Carlos Suica
28/04/2021 às 09:58
Para além do dinheiro, a cor da pele é o fator mais preponderante para o risco de perder a vida por causa do Sars-CoV-2, a famigerada ‘covid-19’, doença respiratória causada pelo novo coronavírus e que matou quase 400 mil em um ano de pandemia no Brasil. E não precisa ser especialista para identificar que os mais atingidos são os pobres. Para ter um recorte racial dessa pandemia no país, entre pretos e pardos as taxas de mortalidade são 81% e 45%, respectivamente, mais altas que as de pessoas brancas na capital do estado de São Paulo.
Esses dados foram divulgados o estudo ‘Social Inequalities and Covid-19 Mortality in the City of São Paulo [Desigualdades sociais e mortalidade Covid-19 na cidade de São Paulo], que analisou as mortes ocorridas na capital paulista entre março e setembro de 2020. Esse estudo abriu um debate interno no Núcleo Popular, grupo do PT que faço parte, e fez alguns militantes a buscarem dados da Bahia, onde também temos um cenário bem parecido. Dos 885.855 casos confirmados desde o início da pandemia em nosso estado, 852.616 venceram a doença, mas 18.087 tiveram óbito confirmado.
O número total de óbitos representa uma letalidade de 2,04%, conforme média de boletim divulgado pela Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (Sesab). E os números detalhados mostram que foram 55,43% das mortes do sexo masculino e 44,57% no sexo feminino. Já em relação ao quesito raça e cor, 54,69% corresponderam a parda, seguidos por branca com 21,86%, preta com 15,40%, amarela com 0,45%, indígena com 0,13% e não há informação em 7,46% dos óbitos. O percentual de casos com comorbidade foi de 65,02%, com maior percentual de doenças cardíacas e crônicas (73,62%).
Logo, a maioria dos mortos na Bahia são negros, pardos e povos tradicionais. As negociações políticas e institucionais para tratar, por exemplo, a inclusão dos trabalhadores e trabalhadoras da limpeza urbana, apontou que essa desigualdade é reforçada por decisões de quem está no comando das pastas de Saúde. O que vimos no município de Salvador e no estado da Bahia como um todo foi uma morosidade para se resolver essa questão, que precisou parar na imprensa e nos debates de instituições representativas. O que fez o nosso mandato e grupo político, questionar se o racismo estrutural e institucional estava sendo cometido neste processo.
Outro ponto que o estudo sobre a capital de São Paulo trouxe para os nossos questionamentos e angústias foi fato do maior número de mortes ocorridas por covid-19 entre março e setembro de 2020, mostra a baixa escolaridade e pessoas que trabalham na rua, que precisam pegar transportes. Isso também aconteceu aqui em Salvador. Em todos os setores, somente este ano já morreram mais garis e margaridas que o ano passado todo por covid-19 e perdi inúmeros amigos para essa doença, todos na linha de frente, lutando contra a crise. Morreram também mais taxistas, mais rodoviários, mais trabalhadores de saúde.
E uma premissa que levou muitas pessoas a pensarem que a covid-19 seria uma doença democrática, que atingiria da mesma forma todas as raças, classes e gêneros, é falsa. Essa ilusão não é rapidamente desvendada pelos números da pandemia, que escancararam ainda mais a desigualdade que temos no nosso país. De acordo com o estudo de São Paulo, conforme diminuem os indicadores socioeconômicos, como o acesso à educação e a renda, aumentam os riscos de morte por covid-19. E ainda tem gente que acredita que os indicadores socioeconômicos, o modo de moradia das pessoas, o que elas comem, o que bebem e como vivem não influenciam nas mortes por covid-19.
Está, aí, mais uma premissa que nos leva a crer que a solução urgente e viável é o ‘lockdown’, fechar tudo mesmo, com apoio do governo federal, bancando tudo, isso mesmo, bancando tudo para as famílias pobres. Taxando os ricos e aumentando os investimentos em saúde e educação, congelados por 20 anos pelo governo intervencionista de Michel Temer com apoio de Eduardo Cunha. Então, não me venham querer justificar que não tem vacina para os garis e margaridas porque nós sabemos que não é verdade, afinal, prioridade é prioridade. Precisamos erradicar o racismo que tem nessas instituições e que não respeitam a história e a vida dos trabalhadores e trabalhadoras.