Saúde

DEPUTADO-MÉDICO, HERALDO ROCHA, DÁ DEPOIMENTO SOBRE FAMED/UFBA

Veja depoimento
| 11/05/2008 às 14:30
  O deputado Healdo Rocha, líder o DEM, diz que depois "daquelas declarações do ex-Coordenador do curso da Fameb, Dr. Antonio Natalino - talvez num momento infeliz de sua parte, cujo mérito de algumas considerações éticas emitidas por ele não cabe, no momento, entrar em debate - veio à tona a grave crise da saúde na formação médica da Bahia, especificamente na Fameb".
 
  Esse processo, diz o deputado, "vem se desenrolando ao longo do tempo, transformando-se num problema gravíssimo que entristece todos aqueles que, gostam e valorizam o bom nome da Faculdade de Medicina da Ufba. Se por um lado aquelas declarações foram lastimáveis, na outra face da moeda, abriu-se uma janela que a sociedade tomasse conhecimento da pujante deficiência do ensino médico na Bahia".
 
   "Desde a minha formatura, em 1968, até o presente ano - onde, com muita honra, farei 40 anos de formado - vínhamos sentindo a decadência do ensino médico de um modo geral. O Hospital das Clínicas (Hospital Edgar Santos) já estava se deteriorando e perdendo a sua função precípua, que é a do ensino. Foi nessa fase onde começou a ocorrer a comercialização do mesmo, criando-se verdadeiros guetos lá dentro, perdendo, assim, a sua função principal que é exatamente o ensino", destaca.
 
  SEGUE DEPOIMENTO
  DE HERALDO ROCHA

   - Se formos recordar os idos da década de 60 - período em que passei longos anos na faculdade -, a Bahia sempre se destacou com luminares. As cátedras eram professores que ministravam e tomavam conta de cada cadeira com muito amor e devoção. Era importante ter o título de professor da Faculdade de Medicina como exercício da atividade médica. A maioria dos professores não exercia nem consultório para, justamente, dedicarem-se em tempo integral à vida acadêmica.

   Tínhamos professores como: Marback, Jorge Novis, Jorge Valente, Rodolfo Teixeira, Didier, Hosanah. Catedráticos que, naquela época, eram, verdadeiramente, de grande valor, como também o professor Carvalho Luz - um dos maiores cirurgiões do País e do mundo - defensor de várias teses de destaque. Porém, após a reforma administrativa, que começara a ser empreendida logo depois que nos formamos, acabaram com duas cadeiras importantíssimas na Fameb que era a de propedêutica médica e a de terapêutica médica.
 
   Ambas eram as mais difíceis do nosso curso de medicina, sendo que a primeira nada mais era do que a ação de examinar o paciente. Esse é apenas um pequeno exemplo de como a medicina era levada realmente a sério no passado. De certa forma a tecnologia avançada dos novos tempos - com tomografias e ressonâncias magnéticas de última geração - serviu para abrir novos horizontes para a medicina.

   Contudo, com a adoção de diretrizes decorrentes da reforma administrativa acadêmica nas Faculdades de Medicina (inclua-se a Ufba), optou-se por extinguir, como já mencionado, cadeiras importantes na formação do médico, em detrimento a uma maior capacitação. Na Ufba, acabaram com a cadeira de terapêutica médica - cujo professor, na minha época, era o catedrático, Heonir Rocha, um dos maiores nefrologistas já conhecidos no Brasil e no exterior.
 
   E o que aconteceu após essa atitude? Qual a diretriz adotada? Na atualidade, vimos que muitos médicos não prescrevem mais o remédio seguindo seus conhecimentos adquiridos ao longo do curso de medicina. Parecem que assumiram o papel de mero retransmissores do discurso que os representantes dos laboratórios, de praxe, fazem quando em visita aos mesmos, para só depois, tal qual uma peça teatral, enveredar numa sofrível pantomima na tentativa de convencer seu paciente das vantagens de sua indicação.

   Minha atitude em tempos passados, diante de quadro semelhante, era simples e direta. Eu ouvia atentamente o que dizia os representantes - pois o médico precisa sempre atualizar-se neste campo - e, ao término do nosso encontro, orientava para que deixassem a amostra do medicamento em cima da mesa. Era desnecessário decorar o que acabara de ouvir. Necessário se fazia e se faz estudar a farmacologia dos medicamentos de forma ampla. Saber quais são as suas indicações e contra-indicações, e só então direcionar esta análise para sua melhor destinação.
 
   A verdade é que o ensino médico começou, há muito tempo, a entrar em decadência na Ufba, sobretudo após a ideologização que ora se observa em seu cotidiano. O patrulhamento ideológico virou fator comum em sua administração. Instituíram-se então as famigeradas interferências político-ideológicas; a briga entre os grupos políticos de esquerda.

   Por fim, e a partir dessa interferência, e como conseqüência, começaram a destruir o Hospital das Clínicas, por tabela, o ensino médico propriamente dito. Assim que li o texto da Ata da Assembléia Geral da Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia, realizada no dia 5 de maio de 2008 - gentilmente enviado pelo digníssimo Diretor da Fameb, Dr. José Tavares Neto -, pude, para minha alegria, ter a convicção de que a Fameb ainda possui valorosos cidadãos em sua direção.

   Pude constatar que verdadeiros acadêmicos compõem este egrégio órgão, digo isso, sobretudo, pelas deliberações tomadas nesta reunião perante as desastrosas declarações do ex-Cordenador da Fameb (Dr. Antônio Dantas) e diante da grave crise que se instalou na Faculdade de Medina da Ufba.


   Para se ter uma idéia da insensibilidade da atual administração da UFBA, desde 2004 que Congregação da Faculdade de Medicina da Bahia (FMB) da Universidade Federal da Bahia apresentava ao Magnífico Reitor as reais necessidades para que o Hospital Edgar Santos (o Hospital das Clínicas), juntamente com o ensino de medicina, voltasse à sua plenitude, e essas queixas podem ser totalmente comprovadas, haja vista que as mesmas encontram-se registradas e protocoladas em Ata. Ao vermos mais esse irrefutável fato é que concluímos que, há muito tempo, tem-se alertado sim (e muito) para a situação precária do ensino da Universidade Federal da Bahia, especificamente, à área médica.

  Nós estamos vivendo em um país onde há analfabetismo e altos índices de violência. Vivemos num país onde se morre na porta de hospitais sem o devido atendimento. Vivemos em um país aonde vimos ressurgir moléstias anteriormente equacionadas como a dengue, a malária e a tuberculose. Estamos vivendo em um país onde se morre de fome, apesar das "coleções de bolsas" que o governo federal tanto ostenta. Um país onde se morre ainda de uma doença africana chamada ' Kwashiorkor ' que é uma forma de desnutrição infantil.
 
  Por sua vez, a nossa Fameb sempre nos deu uma grande orientação, e continua dando, porque quem faz a escola é o bom aluno. O Hospital das Clínicas, como a própria Universidade Federal, já vem em decadência há muitos anos, por muitos motivos, mas principalmente pela falta de investimentos por parte do governo federal no ensino público superior. Digo e repito que o ensino de medicina depende muito do aluno e esse depende de uma boa estrutura para ter uma boa formação. Eu fui um estudante pobre, eu estudava no antigo diretório acadêmico da faculdade no Terreiro de Jesus, porque estudante de Medicina tem que estudar a noite inteira. Cansei de pegar o sol com a mão.

   A gente brincava com os colegas dizendo: - vamos pegar o sol com mão! Na verdade, pegar o sol com a mão era ver o dia nascer. O dia nascia e lá estávamos, estudando propedêutica médica, medicina legal, os exemplos de quadros clínicos em livros caríssimos que nós não tínhamos condição de comprar. Portanto, precisamos ver a Medicina com outra ótica. Acho que esse momento que estamos vivendo, aonde tantos problemas vieram à tona, é histórico. Este ano, comemoramos os 200 anos da Faculdade de Medicina com festa, e tem que ser com festa, pois se traduz bastante justo festeja este grande marco da história da Bahia e do Brasil. Há algo de positivo em toda essa problemática?

   Tirando os nefastos preconceitos e as delirantes divagações de lado, digo que sim! Esse momento mostrou para nós outra janela, abriu uma porta, serviu como um grande alerta, o alerta de que precisamos cuidar da boa formação do profissional de medicina para o bem de toda a sociedade brasileira e baiana. Precisamos sim! Urgentemente! Cuidar da nossa Faculdade de Medicina da Ufba, a escola mater do Brasil, para que, num futuro bem próximo, tenhamos médicos cada vez mais capacitados, honrando e engrandecendo o bom nome da Fameb.