Um livro sem censura expondo toda s sua trajetória musical, um legado interessante para estudiosos
O mercado de livros revela anualmente publicações de personalidades que não integram o ofício da literatura e fazem imenso sucesso. A bola da vez é a cantora e compositora Rita Lee que expôs com todas as letras e adjetivações possíveis um relato de sua vida pessoal e artística. A própria cantora foi quem escreveu a obra e não entregou a missão a nenhum 'order writte' (escritor de encomenda) confiando em sua memória e na sua verve.
E não faltaram animação e criação no texto, até por isso, provavelmente, o livro seja um sucesso de vendas.
"Rita Lee - uma autobiografia" (Globo Livros, 294 páginas, 2017, R$40,00) é um documento, em especial sobre a vida da cantora, mas, também e sobretudo, um livro que retrata momentos da cidade de São Paulo a partir das décadas de 1950, os costumes, as familias, a tranquilidade da Vila Mariana e o mundo da música com seus artistas, suas interpretações, seus desafios e suas loucuras.
Rita Lee também revela alguns traços e momentos da imigração para São Paulo, seu pai era um descendente dos Confederados da Guerra de Secessão nos EUA (Charles Fenley Jones) e cujas familias foram morar em Americana, uma cidade paulista, município que foi programado por Dom Pedro II para receber esses gringos; e da imigração italiana, donde viera sua mãe - Romilda Padula, Napole/Rio Claro.
Só por esses detalhes, o livro já é uma preciosidade. Eu gosto dessa palavra e a uso muito, porém, só quando, de fato algo é valioso. E a narrativa de Rita Lee Jones, seu nome completo, tem esse valor. Ela vai aos detalhes das familias a partir da sua e isso é muito interessante para o leitor que se sente envolvido com a trama e passa a conhecer esse realidade e transpor alguns desses lances para as suas vidas.
Além disso, a cantora tem uma bagagem artística, um legado extraordinário, ela que foi pioneira do rock nacional me em muitos aspectos da vida artística musical brasileira.
Ao final da leitura de sua autobiografia fica até dificil definir quem foi (e ainda é), de fato, a cantora e compositora Rita Lee, uma agitadora do mundo da música com seus parceiros das mais interessantes, que vão de Raul Seixas a Elis Regina; de João Gilberto a Gilberto Gil.
O livro é, também, um enorme passeio por ícones da MPB, os festivais de música da antiga Record de SP, os bastidores, os ciúmes, o nascer do rock que recebeu críticas até de Henfil e da esquerda papuda brasileira, enfim, um grande legado.
Tudo feito com muita dedicação, muito trabalho, um imenso esforço para organizar a parafernália de instrumentos e engrenagens ainda elétricas do rock dos anos 1970, isso partindo de uma mulher aparentemente frágil, em alguns momentos de sua vida imersa em drogas, e quando não havia, como hoje, toda uma organização e apoio técnico em volta dos artistas. Naquele momento e em algunas ocasições era o artistas quem montava as estruturas, dirigia os veiculos, tocava, cantava e empresariava.
Vida suada desde os primórdios quando decidiu que sua trajetória estaria vinculada a música, a criatividade, a composição, a irreverência, a criação, com um senso de profissionalismo irradiante. Fosse outra pessoa - como foram muitos que iniciaram por este roteiro e o abandonaram - teria desistido, pois, demorou a acertar na veia do sucesso e quando este veio parecia deixar escapar as oportunidades, recirar-se, irradiar novo astral e lá estava ela, de novo, cantora que nunca se considerou boa de voz, inebriando as plateias.
Rita foi um fenômeno da música popular brasileira e dissemos isso porque suas canções estão aí, eternas, um sopro de alegria e de entusiasmo neste Brasil pouco criativo musical dos dias atuais, abordando temas que até hoje são extremamente relevantes como amor & sexo, femininsmo, tropicalismo, justiça, magia loucura e outros.
Enfrentou a censura do periodo do governo militar, entre 1964 a 1984, e foi dribrando-a ao seu modo, modificando algunas exprtessões de suas canções, mas, sem deixar prostituir as letras. Critica alguns colegas de profissão sem ofensas, enaltece outros, lembra passagens com Elis Reginal e Hebe Camargo, a sua amizade com Gil - padrinho de um dos seus filhos - e lembra muitos episódios do cenário musical brasileiro.
Teve em Roberto de Carvalho, seu esposo e pai dos seus filhos, um parceiro genial com quem compôs muitas de suas deliciosas músicas, com ela descreveu em "Mania de Você", uma das suas mais belas e emblemáticas canções: Meu bem, você me dá água na boca/Vestindo fantasias, tirando a roupa/Molhada de suor de tanto a gente se beijar/De tanto imaginar loucuras. Ja naquela época Rita falava do amor cinderela por telepatia: A gente faz amor por telepatia/No chão, no mar, na lua, na melodia/Mania de você/De tanto a gente se beijar/De tanto imaginar loucuras.
Esse é um traço da personalidade de Rita Lee Jones, o Lee seu pai Charles colocou no nome ao homenagem ao general Lee, que lutrou contra as tropas de Lincoln, uma pessoa que se revela apegada a familia, a mãe Chesa e as irmãs, as almas gêmass Carú e Balú, aos animais - teve de cães a onças - aos filhos, aos amigos, ao marido e agora a netinha, ela que chega a casa dos 70 anos ainda cheia de vitalidade, porém, aposentada dos palcos, do mundo da música para exibir-se.
Conta que o grande legado de sua vida musical foi deixar as pessoas felizes, cantar e fazer com que seus fãs, seus seguidores, a platéia, sentisse um imenso prazer de ser feliz.
Sua obra musical é imensa e intensa e vai de 1966 a 2012 quando lançou 'Reza", até agora, seu último trabalho. E aí estão as fases de os Mutantes, Tutti Fruti e da Rita Lee/Roberto, mais com a assinatura da Rita Lee. Gostoso ela comentar de forma suscinta cada uma das músicas numa discografia de 29 'bolachões' e CDs/DVDs , o que, connvenhamos torna-se objeto para estudiosos da música.
Rita Lee, uma autobiografia - é, de fato, um livro bem interessante. Um retrato da Rita Lee que milhões de brasis adoram, sem censura, sem pieguismo, sem mirar-se como exemplo, apenas o que ela sempre foi: uma personalidade irreverente, autêntica e criativa.