A obstinada Hillary Clinton e sua missão no governo Barack Obama (Foto/Div)
Levei cerca de um ano, lendo, em pílulas, o livro "Vivendo a história", uma autobiografia cuidadosa de Hillary Rodhan Clinton. Alguns trechos que grifei propositadamente, me fizeram redimensionar a imagem da ex-primeira dama americana, recém-postulante candidata à presidência dos Estados Unidos. Figura ímpar do seu tempo, no livro, relata desde sua infância até o seu momento como senadora eleita pelo estado de Nova York, detalhando fatos e expondo sentimentos. Corajosa, é o adjetivo que mais tenho sussurrado, todas as vezes que volto ao seu texto, embora, em mim, fique sempre a pergunta interna do teor marketeiro que pudesse haver na elaboração do tal compêndio, tendo em vista à proximidade e intencional pano de fundo necessário para que a mulher política conquistasse eleitores num futuro próximo que chegou. Resguardadas as proporções do meu crivo de jornalista observante, impossível não perceber o volume de experiências registradas pela autora, de cunho mais variado, envolvendo sua trajetória profissional independente dos laços que a ligam ao político Bill Clinton, seu marido e ex-presidente do país que ainda se coloca como no topo do mundo. A campanha esquentou. Ela pôde ser fraglada como aquela que não desistia, apesar dos altos e baixos da disputa com Barak Obama, seu adversário de sigla, ambos representantes de segmentos comuns da sociedade norte-americana. Ideais de mudanças sociais, ela , uma mulher que poderia ter inaugurado a chegada feminina ao pódium do comando daquele páis, soube reconhecer o momento especial da liderança de Obama, ele que também será o primeiro a ocupar tal cargo na história da república do capital internacional. Entretanto, pelos episódios descritos do livro, é possível entender o gás que esta figura expressiva traz consigo, bem mais forte do que a mídia tem transmitido ou formatado. Hillary não se furta a contar tudo. Descreve, com altivez, o disse-me-disse causado pela traição do marido, no caso da estagiária, com quem o então presidente Bill manteve relacionamento amoroso ou rudimentos dele, provocando escândalo internacional. Ela chega a se colocar como uma mulher comum, desabafando sentimentos do dia-a-dia de qualquer esposa fiel, solidária ao companheiro de quem nunca podia esperar tamanha escorregada de tapete.
Mas, a Hillary que deu mostras de fôlego revigorado a cada primária, ou a cada derrota ou pesquisa que favorecia seus adversários, é a mesma que confessa espelhar-se em Jackie Kennedy, com quem esteve várias vezes e de quem guarda muitos conselhos que revela no livro. Hillary é mesmo intensa, por exemplo, quando conta suas visitas a tantos países, contatos com inúmeros chefes de estado, líderes mundiais e gente do povo de culturas tão diversas que conheceu. Sobre a Índia, conta, depois de visitar um dos orfanatos para meninas, dirigido por Madre Teresa, ela relembra:" Eu havia concordado em fazer um importante discurso sobre os direitos das mulheres na Fundação Rjiv Gandhi, mas estava encontrando problemas para o redigir. Procurava uma imagem clara que expressasse o que eu queria dizer. No almoço formal feminino, Meenakshi Gopinath, a diretora da Escola Lady Sri Ram, um estabelecimento de ensino secundário, presenteou-me com a inspiração - um poema escrito e pintado à mão por uma de suas alunas, Anaya Sengupta.
Chamava-se "Silêncio", e começava assim: Muitas mulheres , em muitos países, falam a mesma linguagem. Do silêncio...Não consegui tirar o poema da cabeça. Enquanto trabalhava no meu discurso, tarde da noite, me dei conta de que poderia usá-lo para transmitir a minha convicção de que temas relativos a mulheres e meninas não deviam ser descartados como "delicados" ou marginais, mas integrados inteiramente em decisões de política interna e externa.
Negar ou impedir educação e cuidados básicos de saúde para a mulher é uma questão de direitos humanos. Restringir a participação econômica, política e social da mulher é uma questão de direitos humanos. Há muito tempo, as vozes da metade dos habitantes do mundo não tem sido ouvidas pelos governos. As vozes das mulheres tornaram-se o meu tema e resolvi encerrar o discurso citando o poema". Assim é a Hillary, a advogada formada em Yale, primeira mulher a ocupar uma ga de senadora na democracia americana, refeita da corrida presidencial, escreveu: " as decisões mais difíceis que tomei na minha vida foram continuar casada com Bill e concorrer ao Senado por Nova York. Na ocasião, sabia que eu queria que o nosso casamento durasse, se pudesse, pois eu amava Bill e percebi o quanto acarinhava os anos que havíamos passado juntos. Eu sabia que não podia ter criado Chelsea sozinha tão bem quanto o fizemos juntos." Então, Hillary expõe suas mazelas para a campanha à senadora, considerando que era um batismo de fogo. Mas venceu. Projetou-se. Acumulou mais experiências. O livro se encerra no dia do adeus à Casa Branca, onde ficou por oito anos, como primeira dama, segundo ela, vivendo a história. Mas, a vida dessa americana obstinada seguiu em frente. Como capítulo apêndice da obra autobiográfica inclui mais de 150 nomes para agradecimento, dizendo "eles escreveram a história comigo". Talvez aí, esteja o ponto principal que faz a diferença da vida pública de Hillary. Ela agradece e reconhece sua necessidade de cercar-se de pessoas que a ajudam na passagem pela história. E confia nos milhões de simpatizantes e eleitores que conquistou com sua fleugma de mulher decidida. Quem sabe seu destino é bem mais intenso do que ela própria? E a confundirá com o destino do planeta, se ela conseguir ultrapassar mais esse batismo de fogo ao assumir o cargo de Secretária de Estado, no governo norte-americano, ficando tão perto da Presidência, assinando seu nome na história do poder do seu país, como nenhuma outra mulher terá asssinado. Capitalizará as atenções mundiais para o seu desempenho quanto à política externa do seu povo e terá tamanha responsabilidade para a qual está pronta e carrega a decisão de empreender mudanças profundas aos olhos do mundo, na condução das negociações de paz entre os povos. Hillary segue vivendo a própria história, que é semelhante a das mulheres cuja vida pessoal se confunde com missões sociais e políticas que se sobrepõem em objetivos e metas, levando em conta as necessidades de seu povo e de todos os povos que mantém intercâmbio ou dependência econômica com os Estados Unidos da América. Ao aceitar o convite do presiente eleito Obama, ela sinaliza a disposição de lutar por ideais firmes no comando representativo dos interesses do seu país, mas sobretudo na necessidade de fomentar novas posturas para as relações internacionais no quadro dos países grandes e emergentes. Hillary tem fibra e carisma. O momento exige tal coisa. Obama tem visão estratégica e sabe que fez a escolha certa.