Cultura

A CADEIRA E O ALGORITMO CAP 11: QUEM SABE MAIS: O MAN OU O ALGORITMO?

Discussão que está em andamento com as máquinas substituindo os homens
Tasso Franco , Salvador | 27/12/2021 às 06:54
Máquinas numa estação de metrô da Spain que fazem fotos e vendem bilhetes, sem o homem
Foto: BJÁ


Essa é uma boa pergunta, bem interessante dentro do nosso tema – velhas e novas tecnologias – e se assemelha aquela até hoje não respondida: quem nasceu primeiro: o ovo ou a galinha?

O cientista mais proeminente do Brasil, Miguel Nicolelis, em recente palestra no ICL disse que “estamos (o sapiens) nos transformando em escravos das tecnologias ao abordar o tema do seu livro “O verdadeiro criador de tudo” - Como o cérebro humano esculpiu o universo como nós conhecemos - deixando claro, textualmente, que “o cérebro não funciona como computadores”. E mais afirmou que a Inteligência Artifical (IA) de inteligente “não tem nada”.

Os conceitos de Nicolelis são relevantes, porém, não podemos levá-los ao pé da letra de forma consensual uma vez que, sendo o homem o centro do Universo e o cérebro o criador de tudo desde os tempos do caçador-coletor até os dias atuais, foram combinações cerebrais de matemáticos, programadores em computação, físicos, estatísticos e outros que criaram um dos mais poderosos algoritmos da humanidade, o PageRank, do Google, um método de cálculo que permite que todas as páginas da internet decidam quais são as mais relevantes para uma busca.

 Os fundadores do Google, Sergey Brian e Lawrence Page definiram-no como “a anatomia de um motor de pesquisa hipertextual em grande escala”. 

Ou seja, quando você solicita uma informação na busca do Google o PageRank pede a toda rede que página contém a informação mais útil. E lhe dá a resposta em segundos, quer você esteja no Brasil, na Ásia ou na Europa.

Então, se analisarmos o cérebro em si, a máquina cerebral de produzir ideias, isoladamente ou de forma coletiva, uma vez que os ‘sapiens’, desde os primórdios começaram a pensar e agir em grupo e continuam assim até os dias atuais, o que se chama, também, de pensamento das massas ou das multidões e muitas cabeças de reis e mandatários rolaram escada abaixo diante dessa turba cerebral, dessa tempestade de ideias, trata-se de um mecanismo das velhas tecnologias que está se aperfeiçoando.

E o algoritmo como anatomia de um super motor de busca é uma nova tecnologia que, na atualidade, queiramos ou não – como adverte Nicolelis para os cuidados de não sermos escravos da tecnologia - somos obrigados a conviver com ele e os congêneres porque não existem outras alternativas. Salvo se você se isolar como fez Brigite Bardot isolada no intretior da França, aos 87 anos de idade.

Quando estamos diante de uma operação simples de multiplicar, por exemplo, 3.425 x 267 = a 914.475 o nosso cérebro não será capaz de fazê-la sem a ajuda de uma máquina, o que Daniel Kanehaman classifica de Sistema 2 nas duas formas de agir e pensar usadas diariamente pela maioria da população – os homens normais. No Sistema 1, mais simples, mais corriqueiro ao nosso dia a dia, o cérebro sabe de cor e salteado que a compra de 5 pães cada qual a 2 reais, a soma é 10 reais.

E quando estamos diante de um computador elaborando um texto ou verificando a análise de uma média ponderada do grau de aproveitamento de um grupo de estudantes de psicologia os algoritmos são essenciais e nos ajudam rapidamente a encontrar as soluções. Sem eles é possível fazer, mas a análise é demorada e perde-se tempo e dinheiro.

Os algoritmos - em tese - São, portanto, mais inteligentes do que o homem. Ou ao menos mais ágeis.

Eu nunca tinha pensado nisso até meus 60 anos de idade.  Eu era analfabeto nesse campo, pois, só vim conhecer um computador de mesa em 1987 quando fui morar em Londres na casa de Miss Dzuba, uma senhora que residia em Hendon e hospedava estudantes estrangeiros. Até então eu trabalhava em máquinas de escrever e havia feito a campanha política de Waldir Pires a governador da Bahia, PMDB/1986, usando Remingtons e enviando releases de papel para os jornais rádios e TVs.

 Era um método muito atrasado. Um repórter viajava com Waldir para o interior e eu ficava na base, em Salvador, captando a notícia pelo telefone, às vezes transmitida de um Posto de Serviço (PS) da Telebahia porque nem todas as cidades tinham telefones nas casas e pousadas. Era um mecanismo artesanal. 

Quando o fotógrafo conseguia mandar um filme era através de um político que pegava carona de algum avião que vinha para Salvador. Eu mandava pegar no aeroporto, revelar, copiar e mandar a foto para os jornais, normalmente, com 24 horas a 48 horas de atraso do fato em si.

Trabalhando em A Tarde consegui escrever umas linhas num computador Cobra na Editoria de Economia, de Alberto Oliveira, que trabalhava no BC. Quando cheguei na casa de Miss Dzuba havia um computador de mesa com programas de redes de saneamento – o marido dela era técnico em elétrica – e fui apresentado ao computador. Fiquei de queixo caído, pois, eu tinha uma colega de inglês, de Twain, que escrevia nele e mandava mensagens à família, pela internet.
 
 Vi quanto era troglodita. Conheci outros e fui ao The Guardian, posteriormente, conhecer a rede deles. Tentei levar para A Tarde e não consegui quando voltei a Salvador, em 1988. E só implantei a primeira rede de computadores num jornal baiano, em 1993, no Bahia Hoje. Foi, mesmo com atraso, de um pioneirismo extraordinário. Mudou tudo na imprensa baiana na área da produção gráfica e industrial. Passei 1 ano para montar tudo, desde trazer equipamentos contrabandeados dos Estados Unidos (o Brasil tinha uma tal de reserva de mercado) e importar de Belo Horizonte jornalistas e técnicos que entendiam de computação. Mas, ainda assim, ninguém falava em algoritmo na nossa linguagem do dia a dia. 

Hoje, existem centenas de estudos com comparações entre algoritmos e humanos com 60% de precisão com significação maior aos algoritmos. Ou seja, são mais eficientes do que nós. Se essa relação é feita na base da disputa 1x1 no Sistema A, mais simples, considerando-se 1 (o homem, alfabetizado, com conhecimento em computação) x 1 (o algoritmo com programação simples, isolado) pode dar empate técnico. Mas, na proporção de 100 homens x 100 algoritmos programados perdemos feio, na eficácia e na rapidez.

Ora, é muito difícil juntar 100 homens numa sociedade normal – um médico, um gari, uma cozinheira, um engenheiro, um metalúrgico, etc – com os mesmos graus de conhecimento em informática e até em suas profissões; enquanto é perfeitamente possível juntar 100 algoritmos num determinado tipo de programa à nosso serviços. Leve em consideração que os humanos têm opiniões diferenciadas e são inconsistentes em suas previsões, mesmo os especialistas. E quando uma informação é complexa aí é que a situação se complica mais ainda.

Digamos que esses 100 homens acima discutissem a produção de um vinho – desde o plantio da uva, manejo do solo, controle de qualidade, acidez até a produção propriamente dita. Seria, óbvio, um trabalho para 100 especialistas e não 100 normais, mas, mesmo para 100 especialistas na matéria haveria inúmeras controvérsias e, no caso de 100 normais, não se pode esperar nada de bom deste possível vinho. Já numa simulação computadorizada com os algoritmos pré-programados o resultado será mais aceitável. 

Há, ainda, uma outra diferença fundamental: algoritmo faz prognóstico sem avaliações mentais comuns aos humanos especialistas que se consideram sábios e podem até imaginar ou pensar que o vinho acalenta à alma. Nada. O algoritmo 100 combinado vai produzir o vinho de qualidade para você beber.

James Surowiecki, em "A Sabedoria das Multidões" (pag 59) cita pesquisas realizadas por J. Scott Armstrong e uma declaracão de Harry Warner, da Warner Bros, "não consegui encontrar nenhum estudo que encontrasse uma grande vantagem na especialização". E Armstrong completa: "Especialização e precisão não são relacionadas. Em alguns casos os especialistas eram um pouco melhores nas previsões do que as pessoas comuns embora vários estudos tenham concluido que não psicólogos, por exemplo, na verdade são melhores em prever o comportamento das pessoas dos que os psicólgos, mas acima de um nível baixo".

Ainda em "A Sabedoria das Multidões", James Shanteau, um dos maiores pensadores dos EUA sobre a natureza da especialização, sugere que as "decisões dos especialistas são gravemente falhas". Um dos esemplos e estudos dessas falhas se situam no mercado de ações das bolsas de valores. 

Vê-se, pois, quão complexo é o tema na relação algoritmos x humanos. Não é fácil substituir o julgamento humano por uma fórmula. Mas, o mundo atual, em boa dose, está sendo assim. Claro que você pode ser diferente e optar por um modo de vida (digamos) mais naturalista consumindo tomates sem agrotóxicos e alfaces com o gostinho da terra. Mas quando falamos de uma fábrica com 10.000 operários em 3 turnos; ou de um porto exportador mundial com 100 mil almas se movimentando, comendo, bebendo e se alimentado dentro de uma cadeia produtiva 24h é impossível saborear essa alface com gostinho de terra e os produtos oferecidos são enlatados e industrializados, obviamente com químicos. 

Os produtos consumidos em escala industrial não matam, óbvio, senão todos estaríamos mortos. Há, inclusive, uma tese do veneno em pequenas doses que pode ser experimentado sem que você morra. Você não pode tomar uma dose de veneno para ratos diluído em água, que vende na Avenida Sete, em Salvador, em vários ambulantes, de uma vez só, que você morre. Mas, se tomar uma minúscula parte deste veneno com alguma frequência sobreviverá para sempre. 

É assim que funciona a alta performance alimentar no mundo. Somos 7.8 bilhões de pessoas mastigando diariamente, mesmo os talebans, pelo menos 2 a 3 vezes ao dia, o que significa mais de 20 bilhões de refeições variadas à mesa e aquela alface com gostinho de terra, natureba, fica só para alguns privilegiados.

Comecei falando de algoritmo x man e acabei comentando sobre alimentos. Não há nenhum problema nisso. Somos interligados por esses canais quer queira, quer não, Quantas vezes estamos discutindo sobre cinema e terminados falando de futebol. A vida prática é assim.

Creio que você não chegou a uma conclusão sobre a pergunta inicial: quem é mais inteligente o homem ou o algoritmo? Nem eu. Nem ninguém. Esse é um tema em andamento do debate e há quem garanta que o algoritmo vai superar o homem e até controlá-lo, distante da ficção, num plano real. Será?