Direito

BAHIA SÓ CONSEGUE APURAR 10% DOS CASOS DE VIOLÊNCIA SECUAL INFANTO

VIDE
| 18/05/2011 às 18:40
   Apesar da Bahia ser o estado que mais denuncia casos de violência sexual contra crianças e adolescentes, conforme revelam os dados da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República (SEDH), apenas 10% dos casos são de fato apurados.

  Somente em Salvador, das 5.757 denúncias registradas de 2008 a março deste ano na Delegacia Especializada em Crime Contra Criança Adolescente (Derca), somente 479 estão em apuração e 56 procedimentos foram instaurados.


  No interior do estado, 23 municípios repassaram, até o momento, os dados ao Ministério Público, indicando que ocorreram nesse mesmo período 2.683 denúncias de violência sexual, com 1.963 inquéritos requisitados e apenas 80 concluídos.

  ORÇAMENTO

  De acordo com a promotora de Justiça Márcia Guedes, que coordena o Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça da Infância e Juventude (Caopjij), esses dados preocupam, revelando a necessidade de incremento do orçamento para a área da infância e juventude, com criação de novos programas, ampliação do número de delegacias e melhor estruturação da já existente, e efetivação de políticas de acolhimento às vítimas.

"Esperamos que, a partir do panorama real, quando tivermos o levantamento dos dados dos 417 municípios, possamos contribuir para a implementação de políticas públicas em todas as esferas de governo para melhoramos a situação das crianças e adolescentes vítimas de violência no nosso estado", disse a promotora na abertura do 'Seminário 18 de Maio. Esquecer é permitir. Lembrar é combater', que está sendo realizado durante todo o dia no auditório do MP baiano.

Ainda de acordo com a promotora de Justiça, a mobilização popular e da sociedade civil organizada sobre a importância de denunciar os casos de violência sexual contra crianças e adolescentes e as campanhas publicitárias como as realizadas pelo Ministério Público estadual - com o apoio de artistas como Ivete Sangalo, Cláudia Leitte, Bell Marques, Durval Lélys, Margareth Menezes, Carlinhos Brown e Tatau - colocam a Bahia na frente do ranking nacional de denúncias recebidas pelo Disque 100 da SEDH.

"A Bahia não é necessariamente o estado onde existem mais casos de violência sexual contra crianças e adolescentes, mas é o mais consciente da importância de denunciar", explica. Entretanto, ressaltou o coordenador do Comitê de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, Waldemar Oliveira, a impunidade pode resultar no desestímulo das pessoas em denunciar.
 
"Quando uma pessoa faz uma denúncia, quer que o agressor seja de alguma forma punido. Se isso não acontece, há um descrédito e elas não voltarão a denunciar", destaca Waldemar, frisando que são necessárias medidas urgentes para mudar essa realidade, como a criação de mais delegacias especializadas em crimes contra as crianças e adolescentes. "Não podemos continuar com apenas uma delegacia especializada em um estado que possui 417 municípios", protestou.

Presidindo a mesa de abertura do evento, o chefe do Ministério Público baiano, procurador-geral de Justiça Wellington César Lima e Silva, falou sobre a importância de se garantir orçamento para a infância e juventude, mas frisou que além dessa garantia é preciso mobilização. "É insuficiente apenas a alocação de recursos sem a devida mobilização e concentração de esforços, energia e inteligência em favor das soluções", observou o PGJ. Segundo ele, a resolução de muitos problemas encontra uma importante resposta no suporte material, "mas certamente essa não é a única saída".
 
"Ainda que tenhamos todos os recursos materiais, será preciso a sensibilidade necessária para tratar a questão com prioridade, não apenas no orçamento, mas também com a incorporação na cultura e na prática, de tal modo que a preservação da infância e juventude seja permanentemente sublinhada", concluiu, convidando a sociedade à mobilização e garantindo o apoio do Ministério Público.
 
Também compuseram a mesa de abertura do evento o subsecretário de Segurança Pública Ary Pereira de Oliveira; a sul-africana Caroline Bews, coordenadora da ONG Jo'Burg Child Welfar; e os coordenadores do Fórum Estadual do Direito da Criança, Edmundo Ribeiro Kroger, e do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA), Renildo Barbosa.

Abordando o tema 'O panorama da violência sexual contra crianças e adolescentes. O olhar da Segurança Pública', a diretora do Projeto Viver da Secretaria de Segurança Pública (SSP), Débora Cohim, falou sobre a atuação da secretaria e apresentou as dificuldades da investigação policial desses crimes.

Segundo ela, um dos principais entraves é o fato de que os agressores são geralmente pessoas próximas das vítimas e o crime ocorre principalmente no espaço doméstico, fazendo com que a criança tema denunciar. A vulnerabilidade das crianças e adolescentes, que são mais facilmente intimidadas a omitir a violência, é outra dificuldade. A peculiaridade da natureza do crime foi outra questão citada. Segundo Débora, dificilmente há testemunhas para este tipo de crime, cabendo à palavra da vítima o status de prova mais importante da investigação, e, como cerca de 90% dos crimes são atos libidinosos diversos à conjugação carnal, o exame de corpo de delito é inapto para provar a ocorrência da violência. Ela ainda informou que a SSP oferece um serviço especializado (com atendimento social, médico, psicológico e jurídico) às pessoas em situação de violência sexual, através do Projeto Viver, que mantém unidades no Instituto Médico Legal Nina Rodrigues e no Complexo Policial de Periperi.

Também na manhã de hoje, a defensora pública Hélia Barbosa falou sobre 'A proteção da dignidade sexual de crianças e adolescentes'. Segundo ela, a violência sexual é uma transgressão aos direitos humanos e à dignidade sexual de crianças e adolescentes, pois é um crime contra a liberdade sexual. A defensora pública afirmou que "enfrentar a exploração sexual infanto-juvenil exige articulação constante, eficiente e eficaz entre as nações e continente, na consideração de que é um crime de natureza transnacional, e que tem possibilitado diversas interpretações e óbices". " É preciso compromisso, vontade política com sentimento de Justiça e equidade, e, sobretudo, solidariedade. Olhar a criança como criança e com a criança", concluiu. O seminário faz parte da mobilização que ocorre em todo o país nesse 18 de maio, 'Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes'.