Clássico da história antiga na pena do historiador ateniense Plutarco
Lúcio Méstrio Plutarco foi um historiador grego, biógrafo, ensaísta e filósofo, imortalizado por suas obras Vidas Paralelas e Morália. Viveu em 46 d.C.até 199 d.C. e estudou matemática e filosofia em Atenas. Visitou o Egito para conhecer e estudar alguns temas na Biblioteca de Alexandria e morou em Roma onde pesquisou sobre antiguidades e lecionou filosofia e outros assuntos. Muitas dessas aulas foram refeitas por ele em vários pequenos tratados - sobre vários assuntos - sob o título de Morália. É um autor até hoje citado e estudado nos centros acadêmicos mundiais que se ocupam da história antiga.
Plutarco assumiu a cidadania romana (a cidade eterna e centro cultural e político daquela época) daí a composição do seu nome, Lúcio Méstrio Plutarco. Seu patrocinador para a cidadania foi Lúcio Méstrio Floro, um cônsul romano de quem Plutarco foi admirador.
Hoje, vamos comentar uma das obras de Plutarco da coleção Autores Gregos e Latinos - série textos gregos - da Clássica Digital Brasil intitulado "Vidas Paralelas - Alcibíades e Coriolano (Editado pelo CECH - Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos da Universidade de Coimbra e pela Editora Annablume, tradução do grego, introdução e notas de Maria do Céu Fialho e Nuno Simões Rodrigues, à venda pela internet R$50,00) que aborda duas personalidades de contextos históricos diferentes.
Alcibíades pertence ao momento de uma democracia em crise, numa Hélade em vésperas de se lançar na Guerra do Peloponeso. Coriolano pertence aos primórdios da República romana. Se a figura do primeiro tem contornos históricos nítidos, a do segundo debate-se entre a História e os contornos lendários.
Alcibíades foi extremamente polêmico. Nascido de uma ilustre família ateniense em 450 a.C. e dotado de beleza, capacidade de sedução e dotes oratórios foi educado por seu tio Péricles. Conta-se nas "Invectivas de Antifonte" que, ainda menino, fugiu de sua casa para ter com Demócrates, um dos seus amantes. Quando conheceu Sócrates afastou o séquito dos seus amantes ricos e famosos e este se tornou seu companheiro habitual, "e escutava os ensinamentos de um filósofo que não andava em busca de prazeres indignos de um homem, nem reclamava beijos ou carícias".
O amor de Sócrates por Alcibíades - estrategista e político - embora contasse com muitos poderosos rivais era dominado pelo filósofo. Quando Alcibíades se lançou na política - cita Plutarco - "ainda que fosse um adolescente, eclipsou a maior parte dos oradores, mas teve que antagonizar com Féax, filho de Erasístrato, e com Níceas, filho de Nicérato".
Alcibíades atuou como estratego em várias batalhas em especial na Guerra do Peloponeso conflito Atenas x Esparta - cidade estado de tradição militarista. Alcibíades foi acusado de sacrilégio por profanar a estátua do Deus Hermes - desertou a refugiou-se em Esparta. Em 411 a.C. comandou a esquadra ateniense em Samos e recolocou o domínio do mar Egeu nas mãos de Atenas, assim que retornou a sua origem. Após sucessivas derrotas e vitórias refugiou-se na Pérsia onde foi assassinado pelos sápatras, ligados a Sparta.
É uma história complexa e comenta-se que a biografia de Tucídedes seja melhor do que a de Plutarco sobre Alcibíades. Plutarco narra a morte de Alcibíadis com ocorrência na Frígia onde vivia numa aldeia com a cortesã Timandra. Teve um sonho antes da morte em que envergava as vestes da cortesã, em cujo regaço reclinava a cabeça, enquanto lhe compunha o rosto com cosméticos como se fosse uma mulher.
Os homens que foram com a missão de matá-lo cercaram sua casa e atearam foto. Ele teria se lançado sobre o fogo com o punhal em punho e foi atingido por dardos e flechas. Com Timandra teve uma filha chamada Laís, "a Corintia".
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O outro personagem tratado por Plutarco é Coriolano cuja história supostamente se passou 493 a.C. - o mais antigo caso conhecido de um cidadão de Roma que renuncia a sua cidade Pátria. Gaio Márcio é um general romano que se opõe às reformas que, em Roma, tentam favorecer a plebe. Márcio acaba por ser banido da sua própria cidade, para se aliar aos Volscos, povo inimigo da Urbe.
Segundo Plutarco é Coriolano quem incentiva os Volscos a fazer a guerra contra os romanos assumindo o comando das tropas. Reúne as condições para atacar Roma, mas antes de atacar a cidade a mãe e a mulher de Coriolano vêm até ele como spulicantes e convencem-no a abandonar a ideia de conquistar a sua Pátria. Gaio Márcio recua e acabou sendo assassinado pelos Volscos.
É um personagem polêmico da história da Roma Antiga e muitas divergências entre os historiadores sobre sua personalidade. O historiador Cicero refere-se a ele como "protótipo de traidor". Já Tito Livio apresenta Coriolano "como um dos heróis do passado romano, ainda que com uma história infeliz: um grande general mas como um estadista falhado". Dionísio de Halicarnasso descreve a sua morte como "verdadeiro modelo de justiça e piedade.
Coube exatamente a Plutarco no início do II d.C. o mérito de tanto reconhecer as características positivas como as negativas de Coriolano, recriando um novo modelo que viria a ser seguido posteriormente". Plutarco retrata Coriolano com os matizes de um caráter trágico-patético, latente na essência do personagem, que acabarão por proporcionar a Shakespeare a matéria prima para uma das suas obras fundamentais - Coriolan- centrada na ambição, na busca das honras e da ira".
O fim de Coriolano também foi trágico para os Volscos. Quando os romanos souberam de sua morte, a pedido das mulheres, estabeleceu-se um luto por dez meses, determinado por Numa Pompílio. Os Volscos sentiram a falta de sua liderança no enfrentamento com os Équos, que eram seus aliados. Enfraquecidos, foram atacados pelos romanos e derrotados sendo morto seu lider Tulo e destruida a fina flor de suas tropas. Os Volscos habitavam a região central da atual Itália.
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Vidas Paralelas - Alcibíades e Coriolano - é um livro de dificil compreensão para os leitores normais. Custa-se a crer que alguém se interesse por esse tipo de assunto de uma época tão retoma que está a completar 2.400 anos de existência.
Os historiadores asseguram com convicção que para entender o mundo atual é preciso saber e entender o mundo antigo, pois somos descendentes de toda essa linhagem e a cultura vem enraizada há milênios sem perder a sua essência. Não há mais espartanos, volscos, romanos, equos e outras tribos, mas toda uma descendência dessa raiz milenar.