O ARISTOCRATA "PASTOR DA NOITE"
*EDUARDO BALDUINO
Anísio Félix era editor de Internacional no Jornal da Bahia quando eu o conheci, em 1976. Com apurada visão política e uma sofisticação inigualável - ou absolutamente coerente com sua postura de lorde africano educado em Londres e Paris - selecionava, diariamente, os principais acontecimentos internacionais diretamente da inesquecível redação da JJ Seabra, 22, Barroquinha.
E depois partia para a noite das ladeiras e das princesas e baronesas de Salvador - uísque com as festivas princesas e vinho e carteado com as nobres damas solitárias da realeza soteropolitana.
Minha dívida com Anísio é impagável: foi ele que me levou para a Bahia, conseguindo meu primeiro emprego, no Jornal da Bahia de Fernando Vita, Joca, Rafael e Rêmulo Pastore, Lúcia, Tasso Franco, Anísio Carvalho, Rino Marconi e tantos outros que tiveram o privilégio de viver os últimos bons momentos do jornal de doutor João Falcão. Cheguei direto na mesa de copy comandada pelo poetinha Gilson. Ambiente e acolhida que até hoje me pergunto se era merecedor.
Anísio Félix me apresentou a Clarindo Silva e ao Pelourinho e me levou no Bonfim. Vinte e poucos anos depois, em seu fusquinha, fez o mesmo trajeto desta vez para levar à colina Sagrada, com orgulho de tio, meu filho Daniel - com pouco mais de um ano de idade -, minha mulher Jacqueline e meu filho torto Lucas. Mas, me levou também a outros chãos sagrados de Salvador onde Daniel só poderá ir quando adulto.
Foi um personagem de si próprio. Companheiro e irmão, e não personagem da literatura de tantos que imortalizaram os pastores da noite baiana - foi colega destes tantos, com a desenvoltura de quem podia se dizer amigos de todos os santos.
Todos eles saberão falar mais e melhor de Anísio.
Com certeza, lhe farão as homenagens devidas e merecidas.
Com certeza, Os Filhos de Gandhi tocarão as zabumbas, neste carnaval, em sua memória. Que ele apreciará na companhia de Reminho e de Rafael à frente da comitiva que o recebeu.
Com certeza Mãe Menininha deu-lhe o primeiro abraço e a primeira benção, antes da meia-noite do sábado.
Eu só quero reafirmar que abraçar Anísio, falar com ele ao menos pelo telefone era, para mim, cumprir um preceito.
E com certeza e com felicidade continuará sendo.
*Jornalista, morou e trabalhou em
Salvador, no Jornal da Bahia
e na TV Aratu, de 1977 a 1981