No país de Betty Friedan e Gloria Steinem é natural que mulheres sucedam mulheres no cargo mais importante da diplomacia e surpreendente que elas ainda não tenham chegado a presidência da República. Diz-se, e não deixa de ser verdade, que, aqui nos Estados Unidos, crianças e mulheres estão em primeiro lugar e homens em segundo, dado os privilégios e direitos civis que desfrutam os dois primeiros segmentos. Mas, convenhamos, Hillary Clinton em lugar da Condolleeza Rice, na Secretaria de Estado, é dessas mudanças que fazem a diferença.
Ela é politicamente mais experiente e intelectualmente mais preparada, inclusive, do que o presidente eleito Barack Obama, como demonstram sua atuação política no Congresso e as sabatinas a que foi submetida pela imprensa americana, durante toda a campanha eleitoral, sobre, por exemplo, temas relativos a sua nova função, crucias para a liderança dos Estados Unidos no mundo: o conflito no Iraque, a disputa com o Irã, por causa de seu programa nuclear, e a ameaça representada pelo terrorismo internacional. Estava mais madura do que Obama para o exercício da presidência, embora tenha perdido a indicação do Partido Democrata, por essas circunstâncias que fazem a política parecer igual em todo o mundo.
Analistas da política americana repetem, com certa insistência, que Obama nomeou um time de rivais para a área de segurançaa, ao comentar entre outras, a escolha de Hillary Clinton para a Secretaria de Estado. Ela é, de longe, a mais poderosa auxiliar dele. Alem do cargo ser o segundo mais importante na hierarquia do governo, sua escolha esta lastreada por milhões de votos, que Obama simplesmente não poderia ignorar. Melhor, portanto, mantê-la bem próxima do que no Senado, onde assumiria a liderança do Partido Democrata, a partir de janeiro. Personalidade que sempre teve idéias próprias, diverge do presidente eleito em muitos aspectos da políitica externa, que ela vai comandar, como a relação com o Irã, paíis com o qual é contra a uma reaproximação diplomática.
Mas isso nao parece ser problema para um homem que foi criado por duas mulheres americanas de classe média, marcantes, ao que tudo indica, as quais é dedicado o livro dele The Audacity of Hope ("A Audácia da Esperança"): a avó materna, morta recentemente, a quem chamava carinhosamente de Tutu, Who has been a rock of stability throughout my life ("Que tem sido uma pedra de estabilidade através de minha vida") e a mãe, Ann Dunhan, antropóloga já falecida, "whose loving spirit sustains me still ("cujo espirito amoroso sustenta-me ainda"). Esse é um aspecto da biografia do presidente eleito, que não pode ser menosprezado.
Para Hillary, também sobraram elogios na cerimonia em que anunciou a escolha: "I have known Hillary Clinton as a friend, a colleague, a source of counsel, and as a campaign opponent. She possesses an extraordinary intelligence and toughness, and a remarkable work ethic" ("Eu conheço Hillary Clinton como amiga, colega, uma fonte de conselhos e adversária na campanha. Ela possui uma inteligência extraordinária, firmeza e uma ética notável".
Ilações à parte, com a escolha de Hillary Clinton para a Secretaria de Estado, Barack Obama não apenas contempla um segmento minoritário da sociedade que aqui é muito forte. Inclui, mas está acima das questões de gênero, a indicação da respeitável senadora, que figurou na lista dos 100 mais influentes advogados dos Estados Unidos, antes de ingressar para a política, e do marido dela, Bill Clinton, chegar a presidência e ser reeleito. Admirada, inclusive, pelos adversários republicanos no Congresso, é ainda um rosto muito conhecido no cenário internacional (é ex-primeira dama da América), onde os desafios, independente da conjuntura econômica, são enormes após a Era Bush, que multiplicou em progressão geométrica o antiamericanismo no mundo.
A indicação de Hillary foi também um gesto decisivo de Barack Obama para pacificar e unificar o eleitorado mais conservador, que ainda não "engoliu" um afro-americano na presidência da República, e o proprio Partido Democrata, depois de uma acirrada campanha que deixou fissuras internas, por ter sido Hillary preterida nas primárias. Um sinal de que o presidente eleito Barack Obama quer prestigiar o segundo maior colégio eleitoral do Partido Democrata, New York (a Califórnia é o primeiro), por onde ela foi reeleita senadora em 2006.
A escolha da senadora ratifica ainda o papel decisivo dos Clinton para a vitória de Barack Obama em estados-chave, como a Flórida, e na composição do novo governo, onde muitos auxiliares do ex-presidente Bill Clinton têm contribuído, inclusive, no gabinete de transição. Ela e a garantia de uma política externa conservadora, mas menos beligerante, devido ao seu histórico de militância em defesa das minorias e dos direitos humanos.
Sua estrela deve brilhar.