Cultura

LISBOA, CAP 8: A CIDADE VISTA DO ALTO DO ELEVADOR DA SANTA JUSTA, BELA

O casario do centro, a Mouraria, o Castelo de São Jorge e o Tejo vistos a 45 metros de altura
Tasso Franco , Salvador | 06/04/2022 às 09:33
Lisboa vista do alto do Elevador da Santa Justa com o Tejo ao fundo
Foto: BJÁ
   Ouço se minha percepção musical é correta uma peça de Franz Schubert enquanto um jovem alto e esguio baila passos de dança moderna no larguinho do Chiado moldando o romântico do vienense aos seus sincronizados passos. Uma jovem, menor, compõe o par de deux e aplaudimos ao final da apresentação.
  
    Minhas parceiras de viagem, a senhorita Jesus e a senhora Bião aplaudem. Eu também dei vivas e ofereci uma moeda de euro como gratificação. 
  
  Os artistas de rua do Chiado, ponto central de Lisboa e área cosmopolita da cidade, são gratificados pelo público, aquele que passa como nós pelo local e dão uma parada para apreciar as evoluções da dança ou ouvir músicas; e aqueles que estão sentados no café "A Brasileira", ao lado norte, inaugurado em 1905 e ponto de encontro de artistas e escritores de vanguarda onde há uma estátua de Fernando Pessoa sentado e uma cadeira vazia para as pessoas tirarem fotos junto à imagem do poeta.
 
  Falei com minha neta para ela sentar-se e eu registar: - Já tenho foto daí feita quando visitei Lisboa pela primeira vez com meus pais. - Estamos noutro tempo e você cresceu centímetros e mudou de face, aludi. - Pouco importa isso, respondeu de bate-pronto. - Sim, importa a nova realidade, Pessoa é o mesmo, em bronze; e você adolescente não mais criança. Venha, sente-se. 
 
  Resistiu, mas, sentou-se e foi clicada ao lado do poeta, assim como eu também fui. Não se me recordo se a senhora Bião também foi. 
 
  Não tínhamos mais tempo a perder porque a hora avançava pela tarde e nós tomamos a Garrett ladeira abaixo na direção dos Grandes Armazéns e mais passos adiante chegarmos ao Elevador da Santa Justa, nosso objetivo primordial, para usarmos sua cabine até alcançar o Largo do Carmo e não apenas para contemplá-lo deste lado ou do outro observando sua monumentalidade a partir das ruas do Ouro ou da Augusta. 
 
  Pasmem! Paramos nas imediações dos Armazéns para solicitar informações a um policial, bem educado por sí, onde haveria de ficar a casa de Pessoa por aquelas imediações. Disse-nos o educado senhor após manusear seu iPhone que havia uma casa próxima, em São Carlos, e outra distante onde está o museu, no Ourique. Agradecemos sua gentileza e chegamos ao Santa Justa onde, na escada norte, um cantor com sotaque de português do Brasil cantava a pulmões plenos sem boa entonação. - Que horror, ninguém merece - cochichou-me a senhora Bião. - Faz parte, respondi e entramos na fila para subir o elevador.
 
  Fila média. Demos sorte. Normalmente é extensa e demora, às vezes, entre uma e duas horas para os turistas serem atendidos. O motorneiro opera em ritmo do século XIX, sem pressa, a cobrar na porta da cabine o que cada qual tem a pagar, 5,50 euros por pessoa. 
 
  Certa ocasião disse-me Custódio, cozinheiro que atua numa taverna da Travessa do Cotovelo que o Santa Justa só é usado pelos turistas e os portugueses que moram nas suas redondezas não o servem diariamente pelo valor alto do bilhete de acesso. Correto está o Custódio. O Santa Justa, de fato, se compararmos com o Lacerda, de Salvador, que custa 15 centavos a subida ou descida, é caro, algo em torno de 35 reais. 
 
  A fila anda pouco. Deixei as meninas na espera e desci um pouco até as proximidades da Augusta para observar e fotografar o monumento. Pareceu-me uma nave espacial que aportara em Lisboa no século XIX com sua torre metálica por onde sobem e descem as cabines, projeto do engenheiro Raoul Mesnier du Ponsard, conhecido por ter feito outros projetos do mesmo tipo em Portugal.
 
  O elevador foi planejado na década de 1890 e aprovado pela Câmara Municipal, em 1900, inaugurou-se com toda pompa em 1902.
 
  A bilheteira localiza-se por trás da torre, sob os degraus da rua do Carmo. Os passageiros podem subir ou descer pelo elevador dentro de duas cabinas de madeira com acessórios de latão.
 
 A Gazeta dos Caminhos de Ferro de 16 de Outubro de 1892 relatou que Raul Mesnier de Ponsard tinha pedido autorização à Câmara Municipal de Lisboa para construir um elevador entre a Rua Nova do Carmo e o Largo do Carmo, junto ao museu arqueológico.
 
  A estrutura do elevador é composta por uma torre metálica, ocupando um retângulo com 3 m de largo e 6 m de comprimento, no alto das escadinhas de Santa Justa, e por uma passadeira também em metal que terminaria num jardim no Largo do Carmo, passando por cima de prédios na Rua Nova do Carmo.
 
  A instalação do elevador do Carmo foi elogiada pela maior parte da imprensa nacional, exceto pela Gazeta de Obras Públicas, que levantou dúvidas sobre a utilidade deste empreendimento para a cidade.
 
  O passadiço apoia-se n'uma flecha vertical assente e articulada no cimo das escadas de Santa Justa e prolonga-se em falso, á maneira de cachorro, até ao terraço que se deve construir na parte superior da casa de aquele titular. Assim se acrescenta a comunicação para o jardim do Carmo, onde liga por outro passadiço muito singelo. 
 
  Diz a imprensa daquela época: - O terraço será construído pelo processo de formigão armado e cercado por uma balaustrada. As câmaras d'ascensão comportam 24 pessoas. O machinismo de segurança é analogo ao do ascensor Bibliotheca, analogo é tambem o machinismo motor. O cabo tem 50 mm de diametro e abraça 180º na gola da roldana de suspensão, que tem o diametro de 4,450 mm de fundo. A machina é a vapor, vertical, de alta pressão, sem condensação, com dois cilindros. A disposição geral é a do elevador Bibliotheca».
 
   O alto da torre, acedido por uma estreita escada em caracol, é ocupado por esplêndidas vistas sobre o Rossio, a Baixa de Lisboa, o Castelo de São Jorge na colina oposta, o rio Tejo e as ruínas da Igreja do Convento do Carmo.
                                                                   *****
   
   Pronto, depois desse breve histórico para vocês entenderem a importância desse elevador, nos acomodamos na cabine de madeira, os três sentados num banquinho lateral. A subida foi rápida. Em menos de três minutos estávamos no topo. Ficamos, então, no passadiço, a contemplar parte de Lisboa do alto. Que azar! O alto da torre estava interditado para manutenção e não pudemos subir na escadinha em caracol onde se tem uma visão mais ampla da cidade.
 
   Paciência. Desfrutamos o que foi possível. No passadiço tudo está gradeado e com telas, diz-se que para evitar que pessoas se suicidem. Em Salvador, no Lacerda, cuja altura é de 70 metros, a parte alta do passadiço também foi fechada com janelas envidraças porque, em tempos idos, baianos se lançavam ao morro abaixo e morriam.
 
   Após o desfrute da cidade coloquei as meninas para desfilarem na passarela que dá acesso ao Carmo. - Vamos, disse eu, aqui é o fotógrafo da Vogue, façam caras e bocas. As cliquei e seguimos, depois desse ensaio, em direção ao Largo do Carmo. Lisboa, diria, é sempre bela do alto.