Prefeitura de Curitiba faz sucesso nas redes com página que equilibra humor e prestação de serviço. São mais de 570 mil seguidores, cerca de um terço da população da capital paranaense
Mariana Alvim , Globo |
19/06/2015 às 11:44
Equipe de midias sociais da Prefeitura de Curitiba
Foto: Paulo Lisboa
RIO - No início do mês, a imagem de um cartaz exibindo as palavras “respeite as miga, as mina, as mona”, seguidas de “tretas: disque 100”, bombou no Facebook. Foram mais de 38 mil curtidas e 31 mil compartilhamentos. Com essa postagem, a sua autora, a prefeitura de Curitiba, bateu o próprio recorde em termos de alcance — medida que determina o número de visualizações pelos usuários, cada vez maiores conforme o número de curtidas, comentários e compartilhamentos. Mais de cinco milhões de pessoas foram alcançadas e o órgão, que se apelida como “Prefs” nas redes, mostrou por que é pioneiro em uma tendência que vem sendo chamada de “prefstização”.
A página começou a ser planejada em março de 2013 e é a campeã entre os órgãos municipais em número de fãs no Facebook: são mais de 570 mil, cerca de um terço da população da capital paranaense, 1,8 milhão. Em segundo lugar, está a prefeitura de Manaus, com 200 mil fãs, e em terceiro, a prefeitura de Maceió, com 188 mil curtidas. A prefeitura de São Paulo, com a maior população do país, está em sétimo, com 99 mil fãs.
A imagem do cartaz que bateu recordes representa uma das principais estratégias do Departamento de Internet e Mídias Sociais da prefeitura de Curitiba, apontada por seu diretor, Álvaro Borba: a apropriação da linguagem das redes agregada à prestação de um serviço. Os dizeres criados pela “Prefs” faziam referência a uma foto que circulou pelas mídias sociais em abril, em que um papel grudado num poste exibia, em letras garrafais: “respeite as mana, as mina, as mona”. A postagem criada pela prefeitura de Curitiba encaminha usuários ao Disque 100 ou ao Disque Direitos Humanos.
— O uso do humor, na internet chamada de “zoeira”, pode ser rejeitado ou requalificado por um órgão público. A internet tem potencial de coletividade imenso, pois a transparência se torna compulsória, e a abertura de diálogos é multiplicada — explica Borba, jornalista que fez da capivara um mascote “cibernético” da cidade e que hoje tem até uma linha de produtos. — A inovação já é tradição de Curitiba e, com as mídias sociais, quisemos resgatar essa característica. Nossa equipe conta com sete pessoas, raramente utilizamos postagens patrocinadas, e o resultado acaba sendo econômico para a gestão.
No caso da “Prefs”, o diálogo ultrapassa as fronteira de Curitiba. Das 569.972 curtidas registradas no último dia 15, 208.292 tinham origem na capital, 24.121 na Região Metropolitana e 19.589 no interior do Paraná — ou seja, 56% dos fãs da página estão fora do estado. Boa parte da interação com os internautas acontece nos comentários, respondidos pela equipe. No bate-papo virtual, é inclusive comum outros órgãos públicos entrarem no jogo.
CASAMENTO COM A PREFEITURA DO RIO
Um dos mais celebrados casos de interação digital da prefeitura de Curitiba, o “Casamento vermelho”, envolveu espontânea e diretamente a prefeitura do Rio, em setembro do ano passado. Respondendo à euforia de fãs da página paranaense que pediam para se casar com a “Prefs”, a equipe de mídias sociais escreveu, em um post: “Gente, a prefeitura não pode casar. Mas isso não quer dizer que não amamos e cuidamos de todos. Obrigado pelo carinho e pedidos de casamento”. A partir daí, o Rio de Janeiro passou a “investir”. Pediu Curitiba em noivado, fez diversas postagens e ganhou como apoio dos internautas a hashtag #aceitacuritiba.
O resultado foi o “Casamento vermelho” (referência a um episódio da série Game of Thrones), em que as prefeituras marcaram a “cerimônia” em hemocentros. Segundo a prefeitura de Curitiba, naquele sábado, a doação de sangue triplicou.
Para Nara Franco, sócia-diretora da agência O Sobrado e especialista em Estratégias Eleitorais para Ambientes Digitais, a “Prefs” foi pioneira no país ao aliar descontração e serviço público em ambiente sóbrio e formal.
— Muitos órgãos públicos e políticos ainda se posicionam, nas redes sociais, no formato “a gente fala, eles escutam”, uma configuração das plataformas antigas. A mentalidade antiga usa as mídias para se autopromover ou postar conteúdo duro — analisa, lembrando que no exterior há casos de sucesso, como as páginas da Casa Branca e da cidade de Nova York.
Apesar de se considerar influenciada pela "prefstização" na busca pela leveza e diálogo nas mídias sociais, a coordenadora de Internet e Redes Sociais da Prefeitura de Santos, Amanda Guerra, acredita que sua equipe vem encontrando um caminho acertado e singular para a comunicação da cidade paulistana no Facebook. Com 112 mil fãs, a página também iniciou um case com a Prefeitura de Curitiba: em julho do ano passado, uma capivara, símbolo da "Prefs" alçada nas redes sociais, foi encontrada perdida na orla santista. A equipe paulistana passou a dialogar com os paranaenses, o que gerou posts e discussões sobre questões ambientais.
— Nosso público é mais maduro, então nossas postagens precisam ser um pouco mais formais. O caso da capivara foi uma oportunidade de brincar bem recebida pelos usuários. A Prefeitura de Curitiba nos inspira pois abriu espaço para uma linguagem muito genuína da internet — afirma a jornalista, destacando que muitas prefeituras pediram consultoria sobre o trabalho do Seção Núcleo de Atenção ao Tóxicodependente (Senat) após uma postagem.
A CAMINHO DA TRANSPARÊNCIA
Mas nem tudo são flores — ou melhor, curtidas. Críticas são recorrentes nos comentários e, em setembro de 2014, curitibanos criaram a página "Prefrescura de Curitiba", hoje com 15 mil fãs. A página, administrada por quatro pessoas, parodia a linguagem e os memes que são marcas da Prefeitura de Curitiba no Facebook.
— A ideia surgiu após alguns de nós irmos cobrar por um serviço na página da prefeitura e sermos rechaçados por seguidores. O problema não é ter uma conta no Facebook, mas sim fazer um uso excessivo de linguagem ultradescolada e divulgar determinadas ideologias em memes em meio a uma cidade com problemas diversos e uma central que somente há pouco tempo passou a ser menos burocrática — escreveu, sem se identificar, um dos administradores da "Prefrescura".