UMA BAHIA SEM CULTURA

DIMITRI GANZELEVITCH
29/01/2007 às 21:43

Em 1971, na primeira vez que visitei a Bahia, magníficos casarões eram maioria no Campo Grande, Corredor da Vitória, Barra e Ladeira da Barra.

A capital tinha uma identidade única, mágica, atemporal.


Em 1975, quando resolvi morar aqui, já apareciam os primeiros espigões. O Apolo XXIII era o mais recente. Sua arquitetura não me convenceu.

Os inúmeros prédios que vieram a seguir tampouco me seduziram.

Simples "caixas de dormir" conforme a pragmática definição de Oscar Niemeyer.

Aos poucos, a arquitetura que fazia o encanto desta cidade foi desaparecendo.

A Vila Serena, a belíssima mansão dos Correia Ribeiro e tantos outros cujos nomes e proprietários fugiram de minha memória...


Preferi ir morar no centro histórico, para espanto dos que, na época, eu freqüentava.

Aos poucos, comecei a me sentir como aquele personagem de Jacques Tati no filme "Meu tio" que não entende que esta sociedade recuse o passado como se fosse indigno da promoção social e da contemporaneidade e se refugia na sua poética e tosca casa  em bairro excêntrico.


2005 foi marcado pelas agressões à nobre residência dos cardeais do Campo Grande. Perdeu sua torre, retiraram os artesanais azulejos do século XIX para indústriais cerâmicas sem vida. O casarão que hospedará o Papa, agora é academia de ginástica. Mal consegue esconder o monstrengo onde estrelas do axé têm seu apê...


Para prosseguir com a agonia da memória desta cidade, contestando o ditado "A História não se repete" eis que, no último domingo - notem bem: domingo, 28! - deste mês de janeiro de 2007, com conivência dos poderes públicos, a derrubada da Mansão Wildberger repete o escândalo da antiga Sé.

Primeira catedral do Brasil, cujos restos esplendidos ainda podem ser admirados no Museu de Arte Sacra, ela foi destruída em 1937 com óbvia conivência de todos os poderes públicos da época. Não faltam documentos acusando sem rodeio arcebispado, prefeitura e governo estadual de terem sido corrompidos pela empresa inglesa do bonde.


E hoje? Quantos anéis de brilhantes, quantos Rollex, bolsas Louis Vuitton e carros importados foram parar nas mãos dos que teriam a obrigação de preservar as instituições e simplesmente aplicar a lei?
 

Para os poucos e tristes vizinhos e contribuintes que presenciaram a morte da mansão Wildberger, este assassinato cultural, era de se ter vergonha de viver numa cidade que tão pouco respeita sua memória.

Começo a me questionar sobre minha escolha de fim de vida...


Dimitri Ganzelevitch

Presidente da Associação Cultural Viva Salvador

Rua Direita de Santo Antonio, 177 Salvador Bahia

Tel 3242-6455

CPF104 899 245 49