Ave, Clarindo, os que vão para as ruas, libertos de todos os grilhões como os são os que formam o espírito do homem na Bahia, te saúdam.
Porque o Momo da Bahia não pode ser pagão; há que ser filho e amigo de santo, como Clarindo Silva o é. E ponto final. Com base em jurisprudência firmada além mar africano e aqui reafirmada em todos os terreiros, notadamente nas esquinas do Pelourinho, onde já reina absoluto Clarindo, em seu trono no Jardim Suspenso da Lua Cheia, corte da Cantina da Lua, burgo do povo.
Porque, afinal, a função de Momo é ordenar o toque da zabumba, "porque a terra é nossa". Porque a praça é do povo. Porque atrás do trio elétrico só não vai quem já morreu - quem sabe de obesidade...
A função do Momo na Bahia é fazer o povo lembrar que, espetáculo televisivo à parte, carnaval aqui é preceito: brinca-se pela liberdade de brincar, pela liberdade de viver; pela Liberdade, Cabula. Carnaval aqui se brinca em liberdade.
A Justiça dos "omes", com todo respeito, que me perdoe, coroar Clarindo é
competência da justiça divina.
Ninguém mais tem o abraço forte que todo baiano e toda menina baiana precisam para não perder o pique do tambor. Quem quiser e tiver competência, ou merecimento, que pergunte para Jorge Amado, pros santos, pra Mãe Menininha...
Não é que não seja gordo. Ou que também magro mereça, um dia, ser Momo. É que é Clarindo Silva, o guardião de todos os boêmios da Bahia que só no carnaval brincam de dia também. E porque todos nós só deixamos a noite, ou entramos nela, pedindo a benção na Cantina.
Porque carnaval na Bahia é Filhos de Gandhy, é Ilê Ayê, é Afoxé. É Axé. E Clarindo traz, mais que qualquer outro, a majestade respeitada necessária para comandar o maior trio elétrico de todos, que é o do povo.
Porque Clarindo é o povo no palanque das autoridades - e isso é que é democracia: quem não entende, paga pra ver.
Quem sabe, elege como seu rei, meu rei, Clarindo Silva, do Pelourinho.