Gilmar Santiago
04/03/2010 às 09:08
Foto: BJÁ |
|
Gilmar: "Recuperação dos corpos d'água encobertos com cimento" |
Quando disputamos as eleições para prefeito em 2008, o nosso candidato Walter Pinheiro apresentou para a cidade um programa que, se eleito, certamente estaria hoje cumprindo à risca: orçamento participativo, conselhos de gestão em pleno funcionamento, adequação do PDDU aos interesses da maioria da população da cidade; busca de soluções para a melhoria da mobilidade urbana, sobretudo o investimento no transporte de massa de qualidade, uma das condições necessárias para superarmos o caos urbano que caracteriza atualmente a capital baiana.
O projeto e os compromissos que assumimos visam dignificar a vida na cidade. Apesar de derrotado nas urnas, este projeto continua absolutamente atual e, certamente, necessário para promover as mudanças que todos reclamamos. Mudanças que são, cada vez mais, urgentes. Em todos os setores observamos que há uma profunda frustração com o governo de JH, que entra no segundo ano do segundo mandato e continua incapaz de dar respostas mínimas aos graves problemas de Salvador.
A verdade deve ser dita: vivemos sob a gestão de um prefeito que realiza um governo de improviso, sem projetos consistentes. Um governo sustentado, sobretudo, pela capacidade midiática de JH e pelos favorecimentos propiciados pela máquina pública.
Só para citar alguns exemplos de como o governo age de modo absolutamente pontual e desarticulado, pois carece de um programa global para a cidade: a questão do saneamento ambiental está sendo tratada na contramão daquilo que se faz no mundo de mais avançado, que é a recuperação dos corpos d'água para serem devolvidos à convivência urbana. Aqui prefere-se esconder o problema, tapando rios, como se fez na Avenida Centenário durante a campanha eleitoral e faz-se agora no Imbuí.
A questão da limpeza urbana continua insondável. Até hoje não temos um programa municipal de limpeza urbana, não há coleta seletiva do lixo assim como inexistem projetos de reciclagem e reutilização. A limpeza da cidade piorou nos últimos dois anos.
A política social da prefeitura, apesar de dispor de generosos recursos federais, mantém-se ineficaz. A gestão local do Bolsa Família é incapaz de promover o programa na sua integralidade; os Centros de Referência da Assistência Social (CRAS) funcionam precariamente, sem telefone, sem luz e sem técnicos em número suficiente para atender a demanda da população mais desassistida.
Na saúde pública há uma tentativa do governo municipal de transferir a responsabilidade dos problemas para o Estado. Ocorre que Salvador é responsável, sim, pela gestão plena das políticas de saúde, recebe recursos federais para cumprir este papel em todos os níveis (baixa, média e alta complexidades) mas o que vemos é um caos no setor.
O diagnóstico já foi apontado pelos urbanistas: o planejamento público voltado para o desenvolvimento da cidade de Salvador está falido. E pior: ao invés de buscar recuperar a capacidade de planejamento da prefeitura, em articulação com as instâncias estaduais e federais e com os municípios vizinhos, o prefeito prefere adotar um caminho aparentemente mais fácil e barato, contudo de conseqüências imprevisíveis: adotar como seus 22 projetos de intervenção urbana formulados por empresas vinculadas ao capital imobiliário.
Obviamente as empresas são livres para propor e apresentar projetos. Contudo, a prefeitura não poderia nem deveria adotá-los como projetos de interesse público sem que antes fosse promovido intenso diálogo com a cidade, com as universidades e com os segmentos organizados técnica e politicamente capazes de analisar esses projetos e verificar a pertinência deles para o desenvolvimento sustentado de Salvador. Isto sem falar que qualquer projeto de intervenção urbana precisa levar em conta a realidade regional, a dimensão metropolitana. As soluções no campo dos transportes, saneamento, moradia, saúde, geração de emprego e renda devem estar lastreadas num projeto mais amplo de desenvolvimento regional, incluindo aí os municípios da RMS, do Recôncavo e do Litoral Norte.
Ainda que os tais 22 projetos enfeixados com o pomposo título de Salvador Cidade Mundial tenham sido formulados com a colaboração de técnicos altamente capacitados, a questão central, insisto neste ponto, é que esses projetos precisam estar articulados com um programa de políticas públicas, consistente, amplo, regionalizado, com repercussões no médio e longo prazos. Faltou até agora ao prefeito produzir o debate indispensável para que os projetos apresentados pelos empresários possam ser acolhidos pela administração municipal.
E mais: é inaceitável o prefeito continuar alheio ao que prescreve a legislação brasileira e o próprio PDDU, que prevê a implantação do Conselho da Cidade, órgão que deverá ser uma instância técnica fundamental para debater e tomar decisões sobre propostas de desenvolvimento urbano.
Aproveito a oportunidade, inclusive, para informar aos leitores que nos primeiros dois dias de dezembro de 2009 realizou-se a 4ª Conferência de Salvador, organizada pela prefeitura, e um dos temas mais insistentemente debatidos foi exatamente a instalação, posse e funcionamento do Conselho Municipal de Salvador; e a dotação de recursos para o Fundo Municipal da Habitação efetivamente funcionar. Outra sugestão da Conferência foi a corrigir as distorções do PDDU e de seu modelo de gestão de forma a contemplar a função social do uso e ocupação do solo atendendo aos princípios do Estatuto das Cidades.
Ao lado da constatação da precariedade do atual governo, reiteramos o nosso compromisso com a cidade, inclusive colaborando para que a prefeitura tenha melhores condições de enfrentar os problemas. Neste sentido, em 2009, votamos a favor de uma reforma tributária que ampliou em mais R$ 200 milhões/ano a receita da prefeitura. Diante do que estamos vendo em quase todos os setores, como podemos confiar que esteja sendo feito uma gestão eficiente desses recursos?
É nesse contexto que cresce de importância uma Câmara Municipal autônoma, que funcione plenamente e seja capaz de fiscalizar e de cobrar transparência de JH na aplicação dos recursos e exigir o cumprimento da lei no sentido de criar mecanismos que minimizem os impactos negativos produzidos por um governo cada dia mais sofrível.