Cultura

ALÔ VOCÊ, QUE AGORA ESTÁ ME OUVINDO, COMENTÁRIO DE MARCO GAVAZZA

Vide
| 15/01/2009 às 08:21
O anúncio na internet é duradouro e diferente do colocado na TV
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  No final da década de 1960, em seu revolucionário livro "Os meios de comunicação como extensões do homem",  Marshall Mcluhan apresenta diversos exemplos de como o homem interage ou interagia antes da revolução elétrica (como ele chama a evolução dos meios não-impressos) com os meios de comunicação. Um destes exemplos  é extremamente curioso.


  Trata de um nativo de uma tribo norte-americana em uma reserva nas montanhas Apalaches, que sendo o único letrado do grupo e da aldeia era o encarregado de ler em voz alta para os destinatários, as cartas que chegavam daqueles que haviam migrado para cidades próximas. Ele dizia que durante a leitura se sentia mais à vontade  tapando o ouvido para não violar a intimidade das cartas.  


  Hoje quase meio século depois, é comum encontrarmos pessoas que vivem sós e deixam a televisão ligada enquanto cuidam de outras atividades domésticas, apenas para ouvir o som de uma voz dentro do ambiente.


  Temos aí duas vertentes distintas do relacionamento homem x comunicação. No caso do leitor de cartas, se ele próprio não ouvisse o que estava lendo, preservaria a privacidade do outro. Porque a carta na verdade era -para o destinatário- um meio sonoro de comunicação.  Ele não a lia, ele a "ouvia".  O leitor de cartas situava-se nesta característica momentânea da carta e mesmo lendo-a, não considerava isto uma invasão.


   O homem ou a mulher que abre a porta do seu quarto-sala e imediatamente liga a televisão enquanto vai para o chuveiro, inverte  esta relação. Ele precisa que alguma coisa invada a sua privacidade, para se sentir integrado. Desta forma, o som de uma voz qualquer lhe dá a sensação de uma presença, independente de quem esteja falando ou qual seja o conteúdo do que está sendo dito.


   A televisão deixou de ser essencialmente um meio de comunicação para tornar-se uma "companhia".  Raras pessoas ligam o aparelho para assistir determinado programa e em seguida o desligam. Ele fica lá, ligado, falando para as paredes e mostrando imagens para os móveis da sala.  Por isso é tão comum uma televisão ligada num ambiente onde as pessoas estão conversando, comendo, trabalhando ou fazendo qualquer coisa, sem dar a menor atenção ao que acontece no vídeo.


   Porque então a propaganda pela televisão é tão eficiente?  Embora usando intensamente os sentidos de visão e audição do espectador, ela em verdade não é.  Cerca de 80% dos comerciais só apresentam algum share of mind -um registro de memória- depois de exibido várias dezenas de vezes.  Ainda assim, para determinados produtos e serviços ele serve apenas para fazer com que o espectador procure mais informações em outros meios de comunicação, geralmente impressos.  Ou vá até o ponto de venda, onde a seqüência da intenção de compra muda de mãos e de métodos. 


   Por isso, a televisão não tirou tanto a força de nenhum outro meio de comunicação na função de veículo de propaganda, como se temia.  Mas a internet está tirando. 

Porque ela tem a mesma formatação da televisão -um monitor de vídeo, imagens em movimento, cores, animações, sons etc- mas tem também a permanência e a intimidade da carta daquela aldeia indígena. 


  Um computador sempre tem alguém a 30 cm do monitor, atento ao que está sendo exibido num site. A mensagem publicitária que aparecer ali na sua frente, não irá sumir em 30". Estará ali enquanto ele estiver, pronta a abrir imediatamente -sem que ele precise buscar outro meio- um portal inteiro de informações sobre aquilo que o interessou.


   É uma comunicação de mão dupla, voluntária e da mesma forma que a carta falada,  possui um determinado grau de intimidade. Ninguém fica em pé atrás de sua cadeira vendo o que você está acessando. Isto ainda é considerado uma invasão de privacidade, mesmo entre os mais informais. Exceção apenas para momentos de interesse comum, pesquisas etc.


   Mcluhan acreditava que as características de um meio de comunicação eram tão importantes quanto o seu conteúdo para  serem eficientes. Por isso os chamava de extensões sensoriais.


   Um outdoor seria a extensão do olho enquanto uma revista seria uma extensão da visão e da percepção através da mentalização. O rádio uma extensão do ouvido.  A televisão uma extensão do olho, do ouvido, da fala e facilitador da compreensão. Prevendo que estas extensões tenderiam a crescer em alcance e em quantidade de observadores, graças à eletricidade, ele conceituou a expressão aldeia global, que permanece sólida até hoje.


   Tivesse ele conhecido a internet e talvez a aldeia global tivesse sido chamada de mente global.  A internet não tem espectadores, mas um único indivíduo que percorre aquilo que ele escolhe e se detêm pelo tempo que precisar onde achar interessante. É como se a gente apertasse um botão no controle remoto da televisão quando ela exibe uma comercial de margarina e imediatamente surgisse em nossas mãos uma revista com uma reportagem sobre ela. 


  Por isso a internet vem ganhando espaço para publicidade em progressão geométrica.  Nela um anúncio não passa despercebido ou rápido feito uma bala como na televisão, no rádio, no outdoor. Nem fica escondido e estático dentro de uma revista ou jornal fechado. Ele está sempre ali; colorido, movimentado e sonoro, além de pronto para abrir em segundos todas as informações que você precisa para uma tomada de decisão.


   As grandes agências mundiais de propaganda perceberam isso rapidamente. Nós, aqui abaixo do Equador, como sempre percebemos de forma mais lenta. Mas estamos chegando lá. Bastam mais uns dois ou três clics na cabeça dos profissionais de mídia e dos anunciantes.