Um boteco de categoria e que serve todas essas comidinhas baianas - sarapatel, feijoada, maniçoba, carne de fumeiro, carne de sol e moquecas
Sempre que vou a Boca do Rio lembro da diagramadora Cidélia Argolo, do cronista Béu Machado e dos irmãos Umberto (artista visual) e Aurélio Velame (jornalista).
Isso porque nos anos 1970, quando a Boca ainda era um bairro pequeno e o Alto do São Francisco onde eles habitavam, um local super valorizado pela vista do mar aberto Atlântico na direção da Praia dos Artistas, de saudosa memória, todo mundo descolado queria morar na Boca.
A Boca tinha vários botecos e o Panelinha, onde se servia uma das melhores feijoadas da city, e nosotros lá pelas altas horas gostávamos de promover tertúlias para discutir o nada, papo de jornalistas, no Boteco de Sêo Lisboa, um típico 'cacete-armado', admirável, geladas no ponto e boa pinga de infusão.
Eu morava no Chame-Chame, distante da Boca, mas quem rejeitaria um papo com Béu e Aurélio, dois autênticos anarquistas da melhor cepa? E as frase enigmáticas e abreviadas de Umberto! Pra pensar, pra refletir. E mais o bom humor, sempre, de Cidélia!
Tudo isso, claro, regrados a geladas, quentes, tira-gostos numa cidade que não havia assaltos e a gente ficava até às madrugadas papeando, 'derrubando governos', sonhando com soluções ideias para o Brasil e assim por diante.
Esta semana voltei a Boca desta feita para conhecer A Venda, restaurante veterano no projeto Comida di Boteco, dito em sua propaganda 'a melhor maniçoba da Bahia'.
A Venda - nome belissimo, simpes, e que remete aos pequenos armazéns de secos e molhados, as vendas - é mais do que um boteco na definição clássica de boteco, ao estilo do Lisboa ou do Bigode, em Itapuã, com tamboretes, fogãozinho e garrafas de infusão nas prateleiras - pois é um restaurante amplo, com dois ambientes (um deles climatizado e outro uma varanda com vista para o Atlântico), localizado na Avenida Iemanjá, que sequer existia nos anos setenta.
A casa de dona Neide tem um atendimento primoroso, como um boteco de qualidade deve ter, e comidinhas daqueles que a gente ainda chama de caseiras, evidente, com toques de cozinheiras estilo 'chefs' de cousine.
Ora, direis que fui atendido, como gosto, por garçom veterano da casa, o José Coelho, o qual deixou-me a vontade para escolher o que quizesse entre a maniçoba, a feijoada, o sarapatel ou a carne de fumeiro.
Falei para Coelho: - Eu quero experimentar a Flor de Maniçoba, o petisco que concorreu ao Comida di Boteco 2016 e levou a medalha de prato.
Coelho advertiu: - É um petisco delicioso, mas, não chega a ser uma refeição.
- Para meu paladar está de bom tamanho - consenti - explicando que não tinha apetite para uma maniçoba com arroz, integral.
- O senhor vai gostar porque é um prato delicioso - soletrou Coelho.
A Venda tem decoração simples com quadros de recortes de jornais da matérias sobre a casa e dona Neide, explicações sobre a cultura gastronômica de origem indigena da maniçoba - iguaria preparada com as folhas tenras da mandioca, trituradas e acrescidas de carne suína e temperadas com alho, sal, louro, pimenta - troféus do Comida di Boteco, tudo muito simples, clean, ainda com a decoração junina com bandeirolas, bem agradável.
O cardápido segue o mesmo modelo, com um painel formato A-4 plastificado, onde estão as comidinhas, as bebidas, os aperitivos e os preços dos produtos. Com a alta do feijão, dona Neide improvisou na base do 'bolígrafo' uma emenda no preço da feijoada que saltou de R$60,00 para R$70,00 (para duas pessoas) e 1/2 feijoada R$55,00. Faz parte do show dos botecos essas rasurinhas.
O elegante Coelho reaparece após uns 15 a 20 minutos com o premiado Flor de Maniçoba - bolinho em forma de uma pétala feito com carne de maniçoba - postos sobre folhas de alface e uma cumbuqinha com pimenta no estilo vinagrete.
Olha! Valeu a prata. Diria até que valeria o ouro. Delicioso petisco. Forte, picante, arrojado.
Recomendável com uma long-neck no modelo Patagônia.
De longe, Coelho observava meus movimentos.
- E aí gostou? - perguntou-me com economia de palavras.
- Muito bom. Um prato tupinambá dos melhores, digno do guerreiro Abaeté.
Coelho sorriu. E foi atender outros clientes.
De sobremesa, para contrabalançar com a acidez do Flor solicitei um pudim de leite, da Doce Fajia, desses que vem naqueles copinhos de plástico, industrializados, pero, delicosos.
Quando estou saboreando o pudim, Coelho comenta: - eu faço um pudim pra saborear com pêssego pra ninguém botar defeito.
Duvidei.
- Você não tem cara que é bom doceiro - falei.
- Podes crer. Hoje, não faça mais o pudim porque minha esposa é campeã nesse 'poster'.
- Tá muito bem, obtemperei.
Pra fechar a conta e o almoço, Coelho brindou-me com dois "nego-bons" ou "atum" doce feito com banan prata, açúcar e limão.
Levei-os de presente para la señora Bião de Jesus, a qual cuidava da coluna com pilates.
É isso: uns saboreiam maniçobas e outros estiram o corpo.
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A VENDA - Bar e Restaurante
Av Iemanjá, 100/A
Boca do Rio - Salvador - Bahia
(Em frente ao ex-Aeroclube Plaza Show)
71. 3362-5673 9985-3077
restaurantevenda.blogspot.com
avenda.barerestaurante@gmail.com
Diariamente das 11h às 18h
Estacionamento na rua
Não tem manobrista
Ambiente climatizado
Flor de Maniçoba R$25,90
Long neck R$7,00
Pudim R$8,00
'Nego-bom' - brinde
Maniçoba com arroz R$60,00 (duas pessoas)
1/2 maniçoba com arroz R$50,00
Fim de semana é bom fazer reserva
Aceita todos os cartões
Classificação 3 DONS