Antonio Jorge Moura
15/06/2009 às 09:00
Foto: Arquivo |
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O economista Rômulo Almeida e o livro "A Serviço do Brasil" |
O jornalista perguntou ao economista Rômulo Almeida, que concebera a idéia do Pólo Petroquímico de Camaçari, depois de propor a criação da Petrobrás, Eletrobrás e outras estatais, inclusive a SUDENE e o BNDES, o que ele achava das ameaças de poluição que pairavam sobre as futuras operações daquele complexo industrial ainda nascente.
Simples e profundo, como sempre foi na vida, ele coçou os cabelos brancos, abriu um sorriso brando e compreensível, e atendeu o questionamento do jovem profissional: - Pior é a poluição da miséria.
Era meados da década de 70 do século XX e o diálogo aconteceu na ante-sala do anfiteatro do Irdeb, sede da TV Educativa, onde o ilustre homem público brasileiro, apontado pela Comissão Econômica da América Latina (Cepal) um dos sete sábios da América Latina, iria proferir palestra sobre a realidade brasileira e o chamado então de Milagre Econômico.
Rômulo Almeida era diretor da Clan, empresa que ele próprio criara com amigos e a participação de gestores de reconhecida competência para executar, a pedido do Governo Federal, o planejamento estratégico do Pólo. Estava construindo a Nova Dias D´Ávila, na verdade um conjunto habitacional bem planejado, de casas requintadas, com toda infra-estrutura, destinado a abrigar os trabalhadores especializados do complexo industrial e suas famílias.
Não havia na Bahia sequer trabalhadores capazes de operar o Pólo. Os primeiros tiveram que vir do Pólo de São Paulo enquanto se formava a mão-de-obra local. Apesar da Nova Dias D´Ávila ter surgido de uma cabeça brilhante, o Pólo foi executado no Governo do Estado por José de Freitas Mascarenhas, então Secretário das Minas e Energia do governador Roberto Santos e atual vice-presidente da Confederação Nacional da Indústria - os operários do Pólo preferiram morar em Salvador e serem transportados diariamente de ônibus para o trabalho.
E a Nova Dias D´Ávila acabou tendo outra destinação habitacional. O economista foi o primeiro a possuir ações da Detém Química, empresa que nasceu para acabar com poluição em vários rios brasileiros, que eram atingidos por enormes blocos de espuma branca.
Explica-se: é que na época a matéria-prima dos sabões e detergentes fabricados no Brasil eram não-biodegradáveis. E os restos dessa matéria-prima saiam dos esgotos domésticos e lançados nos rios e demais cursos d´água formando enormes e surpreendentes blocos de espuma, que não se dissolviam e causavam péssima impressão.
Na verdade matavam a vida porque impediam a respiração de peixes e outros animais dos rios. Para resolver o problema só mesmo o espírito criador de Rômulo Almeida, que lançou a idéia de instalar uma indústria de matéria-prima para detergente biodegradáveis. Assim nasceu a Detém Química e quase o economista se torna um empresário.
Só não foi porque era presidente regional do MDB, o partido criado pelo governo militar para ser oposição ao regime e simular que vivíamos em regime democrático, e acabou batendo de frente com as forças políticas tradicionais da Bahia. Mas era respeitadíssimo pelo Governo Federal e pelo Presidente da República da época, o general Ernesto Geisel, que fora presidente da Petrobrás e tomara a decisão de implantar o Pólo do Nordeste antes do Pólo de Triunfo, no Rio Grande do Sul, apesar de ser gaúcho.
E para a empreitada convocou a inteligência e a lucidez de Rômulo Almeida. Numa conversa por telefone com minha filha, Christiane Bonomo, que é bacharela em Direito e diplomata da Embaixada do Brasil em Washington, fiquei sabendo que o Embaixador do Brasil nos EUA, Antonio de Aguiar Patriota, é sobrinho de D. Francisquinha, a esposa de dr. Rômulo, que me recebia com muito carinho na residência do casal na Pituba, em frente ao Colégio Estadual Raphael Serravale, onde hoje tem um prédio de apartamentos residenciais.
E resolvi escrever minhas memórias históricas da convivência que tive com o ilustre baiano. Dr. Rômulo e D. Francisquinha tiveram três herdeiros: Marília, a mais velha, professora, sempre discreta e voltada para o trabalho de educar; Dulcinha, que ajudou comigo a Professora Maria Brandão (esposa do Professor Paulo Brandão, da Faculdade de Economia da UFBA) a organizar a Reunião Anual da SBPC que aconteceu na Bahia, no campus universitário de Ondina; e Eduardo Almeida, jornalista e ambientalista.
Sabia que D. Francisquinha era do Rio de Janeiro, mas jamais imaginei que minha Chris iria ter em Washington um chefe que é sobrinho dela. Escrevo sobre minha trajetória com dr. Rômulo em homenagem a ele e a essa coincidência de vida em reverência à jovem trajetória diplomática que ela está escrevendo com inegável espírito público.
Soube pela minha Chris que o embaixador Patriota tem casa de praia no Litoral Norte, em Imbassay, e contei a ela que dr. Rômulo, provavelmente incentivado por dr. Noberto Odebrecht, teve a fazenda de produção de coco em Imbassay, quando não havia sequer Linha Verde, a travessia do rio Pojuca para Praia do Forte era feita de balsa e as estradas eram de terra batida.
Isso porque dr. Noberto adquiriu do Bank of London uma fazenda de coco que britânicos possuíam na área cuja extensão ia do Conde à Praia do Forte. Verdadeira capítania hereditária dos tempos de Garcia D´Ávila. Os antigos donos acabaram abandonando o latifúndio para ajudar a Inglaterra no esforço de guerra contra a máquina nazista na II Guerra Mundial.
E tudo foi ocupado por posseiros antes mesmo do MST chegar lá e estar negociando os lutes obtidos em nome da reforma agrária. A fazenda de dr. Rômulo sumiu na mão dos invasores. Da capitania dos ingleses, adquirida por dr. Noberto, só sobrou a área onde foram construídos os hotéis do Complexo Sauípe. O resto foi invadido e hoje formam até grandes propriedades.
Dr. Rômulo me convidou e me deu a honra de ser o primeiro assessor de imprensa de partido político na Bahia após 1964. Ou seja, ele também concebeu e criou a Assessoria de Imprensa de Partido Político que o Brasil democrático também herdou dele.
Naqueles meados dos anos 70 do século XX nenhum partido político brasileiro, legal, ou clandestino, havia ainda ousado usar a tecnologia do jornalismo e da comunicação social, sem "aparelhamentos" inúteis, na luta pela reconquista da democracia no Brasil. Aí começou uma nova fase do jornalismo e da vida pública na Bahia que vou relatar no próximo capítulo.