A impressão que tive ao retornar da "Bertrand" para o "Café A Brasileira" é de que as Jesus estavam mais alegres, quase salientes, e imaginei que fosse o efeito das taças de vinho. Só imaginei, mas nada falei. A tarde havia caído e a noite se apresentava dando-nos boas vindas. Lembrei-me do garçom Paulo, do Adriano, o qual nos recomendou que fôssemos a "Tasca do Chico", uma casa de fados popular. 

   Buscamos na  internet onde ficava o estabelecimento e minha neta, ás em manobrar um iPhone, disse que se situava na Alfama. Ponderei, então, que o recomendável era pegar um táxi na fila dos negros e verdes ao lado da Igreja de Nossa Senhora do Loreto. 

  E lá fomos nós. Aboletei-me num Mercedes Benz parrudo, o primeiro da fila, e as Jesus no banco traseiro. Falei para o motorista, um português de cabelos brancos, mais para gordo do que para magro, visto aos meus olhos num relance inicial como cara de mal humorado, e falei: - Vamos a Tasca do Chico na Alfama. 

  O gajo moveu o veículo e subiu nas tamancas portuguesas: - A Tasca do Chico é no bairro Alto, aqui ao lado - adiantou o carro subindo em direção a Misericórdia. - É perto, dava pra vocês irem a pé. Respondi que na internet mostrava que era na Alfama. - Que internet que nada, é aqui, e com menos de 4 minutos de corrida parou o carro num meio fio e mandou que saltássemos, atravessássemos a rua que chegaríamos na tasca. 

  O taxista estava bravo, quase espumando. Paguei 3 euros e o português saiu bufando. A senhora Bião, séria, mas, a ponto de gargalhar disse: - Você azucrinou o taxista e o homem perdeu a fila dos táxis para viajar menos de 300 metros. - O véi ficou bravo, comentou minha neta já andando pela Rua do Norte, em direção a tasca. - Ora, o que você me disse da recomendação da internet e a Alfama fica distante daqui, emendou. 

 Chegamos a Tasca do Chico e o local estava fechado. O show só começava às 20h30min. Mas, felizmente apareceu um senhor que nos apresentou o local e fez uma reserva. Eu disse: - E agora, o que faremos? A senhora Bião comentou: - Vamos jantar num desses restaurantes aqui desta rua e depois voltaremos a tasca.

  Por coincidência, um garçom do "Retiro dos Sentidos", situado em frente a Tasca, nos convidou para conhecer a sua casa e disse que a comida era deliciosa e ainda haveria fadistas, gratuitamente. - Aqui só paga o jantar e o show é gratuito.

  Em instantes estávamos sentados numa mesa próximo a área dos fadistas.

  Lisboa tem cada nome para seus sítios históricos, becos, ladeiras e ruas bem sugestivos, originais, que só são encontrados nesta cidade. Salvador, em parte, também tem alguma coisa parecida. E isso também é extensivo aos restaurantes daí até ficar difícil para as pessoas entenderam o que significa, por exemplo, Retiro dos Sentidos, nome de uma típica casa portuguesa abençoada por dezenas de imagens de Santo Antônio, na rua Diário de Noticias, bairro Alto, onde há fado e comidinhas deliciosas.

    Essa rua que remete a um jornal famoso de Portugal é um dos redutos de fados da cidade. O Retiro dos Sentidos, em sí, não é uma casa de shows de fados que se paga a entrada e sim um restaurante onde se toca fados com Hugo Queixão, no violão; Nuno Castro, na guitarra portuguesa; Eduardo Almeida e Dina do Carmo fadistas desses bem emocionais como devem ser os cantores de fado. Ambos, muitos bons. E a dupla das violas competente, bem articulada. 

   Serviu-nos nesta jornada a yo, la señora Bião de Jesus e minha neta Luna Rosa a garçonete Carina muito atenciosa e paciente. Até porque la Bião estava numa alegria enorme e minha neta a dizer que a tia iria ver Jesus no bairro Alto visto o tinto Duque de Viseu ter lhe alegrado um pouco além da conta.

   Às 19h em ponto, Almeida executou um belíssimo fado e abriu a noite. Queixão pediu que eu tirasse o flash do celular ao filmar para não desconcentrar o cantante e logo o atendi, minha neta a reprimir-me educadamente.

    Aplausos no primeiro intervalo e uma rodada de pães, azeitonas, queijo Nisa e bolinhos de bacalhau. O Duque de Viseu com aroma suave, macio, mas que pega, corria a larga e no segundo ato com Dina do Carmo a cantar, a euforia da señora Bião aumentou. Minha neta arreliava: - Eu avisei que a maldição da bota iria acontecer. 

   E, de facto, como escrevem os portugueses, aconteceu com a lady dando vivas e bravos a cantante do Carmo.

   O que se passou em seguida foi objeto de muitas risadas sobretudo quando Carina trouxe-nos a pedida principal da noite um pernil a padeiro. 

  Luna Rosa foi a primeira a arreliar: - É um prato para um batalha. Para Sêo Dino e todos os ajudantes de pedreiros que atendem minha vó Leda, comentou. - Imagino que a jovem Carina tenha entendido que estávamos com fome de leões, acrescentei lembrando do padeiro Cabinho. - Ora, que venha o pernil à gosto, disse la Bião armando-se com garfo e faca.

   Travou-se, então, a 'guerra', mas, confesso que fomos vencidos pelo pernil a padeiro uma vez que nossa fome não era tanta, já havíamos petiscado no Café a Brasileira, mais cedo, e as entradas do Retiro dos Sentidos foram fartas e também deliciosas. 

    Belíssima noite no Retiro que, literalmente, não tem nada de retiro espiritual ou de descanso, mas, de aplausos, bravos, movimentação de pessoas no belo salão e fados executados com maestria. 

    Mi nieta comprou um CD do Eduardo Almeida autografado pelo fadista para seus pais José Gonçalves e Hilma e ainda fez uma transmissão ao vivou pelo iPhone direto com a professora que levou a educadora às lágrimas.   

   O Retiro dos Sentidos tem dois ambientes e a casa é bem decorada à moda portuguesa com pratos nas paredes e santos, espaço amplo interno; e um outro na rua sob sombreiros.

 

   Assiste-se a performances de fado sem, necessariamente, comparecer a uma casa show de fados. O Retiro não cobra consumação e vale (e paga-se) apenas o que se consome.

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Retiro dos Sentidos

Rua Diário de Noticias, 40

Bairro Alto, Lisboa

Fone: 925 934 014

Fim se semana reserve

Duque de Viseu 20 euros

Pernil a padeiro 13 euros

Queijo Nise 5 euros

Azeitonas 2 euros

Classificação 3 DONS