Há muitos anos me falava desse desejo, mais de três décadas. Eu, próprio, certa ocasião quando era secretário de Comunicação da Prefeitura de Salvador tentei fazer isso e não consegui.
Anízio é meu conhecido e amigo de 55 anos quando pisei pela primeira vez meus pés na redação do saudoso Jornal da Bahia, na Barroquinha, onde ele, durante décadas, desde 1957, quando passou de laboratorista a fotógrafo publicava suas fotos.
Natural de Conceição da Feira mas com raízes culturais religiosas no candomblé da Lurdinha, sua irmã, em Serrinha, onde viveu, também, seu irmão Manoel, o "Perna Torta", mecânico de autos e onde ainda atua no antigo espaço do candomblé o filho de Manoel e Tereza (está ainda viva) apelidado "Maresia"; pois, inúmeras conversas tivemos sobre essa ancestralidade, ele que tem seu peji, em casa, herança deixada por Eduardo Ijexá.
Extremamente religioso, fiel aos caboclos que Lurdinha cultuava na mata da Serra, hoje, bairro Parque Santana, Anízio não dava um passo à frente em invocar sua proteção. E, assim, humilde, pobre, digno, altaneiro, conquistou o coração de todos no antigo Jornal da Bahia, sua eterna morada de trabalho, e finda essa missa no fotojornalismo dedicou a fotografia no largo do Relógio, em lab particular, na produção das famosas fotografias 3x4 que serviam para tudo, ou quase tudo, porque para passaporte, exigia-se algo maior.
Ele que começara em I. Rosemberg como laboratoristas, eis dono do seu próprio negócio com dimensões menores, é verdade, mas que lhe deu régua e compasso e criou toda imensa família. Quando montamos o Bahia Hoje, em 1992, eis que me aparece um garoto mirrado, com a cara de Anízio, o nariz de Anízio, era seu filho Juarez para ser fotógrafo; e mais adiante, na casa de Lúcia numa festa ao 2 de fevereiro, o cantor de uma banda a nos animar era o Iguatemi, outro nariz do Anízio.
Agora, na expo, ao deparar-me com Jussara, uma das suas filhas (a outra se chama Jussimara) ela perguntou ao "véi" que vos escreve: - Ainda se lembra de mim. Respondi: - Como não, a mesma menina que vi mocinha.
Fui, então, sonhar, vendo as fotos da Expo, uma viagem no passado e no presente.
Ora, se aprendi capoeira com Vicente Pastinha; se meu primeiro livro foi Jorge Amado mecenas fez uma breve apresentação em A Tarde; se alisei em trabalho os bancos da redação do Jornal da Bahia; se conheci Luiz Viana Filho de perto e o entrevistei várias vezes; se vi o incêndio de Água de Meninos; se tomei a benção de Carybé; se bebi uma cerveja com Mario Cravo Jr; se fui ao velório da Mãe Menininha acompanhando Waldir Pires e Edvaldo Brito; se assistiu inúmeros cantos e danças nos terreiros de candomblé da cidade, e se hoje estou a escrever "O Andarilho da Cidade da Bahia", olha meu sonho (e de vários outros jornalistas e fotógrafos presentes na abertura da expo) sendo concretizados.
Tudo isso está na Expo, fotojornalismo pleno com imagens nítidas, sem retoques.
Presente e passado se mesclando. Se encontro Manu e Xando, companheiros da jornada de trabalho na campanha de Waldir, 1986; se troco falares com Jorge de Lima, Levi Vasconcelos, Oldack Miranda, com o trio de ouro Jaciara-Isabel-Mônica estamos no presente viajando no passado.
Na "Interpretação dos Sonhos" (1900), Sigmund Freud, dá algumas explicações sobre esses momentos. Que ocorram outros. A ABI está se parabéns saindo do neolítico para a modernidade como diria Turguêniev, se vivo fosse. E, nós, que ainda estamos de pé, andamos pela Sé, Terreiro de Jesus, Largo do São Francisco, descemos a rua do Saldanha e fomos ver a expo "Ginga Nagô".
Momento abençoado, pois.