Tasso Franco
30/03/2009 às 19:11
Foto: Foto: BJá |
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Casa da Torre, em Praia do Forte, visão privilegiada da chegada de naus pelos Atlântico |
Salvador completou no último domingo, 460 anos de vida. A data foi estabelecida pelo Instituto Geográfico e Histórico da Bahia tomando-se como referência a chegada da armada de Tomé de Souza a Baía de Todos os Santos, 29 de março de 1549.
Poderia ser 461 anos se os historiadores tivessem levado em conta o Regimento de Almeirin, documento que é considerado uma prévia da Constituição Brasileira, elaborado pela Corte de Lisboa sob o reinado de Dom João III e que determina a construção da cidade fortaleza e início da colonização portuguesa em outras bases, uma vez que o Sistema de Capitanias Hereditárias, não rendeu o esperado.
Poderia também ser 476 anos tomando-se como base a instalação da Capitania Hereditária da Bahia, como aliás acontece com Recife e Olinda. Mas, isso são favas passadas e, oficialmente, a data é 29 de março, ainda que Tomé de Souza só tenha posto seus pés no solo baiano no dia 1º de abril de 1549, mas, ninguém de bom senso iria adotar uma data dessas, considerada um chiste nacional, o dia da mentira.
A história de fundação da cidade, em detalhes, pode ser conferida no livro "A Fortaleza de Salvador na Baía de Todos os Santos", de Luis Walter Coelho Filho, um dos melhores trabalhos que conheço, sobretudo por sua visão desapaixonada, colocando as coisas nos seus devidos lugares. Digo isso porque, existem muitos trabalhos sobre a história da cidade com erros grassos, sem comprovações primárias, e outros louvaminheiros. Isto é, com citações de feitos e traços heróicos exagerados.
Poderia citar vários casos, mas, fico apenas com lembranças das lutas sobre a Independência da Bahia, onde não ocorreram essas batalhas todas que se falam, e há um excessivo panteon a Joana Angélica e Maria Quitéria, a primeira morta num incidente, e posta como heroina; e a segunda, com feito patriótico, porém, sem registro oficial de que tenha lutado pra valer. Agora, surgiu até um movimento pra se entronizar uma negra que teria colocado tropas portuguesas a correr com galhos de cansanção, em Itaparica, personagem de ficção de um autor baiano.
Pra valer, como personagem importante da história da cidade, mais até do que Tomé de Souza, Salvador deve e muito a Garcia D'Ávila, filho bastardo de Tomé, que aqui ficou, constitui uma enorme família, criou gado em Itapagipe, Itapuã e Praia do Forte e foi o patriarca da Casa da Torre, um morgado histórico que se mesclou com a família de Diogo Álvares, o Caramuru, e se expandiu para Alagoas, Ceará, Maranhão, Minas Gerais, Paraíba, Pernambuco, Piaui, Rio Grande do Norte e Sergipe.
Foram Caramuru e Garcia D'Ávila os primeiros exportadores comerciais (de comodites, através do Porto de Tatuapara) do país iniciando a globalização no seu sentido primitivista, assim como os portugueses, e depois os franceses, holandeses e ingleses com suas navegações intercontinentais, os pioneiros a experimentar a globalização expandindo suas fronteiras geográficas (depois impérios), culturais e comerciais. Garcia D'Ávila é pouquíssimo lembrado na história de Salvador e seu aniversário.
Para se ter uma idéia de sua importância, a Casa da Torre foi concluida em 1624 (época da invasão holandesa) e a torre de vigia que deu nome referência á casa, em 1551. Dessa torre (localizada em Praia do Forte, Mata de São João), onde se avistava a rota do Atlântico das naus que vinham para a Baía de Todos os Santos, eram dados os primeiros sinais com fogueiras no seu topo, da chegada de invasores, comerciantes e ou naus amigas.
O sistema de comunicação era repassado a uma outra torre que existia na Aldeia Tupinambá de São João (hoje, Barra do Jacuipe), outra na Aldeia do Espírito Santo (hoje, Abrantes), e para as torres de Itapuã, Rio Vermelho e Barra (Ponta do Padrão).
Dessa forma, a governadoria geral sediada em Salvador, na cidade Fortaleza, se preparava para os confrontos militares. Além disso, em Tatuapara, existiam um forte (daí o nome de Praia do Forte), um porto e uma armação de baléias.
Essa rota, porque nessa época tudo era Bahia, Salvador, não havia divisão territorial como se conhece nos dias atuais (municípios de Salvador, Lauro de Freitas, Camaçari, Mata de São João), portanto, Dias D'Ávila faz parte da história da cidade, do seu berço, sua matriz, como personagem relevante, ao lado de Diogo Álvares e suas famílias, os mais importantes do período colonial durante 300 anos.
É o que digo, a história da Bahia tem que ser contextualizada dentro dessa realidade história, sem paixões, colocando no panteon os seus verdadeiros benfeitores, o que, infelizmente, não acontece.