Hoje, Brasil e México mantêm acordos que reduzem as tarifas de 12% dos itens negociados entre os dois países, em sua maioria carros e outros itens industrializados. Com o novo acordo, o governo quer abrir espaços no México para produtos brasileiros nos setores de eletroeletrônicos, calçados, têxteis e agropecuário.
"O fim do superciclo das commodities faz com que nós tenhamos de ter um esforço maior na área internacional no sentido de buscar acordos fora dos tradicionais acordos de compra de commodities - o que não significa que a gente vai deixar de olhar para as commodities", disse Dilma na quarta-feira.
Com a postura, o governo tenta aliviar o impacto da queda nos preços das matérias-primas na economia brasileira nos últimos anos. Entre 2002 e 2012, a valorização desses itens foi um dos principais combustíveis para o crescimento econômico do Brasil e de países vizinhos. Entre as principais commodities exportadas pelo Brasil estão a soja, o minério de ferro e o petróleo.
Atribui-se a redução dos preços à desaceleração da economia da China, maior compradora de matérias-primas. Num sinal dos ventos negativos, no ano passado o Brasil fechou sua balança comercial no vermelho pela primeira vez desde 2000. O deficit alcançou US$ 3,9 bilhões (R$ 12,3 bilhões).
Mudança de postura
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) elogiou o arranjo com os mexicanos, que busca reduzir as tarifas nas transações entre os dois países. Em entrevista à BBC Brasil na segunda, o presidente da entidade, Robson Andrade, disse que o governo está começando a enxergar as oportunidades do comércio global e sentindo a necessidade de ampliar os acordos que regem essas trocas.
O acerto com o México, porém, só foi possível por causa de uma brecha do Mercosul. O bloco, que o Brasil integra com Argentina, Uruguai, Paraguai e Venezuela, proíbe seus membros de negociar individualmente com outros países reduções tarifárias. Segundo diplomatas brasileiros, a restrição só não se aplica ao México.
Dilma disse que o Mercosul poderá ainda negociar acordos comerciais com outros países, como Colômbia e Chile. Ela afirmou ainda que pretende definir uma data para a troca de ofertas entre o Mercosul e a União Europeia, que desde 2000 negociam um acordo de livre comércio.
Segundo a presidente, é possível que alguns países do Mercosul entrem no acordo antes que outros, já que membros do bloco divergem sobre os termos do arranjo.
Mais liberdade
Para Bruno Lavieri, analista da consultoria Tendências, os membros do Mercosul deveriam ter a liberdade de negociar individualmente acordos comerciais com outros países. Ele diz que a negociação com o México é bem-vinda e que o Brasil deveria buscar acertos comerciais com outros mercados importantes, como os Estados Unidos.
O comércio será um dos principais temas da visita de Dilma Rousseff a Washington em junho. Os dois países deverão anunciar medidas para facilitar as trocas nos setores de cerâmica, máquinas e materiais de construção por meio da unificação de padrões e outras medidas técnicas. O Brasil espera ainda que os americanos retirem as barreiras à compra de carne brasileira in natura.
A CNI e o Brazil-US Business Council, grupo que representa 110 empresas americanas com negócios no Brasil, defendem que os dois países negociem um acordo de livre comércio que ponha fim às tarifas nas transações entre ambos os países, mas a meta esbarra nas restrições atuais do Mercosul.
Bruno Lavieri diz que o bloco falhou em promover o livre comércio, citando barreiras existentes em transações entre seus próprios integrantes. "O Mercosul é uma opção muito mais diplomática que comercial", afirma.
O analista se diz cético quando ao discurso de Dilma em favor de uma maior abertura comercial. Segundo ele, o governo aumentou o "protecionismo" e relegou a política comercial ao segundo plano nos últimos anos.
"Isso tem muito a ver com a cabeça da equipe econômica e da própria Dilma, que enxerga com bons olhos elevar barreiras para proteger produtos nacionais."
Fora da 'primeira divisão'
Para Plínio Sampaio Júnior, professor de economia da Unicamp, a indústria brasileira não tem hoje condições competições de competir "na primeira divisão" do comércio internacional e seria prejudicada por uma abertura maior.
Sampaio Júnior diz que a expectativa do Brasil em seu acordo com o México "é fazer uma raspa do tacho para ver se há algum nicho de mercado" em que produtos brasileiros possam entrar para amainar o impacto do ajuste fiscal.
O professor afirma ainda que o próprio ajuste fiscal – economia de recursos do governo para equilibrar as contas públicas e evitar o rebaixamento da nota de risco do Brasil – é incompatível com uma política comercial mais ambiciosa.
Segundo ele, o ajuste promove a recessão e aumenta a exposição do Brasil à concorrência internacional, fragilizando as empresas nacionais. "(O acordo com o México) demonstra a mais absoluta falta de plano estratégico, um desespero para sobreviver em um cenário internacional muito difícil."