Cultura

CINEMA: ATAQUE DOS CÃES EXPÕE A SEXUALIDADE DE CAUBÓIS, p AGAPITO PAIS

A diretora Campion põe em cena um debate antigo com novas tintas e interpretações
Agapito Pais , Salvador | 11/02/2022 às 09:46
Peter e Phil se aproximam nas montanhas
Foto: Netflix
        O filme "Ataque dos Cães" (The Power of the Dog) desponta como favorito na disputa pelos prêmios principais do Oscar. É improvável que amealhe todas as estatuetas a que foi indicado, mas, certamente ficará com um punhado delas, creio, de melhor filme e direção, roteiro, ator coadjuvanete e fotografia, ao menos. 

  Dirigido Jane Campion e lançado numa plataforma de streaming (a Netflix), onde assisti, aborda a homossexualidade no interior conservador dos Estados Unidos, Montana. A trama se passa em 1925 e é centrada na figura do caubói rusticão Phil (ator inglês Benedict Cumberbatch) e sua relação conflituosa e contida com a cunhada, Rose (Kirsten Dunst), e o filho adolescente andrógino Peter (ator australiano Kodi Smit-McPhee).

  O roteiro escrito pela própria Campion é sensacional e leva o espectador e ir descobrindo a narrativa da trama sem que ele tire uma conclusão imediata do que vai acontecer, na inicial expondo uma típica relação de bullying entre o agressivo Phil e o delicado Peter, mas, não apenas isso. Com o decorrer da fita, o assustado e contido Peter, estudante de medicina dedicado a ser legislta, perde o medo e participa de um jogo de sedução mútua.

  A autora, no entanto, deixa que cada qual faça a sua própria interpretação pondo a isca na cabeça de cada pessoa sem expor a sexualidade dos protagonista de forma mais aberta, um relacionamento homoafetivo entre tio e sobrinho, que parecia acontecer. Mas, não acontece de forma direta, um imgainado agarra entre os dois. O telespectador é levado a essa expectativa e quando se imagina que, os dois, numa montanha, a sós, se relacionariam, isso não acontece, pelo menos a olhos vistos.

O roteiro foi adaptado do livro do norte-americano Thomas Savage e “Ataque dos Cães” foi filmado na terra natal da diretora, a Nova Zelândia, que simula os cenários do estado de Montana, palco da história original.

No elenco principal, no papel de irmão de Phil e marido da mãe do jovem Peter, o ator Jesse Plemons, apelidado de "o Gordo", dá um show de interpretação e se apresenta como um caubói diferenciado no vestir e no agir, lider nato dos negócios da familia em gado, socialyte, usando sempre um sobretudo elegante e gravata borboleta. Faz contra-ponto com Phil, o rusticão; x o civilizado e compreensível George, e seu relacionamento com Rose Gordon interpretado por Kirst Dunst.

A diretora se apoia em longas sequências silenciosas das paisagens da artificial Montana, mas, com grande similaridade, tanto para dar vida subjetiva aos comportamentos irracional de Phil e seu banjo, a feminilidade de Peter e seu amor às plantas, a embriagues e vicio de Rose, e a harmonia de Plenons como mediador de um conflito, sem alterar seu comportamento, sem usar a força das armas, só usando uma linguagem bem apurada e colocada em momentos certos, além de seu amor a Rose.

A rigor, o filme tem características de um faroeste com vaqueiros, bois, trem, cavalos, trajes típicos, saloom, piano, mas, bem diferente do que estamos acostumados a ver com tipos de masculinidade fortes e agressivas, sem expor atos de sexualidade entre eles. 

O filme de Campion também se diferencia de "Brokeback Montain" (1997) baseado no mesmo livro de Savage, a história do relacionamento amoroso entre dois caubóis, que tanto sucesso fez com a direção de Annie Proulx. Em “Brokeback Mountain”, o tema era o amor romântico entre dois homens que não podem estar juntos, mas, na fita, isso é exposto de forma mais carnal. 
 
A verdade é que, apesar das semelhanças temáticas, “Brokeback Mountain” e “Ataque dos Cães” não poderiam ser mais opostos em suas formas de abordagem.

"Ataque de Câes" de Campion é mais sofisticado, sutil, a relação homossexual de Phil com um antigo amigo é metafórica ele deitado numa relva a cheirar um lenço com as iniciais de BH quando é surpreendido por Peter. Um segredo guardado a sete chaves é desvendado e Peter se aproxima ainda mais de Phil e cavalgam juntos, acampam numa montanha, perseguem um coelho quando Phil é ferido na mão.

A partir daí, a trama ganha uma nova dimensão na medida em que Phil tece uma corda de couro de boi para presentear Peter, eles se aproximam ainda mais, fumam juntos, porém, o jovem estudante de medicina põe tiras de couro contaminadas para Phil concluir a corda e lhe presentear, levando-o a morte por Antraz.

Finda-se, pois, o imaginário romance entre ambos e Phil é sepultado com todas as honras pelo irmão George, que o manda até se barbear. Na cena final, Peter aparece na janela do rancho de George, e sua mãe e o estancieiro se beijam no terreiro da casa sem serem percebidos pelo jovem.

O que a diretora quis dizer neste final? Por que o jovem mata o tio com Antraz? Teria sido um ato de vingança do jovem pelo tratamento inicial dispensado por Phil, o bullyng tratando-o de afeminado e florzinha e queimando suas flores estilizadas? 

A interpretação fica por conta de cada telespectador e as análises dos comentaristas de cinema e dos psicólogos. O filme tem muita psicologia. Vendo-se que se trata de uma enredo do inicio do século passado, quando a psicologia estava engatinhando, a sexualidade de caubóis, a androgenia, o alcoolismo, as caractetísticas de personalidades - os 5 clássicos traços - já eram sentidos naquela época e Campion os põe na tela para o debate que nunca se encerrará.