Cultura

LISBOA, CAP 9: MUSEU DE ARQUEOLOGIA CONTA A HISTÓRIA DE PORTUGAL (TF)

O museu foi fundado em 1864 pelo primeiro presidente da AAP, Joaquim Possidónio Narciso da Silva (1806-1896) com o objetivo de salvaguardar o património nacional que estava a delapidar-se
Tasso Franco , Salvador | 13/04/2022 às 07:37
Museu de Arqueologia, Carmo, Lisboa
Foto: BJÁ
   O turista ainda apreciava o casario do centro de Lisboa visto do Santa Justa, a simetria da posição das telhas nas coberturas dos prédios, as quedas d'águas perfeitas sem chuva para maginar o escorrer delas, enquanto as modelos desfilavam na passarela do Carmo em direção ao largo. Preparei o meu iPhone e pedi que repetissem o desfile com seus estilos 'balenciagas' e as cliquei para a posteridade.

   Em instantes estávamos, os três, a ouvir um fadista solitário que cantava num dos cantos da muralha carmelita e avançamos até o largo. Minha esposa admirou-se com a grandeza do espaço e minha neta já se dirigia a portaria do Museu Arqueológico do Carmo (MAC). 

  A senhora Bião soletrou uma frase que me pareceu pertinente: - Não sabia que Luna gostava tanto de museus! - Faz parte do aprendizado, do seu saber em formação, falei baixinho. Pagamos 13 euros para ter acesso - 5 euros a adulta e 4 euros cada a estudante e o 'véi'.

  Já no interior do pátio do museu destruído que foi pelo terremoto de 1755 e esta parte mantida sem o teto e com as paredes laterais expostas como ficaram após a destruição, registra-se, para sempre, a lembrança viva do terror. O local está a 45 metros de altura do Tejo e as águas também invadiram a igreja e o convento matando fiéis. Aproveitei para uma contemplação de monge tibetano e muitas fotos. 

  O turista está a aprender com a folhetaria à disposição no local e pouco a ensinar porque não conhece da matéria. Neste estado de espírito lê que o Convento do Carmo se constituía num complexo que abrigava o antigo convento da Ordem dos Carmelitas da Antiga Observância, construído em 1389 por ordem do Condestável D. Nuno Álvares Pereira para celebrar a vitória portuguesa na batalha de Aljubarrota.

 A Igreja do Carmo era considerada a principal em estilo gótico da cidade com três naves que se estendiam por 72 metros de comprimento. Quase tudo foi ao solo no terremoto de 1755 com mortes no interior da igreja daqueles que assistiam a missa.

 O que víamos - boquiabertos - eram as paredes laterais e alguns arcos que sustentavam o teto. O turista falou as meninas de sua surpresa e não tinha a menor ideia do que encontraria na parte onde, hoje, abrigam-se as peças do Arqueológico, desde o paleolítico.

 No reinado da rainha D. Maria I - é o que conta a folhetaria - o local sofreu obras de recuperação, mantendo-se os vestígios da destruição. Então, quando se entra no espaço, primeiro estão as ruinas do que seria a igreja e os visitantes ficam a contemplar esse espaço, imaginando em cada uma das nossas três cabeças como teriam sido os arcos góticos do templo. Esse estilo foi criado para dar a impressão de alcançar o céu, por isso, tão altos.

 Adiante, após transpor uma robusta porta no estilo medievo, há um espaço interior que, confesso, achei maravilhoso, mas, meu conhecimento era pouco (ou quase) nada para dar explicações a minha neta e também a esposa. 

  Há uma coleção de peças pré-históricas do sitio lisboeta - canecas, pratos, presilhas, colares, vasos, pontas de punhais, cerâmicas, etc - sarcófagos egípcios, o busto do Rei D. Afonso Henriques, o túmulo do Rei D. Fernando, a sepultura original de D. Nuno Álvares Pereira, placas de alabastro medievais e painéis de azulejos representando a Paixão de Cristo.

 São centenas de peças. Para leigos como nós nesta matéria difícil saber por onde começar. Ainda bem que há um roteiro ordenado pelos museólogos.

   Abriga, pois, a sede da Associação dos Arqueólogos Portugueses e o museu foi fundado em 1864 pelo primeiro presidente da AAP, Joaquim Possidónio Narciso da Silva (1806-1896) com o objetivo de salvaguardar o património nacional que estava a delapidar-se e deteriorar-se em consequência da extinção das Ordens Religiosas e dos inúmeros estragos sofridos durante as invasões francesas e as guerras liberais. 

 Possidónio da Silva reuniu inúmeros fragmentos de arquitetura e de escultura, bem como monumentos funerários de grande relevo artístico, painéis de azulejos, pedras de armas e outros itens de diferentes características.

 Nos finais do século XIX, o conde de São Januário, também presidente da Associação, ofereceu ao Museu parte da sua coleção particular de cerâmicas pré-colombianas, e duas múmias do mesmo período. Essa coleção "exótica" constitui hoje um dos principais atrativos do Museu, na medida em que é o único museu português, e um dos poucos da Europa, a possuir duas múmias em exposição permanente.

 Entre o último quartel do século XIX e o terceiro quartel do século XX deram entrada no Museu importantes coleções de Arqueologia Pré e Proto-Histórica, provenientes de diferentes escavações arqueológicas, entre as quais se destaca a coleção de Vila Nova de São Pedro (Azambuja - período Calcolítico - 3500-2500 a.C.), contando atualmente com cerca de mil artefatos em exposição permanente.

  Vê-se nesse interior "Sarcófago das Musas" (romano, séculos III-IV d.C.); três fragmentos escultóricos de origem moçárabe (século X), testemunho do culto e arte cristã em Lisboa durante o domínio muçulmanos túmulo do rei Fernando I de Portugal, obra-prima da escultura gótica no país, recentemente restaurado; quatro placas de alabastro com cenas da Paixão de Cristo esculpidas em baixo-relevo, oriundas das oficinas de Nottingham (meados do século XV); o túmulo da rainha Maria Ana de Áustria, em estilo barroco; conjunto de 14 painéis de azulejos representando a Paixão de Cristo em estilo barroco (c. 1780, oficina de Francisco Jorge da Costa; coleção de 101 pedras de armas, com destaque para a lápide com o brasão de Fernão Álvares de Andrade (século XVI), realizada a partir de desenho de Francisco de Holanda.

  Minha neta se deteve com mais vagar nos sarcófagos e nos túmulos dos reis de Portuga. - Não tens medo dessas almas penadas, perguntei baixinho. - Nem um pouco, adoro o sobrenatural, respondeu sem desviar o olhar do que observava. - Me arrepio só de ver, acrescentei. - Achei esse túmulo lindo com esses recortes e gravações, emendou ela.

 Em 2002 foi criado o Serviço Educativo do Museu, para a realização de visitas guiadas e de ateliers infanto-juvenis, e implantado o espaço de Livraria/Loja, onde o público pode adquirir peças diversificadas do merchandising do Museu, roteiros, brochuras e publicações da Associação dos Arqueólogos Portugueses.

 É proibido gravar lá dentro e isso minha neta me advertiu logo. Gravamos no pátio para meu canal YouTube (Sêo Franco). E assim felizes do local. Confesso que estava cansado e com fome. Precisávamos encontrar um local para degustar algo, pois, estávamos a beira da noite e me pareceu que no Largo do Carmo, a primeira vista, não havia nada interessante. Voltar pelo elevador da Santa Justa não me pareceu o correto. Preferimos andar pela ladeira rumo à baixa.

 Passamos, então, em frente ao Museu da Guarda Nacional e descemos a Calçada do Carmo em direção ao Rossio.