Cultura

FINAL DE ANO ILUMINADO PELO MÉDIUM DIVALDO FRANCO, p VALDIR BARBOSA

Valdir Barbosa é delegado de Policia aposentado
Valdir Barbosa , Salvador | 20/12/2018 às 12:30
Movimento pela paz no Campo Grande
Foto: Correio/ Almiro Lopes

Sempre que posso, nos derradeiros anos deixo o aconchego de minha morada e atravesso a rua, para assistir, no Largo do Campo Grande, uma das efemérides mais brilhantes que ocorrem em Salvador. Instituída há vinte um anos, pelo iluminado Divaldo Franco, ali, homenagens são rendidas em louvor a PAZ.

O magnífico artista, músico, compositor, cantor, Nando Cordel abre as festividades, em seguida, plêiade de figuras oriundas de todos os credos - Espíritas, Católicos, Umbandistas, Evangélicos - manifestam suas ideias, em breves discursos cheios de sabedoria tratando do tema, por fim, uma cascata de argumentos derramados pela voz e vinda nas palavras do anfitrião brilham bem mais do que todas luzes, este ano adornando com rara beleza, a praça onde acontece o encontro encantando todos presentes, lhes pondo mergulhados em profunda emoção, imenso prazer, efusivo contentamento. 

No entremeio, personalidades e instituições recebem comendas, em função de ações por elas praticadas, beneméritos gestos que lhes dignifica e distingue, por isto, a homenagem pública.

Fi-lo ontem. Levado pelas mãos de minha Roberta, espírita convicta, praticante, ao lado do filho e sobrinha amados, nos tornamos parte daquela legião composta pelas muitas centenas de assistentes e estivemos horas frente ao palco sorvendo o néctar da energia benfazeja dele emanada.

De repente, mesmo atento a tudo observando aquela reunião ecumênica, pela força do pensamento, me transponho até sítio bem distante e tempo, muito tempo já passado.  Viajei ao planalto do sudoeste baiano chegando a Vitória da Conquista, terra de um dos homenageados de ontem e retornei a ultima década do século findo estacionando frente ao Presídio Nilton Gonçalves. Duran

te muitos dias comandei, naquele lugar, ações que objetivaram libertar dezenas de reféns, submetidos a violências e graves ameaças, por internos perigosos que desejavam fugir usando-os como escudos humanos.

Decerto o leitor haverá de pensar, este velho lobo, hoje aposentado deve estar comprometido nas suas faculdades, ao mínimo por conta da característica senil, própria dos anos fluídos, sim, porque parece imponderável, alguém sair dos pórticos onde se festeja a quietude, para viajar na direção de cenários violentos e beligerantes. Verão que se enganam. O antigo guará, ainda não perdeu o faro, caíram-lhe dentes, perdeu pelos, mais continua inteiro.

Naquela ocasião, já passados alguns dias desde quando se instalou a crise, sem que progressos existissem no sentido de sanar o imbróglio, eis que se autoriza o uso da técnica chamada inquietação, a qual objetiva cansar os amotinados, no intuito de que afinal se rendam.  Sobretudo a noite, em espaços de tempo cada vez menores, do nada, surgem homens encapuzados que correm como tresloucados no entorno do ponto crítico e lançam bombas de luz e som, exatamente na intenção de inquietar todos os que se acham no ambiente.

Por óbvio, dita situação também apavora os reféns, de igual sorte incomoda aos que vivem no redor da área onde se desenrola o conflito, mas, não há jeito, impossível fazer omeletes, sem quebrar ovos. Por conta disto, entrevero existiu entre o prefeito municipal da época e este responsável pelas negociações. Coisas vencidas do passado.

Assim como o alcaide, muitas outras figuras buscaram interferir no trabalho, situação normal em casos como tais, afinal, episódio que gera tamanha visibilidade assanha vaidades, além do que, alguns dos que procuram interferir desejam mesmo ajudar, porém, a técnica específica dita: apenas e tão somente policiais treinados podem e devem laborar em hipóteses semelhantes.

Ainda estava neste plano, o saudoso espírita conquistense, Saul Quadros, figura expressiva que durante muitos anos pontuou, com sua retidão de caráter e abnegação pela causa doutrinária, não só em Conquista e adjacências. Eis que num determinado dia, aquele homem manda chamar o responsável pela atividade, ao que pareceu se desenharia outra desinteligência, obviamente, pretendia a importante figura opinar e interferir nas transações em curso.

Então algo de transcendental ocorre e deve ser narrado na integra. Seu Saul diz ao delegado: “Dr.: gostaria de ter sua permissão, para deixar do lado da janela que guarnece o ambiente, onde estão vítimas e algozes, pessoas de vários credos” e, sem se deixar interromper, continuou. “Elas não tratarão de nada, mas irão, durante vinte quatro horas, mediante revezamento entoar cânticos religiosos. Nesta toada, a cada trinta minutos dirão em coro: SOLTA, SOLTA, SOLTA PELO AMOR DE DEUS.” Um anjo me soprou ao ouvido. “Esta sim é a inquietação da qual necessitas, para cansar os promotores da crise, ela virá, na esteira da mansidão”.

Autorizei daquela forma fosse feito e certo é, dias depois, obvio, diante de um complexo contexto, tudo foi controlado voltando a vida da casa de reclusão, como de resto de toda a cidade, ao normal.  Porém, ficou no meu intimo a certeza de que pude crescer naquele dia, estribado na influencia positiva de um ser elevado e nobre, responsável por me mostrar o lado pacífico que deve preponderar sobre todos nós.

Volto ao Campo Grande, ouço a fala de Divaldo, exulto quando lhe vejo contar histórias de Gibran, em quem muito me espelho justo para dizer que PAZ está de braços dados com a JUSTIÇA. Decerto, uma não subsiste sem a outra, desta forma ditou o mestre que ao encerrar a noite, nos brinda com poema magnífico. GRATIDÃO. Sua voz reverbera e domina a noite aos pés do caboclo, adornado em forma de arvore natalina. Divaldo, antes sentado, face ao repouso necessário, por conta de recente cirurgia põe-se de pé, ao recitar as ultimas estrofes da poesia e se agiganta, perante toda aquela plateia em êxtase.

Obrigado Senhor, ao nos permitir viver especial experiência, rodeados de gente sedenta por simples gesto transformador: PAZ, e sua irmã JUSTIÇA. Que o Natal batendo à porta, nos legue a todos, em qualquer canto do mundo, no nosso Brasil, enfim, na nossa Bahia, este presente, na verdade, presente no coração de todos nós - PAZ -, resta fazê-la desperta. Que o novo ano, chegando a galope, frutifique em HARMONIA, PROSPERIDADE, HONESTIDADE, JUSTIÇA e PAZ.