Cultura

OS MISTÉRIOS SOBRE DIOGO E CATARINA PARAGUAÇU E O FRANCÊS CARTIER (TF)

Tudo teria começado com as expedições do italiano Giovanni Verrazzano e uma das suas naus que se dirigia a NY foi parar na Baía de Todos os Santos
Tasso Franco , Saint Malo, França | 07/06/2022 às 05:34
Jaques Cartier, a gravura mais conhecida do navegador francês
Foto: REP

Esta viagem que realizei a Saint-Malo, noroeste da França, localidade onde aconteceu o batizado da tupinambá Quayadin, em 31 de julho de 1528, só fez aumentar as incertezas sobre o casamento de Diogo Álvares (Caramuru) e Catarina Paraguaçu e como se deram as relações do navegador francês Jaques Cartier com o casal, a ponto de levá-los para a França e convertê-los a fé católica.

     A vida de Diogo Alvares - sua origem real e a data de chegada a Baía de Todos os Santos - ainda são um mistério. Historiadores citam (aleatoriamente) sua presença no território adjacente a Baía de Todos os Santos, entre 1509/1510. Mas, não existe uma documentação primária sobre essa chegada. E há dúvidas se Cartier levou para a França somente Catarina ou o casal. As publicações na França registram apenas a presença de Catarina.

    O certo é este cidadão europeu - português, espanhol ou francês?! - viveu entre os tupinambás antes da colonização propriamente dita do Brasil iniciado com o regime de Capitanias Hereditárias editado pelo rei dom João III, em 1534 - o capitão donatário da Bahia, Francisco Pereira Coutinho só chegou em 1536 - e teve vários filhos com Catarina Paraguaçu e outras mulheres e sua relação com Jaques Cartier data de 1527/1528 quando, ao participar de um expedição exploratória a Terra Nova (hoje, Canadá) na frota do navegador italiano Giovanni da Verazzano teria aportado na Baía de Todos os Santos diante de uma tormenta e desvio da rota.

    Diz-se que o entendimento entre Diogo Álvares e Cartier foi possível porque o marinheiro francês (Cartier) falava português. Em sendo assim, Diogo seria um português. 

   Mas, quem, afinal, deixou Diogo na Baía de Todos os Santos? 

   O poema épico (Caramuru) do frei Santa Rita Durão foi escrito em 1781. Só após esse livro é que Diogo passou a ter a alcunha de Caramuru, náufrago que teria atirado com um arcabuz a matado uma ave, sendo poupado da panela antropofágica dos tupinambás, que o saudou como o "rei dos trovões". 

   Mas, isso foi pura imaginação da pena de Durão criando essa lenda que não tem nada a ver com a realidade. No entanto, as pessoas (e até alguns historiadores) confundem as bolas e acreditam na lenda.

    Em Saint-Malo pude observar que não há referências a Diogo Álvares durante o batismo de Catarina na basílica de São Vicente. Então, ao que se supõe, Cartier embarcou somente Catarina na frota de Verazzano (o qual morreu nas Antilhas em contato com índios antropófagos que o comeram) e a levou para sua casa na rua Buhen (hoje, Chateaubriand), no centro de Saint Malo, onde vivia com sua esposa Catehrine de Granches.

   Uma outra questão intrigante é quando (a data?) que Catarina retorna ao Brasil e quem a trouxe. A primeira expedição oficial de Cartier ao Hemisfério Norte só vai acontecer em 1534 quando descobre o Canadá francês e não passou pela Bahia. Essa questão, portanto, está em aberto precisando ser mais pesquisada.

   A estadia de Catarina na casa de Cartier é outro mistério. A única documentação é a certidão de batismo da basílica de São Vicente, de 31 de julho de 1528. Hoje, existe o Museu Jaques Cartier erguido numa quinta que o francês comprou após a conquista do Canadá, a partir de 1536 quando retornou do Norte, a mansão campestre de Limoëlou que é o único legado de Jacques Cartier, em Saint-Malo, mas só contém referências ao Canadá.

  Ou seja, muita coisa carece de pesquisas nessa estada de Catarina em Saint-Malo. É provável que sua volta ao Brasil e a fundação da capela de Nossa Senhora da Graça, em Salvador, 1535, só tenha ocorrido nessa época. O que significa dizer que Catarina pode ter ficado na residência de Cartier durante 6 anos, entre 1528/1534 (e até aprendido a falar francês).

  Em Viana do Castelo, Portugal, provável local de nascimento de Diogo Alvares também não existe uma documentação sobre ele e sim referências ao donatário de Porto Seguro, Pero de Campos Tourinho, que era desta localidade e manteve um contato com Diogo na época da invasão tupinambá a Vila Velha do Pereira (hoje, Porto da Barra) sede da capitania hereditária. Pereira se refugiou em Porto Seguro e teria levado consigo Diogo para pedir um SOS a Tourinho.

  Nessa viagem ocorreu mais uma suspeita, pois, Tourinho, ao ouvir a fala de Diogo entende ele ser um 'galego lingua'. Um espanhol da fronteira de Portugal com a Galicia. Esse é outra grande dúvida.

   E uma terceira - mais complexa - é a hipótese de Verrazzano ter deixado Diogo entre os tupinambás da Baía de Todos os Santos (entre 1527/1528) - ainda não era chamada de Bahia - pois na viagem dessa esquadra de Verrazzano no retorno a França, um navio retornou a Saint-Malo carregado de madeira, em 1528. 

   É provável que Diogo tenha sido um ponta de lança no comércio da madeira com Verranzzano (e com a morte deste, com Cartier). E, nesse vai e vem de naus carregadas de madeira é possível que Catarina tenha retornado a Bahia sem a necessária presença de Cartier, uma vez que as naus já conheciam essa rota comercial. 

  A questão é que não existem registros dessas navegações clandestinas e como o rei da França não reconhecia o Tratado de Tordesilhas que dividia o Novo Mundo entre espanhóis e portugueses, permitia essas aventuras, mas não controlava. (TF)