Nós, mulheres, adoramos esse estilo Conceição com firmeza, direto, sem meias palavras expondo em ficção algo que está sempre acontecendo em nosso país na relação homem x mulher
Maria Conceição Evaristo de Brito é mineiras de BH tem 78 anos de idade e está na estrada literária desde 1990 quando publicou textos nos "Cadernos Negros" ao tempo em que se dedicava a cátedra em Literatura Brasileira (PUC-RJ). Já tem na atualidade mais de uma dezena de obras publicadas em livros a partir de “Ponciá Vicêncio” (2003/2004) até “Macabéa Flor de Mulungu” (2023).
O livro que vamos comentar é de 2011 e intitula-se "Insubmissas Lágrimas de Mulheres” (Editora Malê, 140 páginas, ilustração e concepção da capa Iléa Ferraz, RJ, R$39,90 nos portais) contos tendo como personagens 13 mulheres com narrativas sobre violência doméstica, separação, estupro, machismo, alcoolismo, etc, temas fortes antigos e atuais, onde se misturam o real e imaginário (o livro é de ficção), e os leitores ficam sem saber distinguir o que é um (real) e o outro (ficção).
Os temas descritos pela escritora têm o uso de uma linguagem coloquial o que facilita a vida de quem se propõe a lê-lo e isso faz com que as pessoas se sintam integradas aos diálogos por ela criado, ou até percebam que já vivenciou momentos assemelhados em suas vidas o que pode acontecer com qualquer um. Daí que fica difícil entender o que é realidade e o que é ficção, pois, na sociedade brasileira fatos dessa natureza existem na real.
Conceição abre a série de contos com "Aramides Florença" uma mulher que se rejubilava com a partida do pai do seu filho menor que acolhia nos braços. A autora questiona: "Só a mãe. só a mulher sozinha, lhe bastava? O nome do pai do menino desconheço, pois Aramides só se referia ao homem como o pai de Emildes, ou como o pai do meu filho".
Na conclusão da narrativa a autora cita que a "sutil fronteira da comedida paz entre o homem e a mulher, se rompera. O dique foi rompido entre os dois desde a gravidez e o que ambos tentaram ignorar ganhou corpo com um estupro, "o homem me fazendo coisa dele, sem se importar com nada, nem com o nosso filho, que chorava no berço ao lado".
O conto seguinte é sobre "Natalina Soledad" que, de acordo com a autora, escolhera seu próprio nome ao ser rejeitada pelo pai. "Nascida mulher, a sétima depois de seis filhos homens, não foi bem recebida". O homem ficou decepcionado quando lhe deram a notícia de que o sétimo rebento não era um varão.
"Como podia ser? - pensava ele - de sua rija vara só saia varão! Estaria falhando? Seria a idade? Não, não podia ser... seu avô, pai de seu pai, mesmo com idade avançada, na quinta mulher, havia feito um menino homem. E todos os treze filhos do velho, nascidos dos casamentos anterior, tinham nascido meninos homens".
O velho se chamava Arlindo Silveira, o filho Arlindo Silveira Filho e o neto Arlindo Silveira Neto e quando a Silveirinha veio ao mundo, "a menina só poderia ser filha de outro, não se sua rija”.
Quando aconteceu a morte do pai a filha abdicou da parte da herança que lhe cabia e rejeitou a incorporação do nome familiar – Silveira. O o escrivão perguntou que nome adotara disse ser Natalina Soledad.
Os contos sejam – no geral - com esse mesmo enfoque. Os personagens homens são apresentados como impiedosos, sem sentimentos de civilidade com as mulheres, violentos, arrogantes e infiéis. A autora, portanto, segue a linha do feminismo bem radical no estilo homem é um ser do mal.
No conto três o diálogo da autora é com a personagem "Shirley Paixão" a qual pratica um homicídio contra seu companheiro. "Queria matá-lo, queria acabar com aquele malacafento, mas ele é tão ruim que não morreu! Não adianta perguntar se me arrependi. Arrependi não. Confessei a Policia o meu desejo, a minha intenção".
Claro, a ação de Shirley se deu depois que flagrou o homem estuprando uma das filhas do casal. "Eu precisava salvar minha filha que, literalmente, estava nas garras daquele monstro. Seria matar ou morrer. Morrer eu não poderia, senão ele seria vitorioso e levaria seu intento até o fim. E a salvação veio. Uma pequena barra de ferro, que funcionava como tranca para a janela, jazia em um dos cantos do quarto. Foi só um levantar e abaixar a barra. Quando vi, o animal ruim estatelado no chão".
O final do conto é feliz, Shriley pegou 3 anos de cadeia e depois ganhou a condicional. "Hoje, quase 30 anos depois desse doloroso fato, continuamos a vida. Das meninas, três já me deram netas”.
São 13 contos e descrevi a narrativa de três deles. Os outros dez seguem na mesma linha. Num deles intitulado “Adelha Santana Limoeiro” a mulher é chamada para socorrer o marido que estava num brega, contumaz cliente, que desfalecera nos braços ou quase dentro de uma novinha.
Nós, mulheres, adoramos esse estilo Conceição com firmeza, direto, sem meias palavras expondo em ficção algo que está sempre acontecendo em nosso país na relação homem x mulher, ainda hoje, diariamente, com violência doméstica frequente, feminicídios e todo tipo de aberração. Aos homens é recomendável ler “Insubmissas Lágrimas de Mulheres”.
O título, aliás, já diz tudo: insubmissa é ser rebelde, que não se sujeita e tende a ser livre. Só que seja, mas, melhor do que mal acompanhada.