É muito drama num livro só. Um permanente suspense psicológico com narrativa indefinida: Verity era uma vilã ou uma sofredora? Os leitores vão trilhar por essa dúvida o tempo todo.
Rosa de Lima , Salvador |
15/02/2025 às 11:10
"VERITY", de Collen Hoover
Foto: BJÁ
Collen Hoover é uma jovem escritora norte-americana que tem surpreendido o mundo literário nos EUA e em parte do Ocidente com seus picantes livros sobre romances com enredos sexuais fortes no segmento “Young Adult”.
E escreve muito bem com diálogos excitantes e narrativas onde mescla suspense com ardentes paixões, por vezes crimes e crueza no relacionamento de casais alarmantes daí que seus livros se tornaram “best-sellers" e têm figurado na lista de books mais vendidos em vários países.
E, chegou ao Brasil com força e tem agradado o público que, nesse segmento, é crescente e as livrarias estão repletas de títulos de autores (as) nacionais e estrangeiros, muitos dos quais se transformando em série Netflix.
Já comentamos aqui uma de suas obras "O Lado Feio do Amor" no final do ano passado e agora voltamos a esta autora para falar de uma das suas obras mais pungentes intitulada "Vetity" (Editora Record, RJ, selo Galera, tradução Thais Britto, 2024, 317 páginas, R$40,27 Amazon) como bem disse Tarryn Fisher, co-autora da série Nunca Mais, "Distintamente sinistro, com um verdadeiro toque de CH. Por anos esperei um ‘thriller’ como este".
E, de fato, ainda que não haja nada que se possa considerar "distinto" na acepção do vocábulo (legal, insigne, bem-conceituado) em “Verity” o que podemos observar é um enredo dramático, cruel, agressivo, mesmo se considerarmos ser obra de ficção.
O público “Young-Adult” (diria sem um conhecimento de valor mais abalizado) adora esse tipo de narrativa no fio da navalha, na ponta da faca, em que um final feliz nunca parece ser presumível. Pelo menos, na expectativa dos leitores.
Eu, admito, sou assim. Mas, também é bom que se diga, os leitores têm percepções distintas e alguns deles preferem que finais sejam ainda mais dramáticos do que se espera. Faz parte da percepção dessa nova geração de leitores.
E, em “Verity”, a autora, por posto, depois de narrar o drama de uma escritora de sucesso que perdeu as duas filhas ainda na pré-adolescência e verificar acusações do seu marido colocando-a como culpada pelas mortes das meninas é assassinada por ele e uma amante.
Mais dramático do que isso, impossível. O importante a observar, no entanto, é que a imaginação de Hoover parece não ter fim e a cada livro que publica (e já são mais de dez) as narrativas são mais competentes, atraentes, complexas e prende os leitores de tal forma que é muito difícil não ficar (ao menos) ansioso (a) na leitura dos seus textos.
A autora norte-americana ‘best-seller” com “Confesse” e “Novembro, 9” no “O Lado Feio do Amor” conta a história de um jovem piloto de avião (Miles) que vive em São Francisco, na Califórnia e vai se envolver em romance com a irmã (Tate) de um colega residente próximo a ele, no mesmo prédio de apartamento, ambos com problemas psicológicos distintos.
Em “Verity” a narrativa é mais complexa tanto que a autora não o escreveu sob a encomenda da sua editora, mas, com a pena livre e o pensar solto, sem compromisso, e produziu uma obra saliente, florescente, ficção que também é possível de acontecer na vida real.
Uma das personagens principais (Lowen) cai de paraquedas na vida de Jeremy, corretor de imóveis bonitão e boa praça marido de uma escritora consagrada e paraplégica (Verity Crowford) e vai se envolver na trama como escritora substituta, uma vez que a famosa (Verity) não tinha mais condições de atuar.
E como seus livros faziam grande sucesso e a roda da fortuna não poderia parar cabe a Lowen, escritora do segundo “time”, falida, a tarefa de complementar títulos de uma série, numa escolha aleatória da editora.
Lowen, a pedido dos editores, vai residir na casa onde moravam Jeremy e Verity, mais um filho pequeno do casal adorado pelo pai, local que também era habitado (em turnos ou plantões) por enfermeiras que cuidavam da doente vivendo praticamente com morte cerebral numa cama.
É nesse ambiente pouco inspirador que Lowen descobre manuscritos de Verity narrando como era sua vida conjugal, como amava mais o marido do que as filhas e se sentia desprezada por ele, e “como cometera os dois crimes” (não há aceitação de forma direta), o primeiro de negligência deixando de uma das filhas comesse amendoim e morresse de infecção, e o outro provocado por afogamento num lago onde também quase morre o terceiro filho.
A autora, então, vai mesclando nascente caso de paixão entre Jeremy e Lowen, no decorrer do conhecimento de ambos, como ela o achava tesudo e irresistível, porém, preocupada e tentando se focar na sua missão literária.
Ao mesmo tempo em que sentia fogo de paixão por Jeremy e dó por Verity, ao ler os manuscritos descobre o que considera a realidade dos fatos, sobretudo a frieza e perversidade da escritora, e como aquela casa parecia de terror na medida em que, também percebe, sinais de que Verity fingia ser paraplégica e estava astuciando tudo entre a escritora contratada e seu marido, e a vida do seu filho mais novos.
Sinais que foram capitados aos poucos no movimento de cabeça da escritora, viu-a, de repente sentada na cama quando a enfermeira tinha ido embora e, apavorada, pede a Jeremy para colocar uma fechadura no local que trabalhava. E, ele, ao fazê-lo, colocou-a por fora do gabinete, o que a deixou ainda mais sobressaltada.
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Esse é o fulcro do romance. E enquanto Lowen vai tentando explicar para Jeremy que sua esposa era uma fingida e ela corria risco de vida naquela casa maldita, ele desconversava e dizia que ela estava tendo visões amalucadas e teria que se conter.
Muito de lances da psicologia comportamental entra nesse momento do livro, sobretudo quando o relacionamento dos dois se efetiva em sexo.
A essa altura e no decorrer do processo os dois já estavam envolvidos na cama e no suor da atividade sexual frequente e incontida quando, num lance que envolve Crew (o filho menor se ferindo com uma faca) Jeremy acaba se convencendo que, de fato, a escritora famosa era uma mistificadora.
E, se ele não conseguiu matá-la num simulado acidente de veículo, agora, por sugestão de Lowen a solução era efetivar a morte afogada em travesseiros. O que, de fato, acontece.
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É muito drama num livro só. Um permanente suspense psicológico com narrativa indefinida: Verity era uma vilã manipuladora da própria vida e fingia estar doente para planejar a fuga com o filho menor ou, de fato, amava as filhas e o marido de forma plena e queria seguir com ele?
Verity tinha créditos suficientes e era famosa e aclamada pela crítica e pelo público e, de repente um acidente de carro que teria sido provocado pelo marido com o propósito de se vingar da morte das filhas, interrompe suas atividades literárias, mas, ela não morre e passa a viver numa cama hospitalar, em casa.
Os leitores se veem diante de um cenário ambíguo, incerto. Em quem acreditar? Na escritora ou no seu marido?
A autora produz um fingimento tão perfeito que o marido, (antes disso já havia abandonando a carreira de corretor para viver às custas do sucesso - e do dinheiro - da mulher, acreditava piamente nela e se vê entre a cruz a e a espada.
só vai abrir os olhos graças a Lowen, ao acidente da faca com Crew e a uma nova correspondência descoberta.
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Lowen, personagem que surgiu do acaso, a partir de um acidente no centro de NY quando um ônibus esmaga a cabeça de uma pessoa e respingos de sangue sujam sua roupa e é socorrida por Jeremy que lhe oferece sua camisa. E, por coincidência. quando chega na editora descobre que ele é o marido de Verity.
Mas, Verity não estava morta. Só fingia. E vê tudo entre os dois (Lowen e Jeremy) em sua casa e a autora incrementa o romance e aumenta o suspense, as cenas de pavor, de horror, até o desfecho final que é a morte definitiva da escritora famosa
Narrativa das melhores, forte, “alfrediana” - de Aldred Hitchcok.