Cultura

ONDE FORAM PARAR OS DINOSSAUROS E OS REDATORES PUBLICITÁRIOS?

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| 16/04/2009 às 13:45
"Redator Publicitário" corre atrás das novidades para não ser engolido pelo tempo
Foto: Arquivo
  Fui gentilmente convidado por meu amigo Nelson Cadena, autoridade na história da propaganda no Brasil e na Bahia, para participar de seu programa na rádio Metrópole sobre nossa atividade.  Já instalado no estúdio pouco antes  irmos ao ar, fui então informado que o tema do papo-entrevista era O Redator de Propaganda: uma espécie em extinção?  

Pegadinha, na certa. Só podia ser. Mas não era.  Como diria Nelson Rodrigues,  com os olhos rútilos e a boca sedenta de tragédia,  a pergunta foi disparada assim que se terminou de dar boa noite aos ouvintes.  Neguei logo a possibilidade de inclusão do Redator Publicitário entre micos-leões dourados, ararinhas azuis, baleias jubarte e outras espécies ameaçadas de extinção.  Argumentei que até para fazer um comercial de televisão sem uma única palavra, é indispensável um redator publicitário escrever o roteiro, assim como filmes mudos consumiam resmas de papel e muitas de fitas de máquina de escrever para serem criados.


Mas o programa de Cadena é muito dinâmico, inclui a participação por telefone de outros personagens da propaganda e do próprio público ouvinte. Assim logo estávamos falando sobre o papel da ABAP nos rumos da propaganda baiana ou sobre o mercado imobiliário, deixando de lado o iminente holocausto dos redatores de propaganda. Por isso achei que deveria voltar ao tema neste espaço. 


Entre as razões apresentadas para a possível extinção do Redator Publicitário está o fato das pessoas lerem cada vez menos.    Até aí concordamos mas isto não vem a ser exatamente uma novidade. Na década de 50 do século passado David Ogilvy já orientava os redatores de sua agência a colocarem nos títulos dos anúncios de jornal e revistas, os principais benefícios do produto e usarem legendas nas fotos, oferecendo mais detalhes. Segundo pesquisas encomendadas por ele, este era o hábito de leitura das pessoas: título e legendas. Caso isto despertasse interesse, iriam para o corpo do texto, mas geralmente viravam as páginas. David achava que se absorvessem as mensagens do título e das legendas, a missão publicitária já estaria cumprida.  Os redatores sobrevivem portanto mais de meio século depois.


Outra hipótese que alimenta a ameaça da extinção súbita de Redatores Publicitários, como aconteceu com os dinossauros, é a crescente migração dos jovens para a internet, criando assim uma massa futura de consumidores mais íntima da linguagem digital e das imagens.  Também concordo, mas existem aspectos inerentes a este fato que mostram um cenário sócio-cultural onde o ameaçado Redator Publicitário tende a permanecer vivo. 


A internet não é uma exclusividade dos jovens.  A quantidade de adultos e até idosos que se mantém informados através de jornais on line e portais da web é surpreendentemente grande pois representa uma mudança radical de hábitos.


Essa massa de jovens digitais que hoje usam a internet principalmente para  papear via MSN, Orkut ou pesquisar via Google e recursos similares, será uma futura massa de adultos, trabalhadores e consumidores já íntimos da internet e certamente será lá que eles irão se informar e serem alcançados pela propaganda.


A propaganda vem ao longo dos séculos se ajustando aos padrões e hábitos do consumo de informação da sociedade. Evidentemente que antes de existirem os meios elétricos e eletrônicos, a leitura era uma prática muito mais intensa entre a população como forma de informação e lazer. A propaganda não fazia por menos e abusava dos textos.  O rádio exigiu ainda mais dos redatores, fossem eles de noticiários, novelas, programas de auditório ou propaganda.  No rádio não há silêncios preenchidos por paisagens ou closes de olhos cintilantes.  É uma palavra atrás da outra, com uma pausa para se ouvir uma música. A maioria com letra.


Depois do rádio; o cinema, a televisão e a internet fizeram a comunicação visual ganhar uma força imensa, mas por trás dela sempre existiu uma idéia, um texto sobre o qual ela se apóia. O mesmo irá acontecer com o que vier pela frente. A propaganda sempre se ajustará ao formato da comunicação humana e está jamais irá prescindir da palavra.


Uma coisa porém é certa: se ninguém lia páginas inteiras de textos publicitários em jornais e revistas, lerá menos ainda. Isto longe de representar o extermínio do redator publicitário, exigirá a sua maior qualificação.  A capacidade de sintetizar é uma das mais difíceis habilidades necessárias para quem se arrisca a ganhar com palavras, a vida. E a síntese será o único caminho para passar ao consumidor a mensagem desejada. Todo mundo lê as manchetes de um jornal, as capas das revistas, as chamadas das novelas. Assim como todo mundo lê um outdoor, um busdoor, um mobiliário urbano e até um adesivo no pára-choque do carro da frente. 


Seja para escrever um anúncio de forma sintética, seja para por no papel o roteiro de um clip ou as 80 palavras de um comercial de rádio, será necessária a existência de um redator publicitário ainda melhor que aqueles hoje em atividade.


Mcluhan  em 1964 escreveu um livro de 402 páginas Understanding Media: The Extensions of Man para provar que a palavra escrita estava com os dias contados. Neste livro ele criou o conceito de aldeia global  uma definição para o planeta que estaria interligado no futuro pela palavra falada do rádio,  pelas palavras não-verbais das imagens e pelas palavras percebidas da televisão.  Após 45 anos a aldeia global  de  Mcluhan é uma realidade que só se tornou possível graças à internet, meio onde a palavra impressa, ainda que em bits e de certa forma volátil é a essência da comunicação.


Redatores publicitários morrerão sim, mas um a um, cada qual no seu dia, sendo substituídos por outros como acontece com todos que vivemos neste planeta encapetado. Nunca em bandos,  chacinados pela própria profissão que escolheram. Certo, Cadena?