Paulo Coelho trata o tema de forma linear e deixa os leitores à procura de emoções que não encontrarão
Muita gente torce o nariz para os escritos de Paulo Coelho. Eu aprecio. E como. O autor está mais refinado, com texto conciso, linguagem simples sem o uso de termos sofisticados para demonstrar erudição - o que nem sempre é agradável - e esse vicio o carioca que vive na Suiça não comete.
Pelo contrário, a grande virtude de Paulo Coelho é escrever livros que podem ser lidos e entendidos em qualquer parte do mundo. Daí o sucesso de vendas que experimenta em todo o planeta - na Rússia, na Colômbia, na China e assim por diante. Paulo Coelho é lido em 168 países e seus livros já foram traduzidos em 80 idiomas.
Em sua nova obra intitulada Adultério (Editora Sextante, 239 páginas) escrito em Genebra, 2013, Paulo Coelho aborda esse tema com simplicidade e narra um caso envolvendo uma jornalista (Linda, 31 anos) com casamento padrão-perfeito, vida amorosa estável, filhos adorados e estabilidade no emprego, todos os ingredientes que a levariam a ter apenas uma vida a dois, ideal.
A rotina - e na Suiça com economia estável e bom viver esse drama é crucial - no entanto, a deixa senão angustiada, ao menos querendo quebrar um pouco esse sentimento que a domina, dia após dia, como se fosse obrigada a degustar café com leite e pão por toda a sua vida.
A jornalista muda seu comportamento e atitudes quando encontra com um ex-namorado da adolescência - Jacob, agora um politico bem sucedido e envolvente. Ao fazer uma entrevista com o homem se vê apaixonada e se entrega de corpo (sem a alma) num ato sexual dos mais comuns (um beijo ardente e só adiante, noutra oportunidade um boquete), o que a deixa atormentada, sobressaltada, imaginando que seu esposo desconfiaria dela, de imediado, num sentimento de culpa que a vai perseguir, ainda que o casal seguisse sua rotina sem anormalidades.
Contextualiza o autor todo enredo da história 'prendendo' o leitor à trama como se algo de mal feito tivesse acontecido e Linda pudesse pagar caro sua 'aventura' mostrando a vida na Suiça, os atrativos, os costumes, a sociedade que, de tão linear leva a uma rotina atormentadora.
Coelho aborda tema tão complexo como o adultério tratando o assunto como se fosse uma conversa a partir do enfado de um casal, da mesmice:
'Acordo e repito os mesmos rituais de sempre - escovar os dentes, me arrumar para o trabalho, ir ao quarto das crianças despertá-las, preparar o café da manhã de todos, sorrir, dizer que a vida é bela. Em casa minuto e em cada gesto, sinto um peso que não consigo identificar, como o animal não entende direito de que maneira foi capturado em uma armadilha', comenta Linda num dos diálogos.
São os primeiros sintomas do adultério. Linda ao fazer uma etrevista com Jacob 'em busca de uma história complicada que envolvia adultério, chantagem e corrupção' se sente atraida pelo entrevistador e dá-lhe um beijo sendo imediatamente retribuida'.
E aí, seu sentimentos de impotência, fragiliddae, fracasso e insegurança são substituidos por uma imensa euforia. Teria sido isso mesmo! Asas para voar. A liberdade de agir sem preconceitos, o controle do seu pensamento e de suas ações, ou um momento de fraqueza, de fuga, de escape.
Essa dualidade vai permear o livro por todo texto. Linda tentando entender o que teria acontecido e querendo avançar ainda mais nessa direção com Jacob, se entregar por inteiro, e o sentimento de 'culpa' de que estaria traindo o marido, se deveria contar o que se passava com ela ou não, e uma série de tormentos em sua cabeça.
Escrever sobre adultério não é uma tarefa fácil. Há inúmeras obras de grande valor literário - Tolstói, Flaubert, Joyce - com mergulhos mais consistentes e dramáticos sobre a infidelidade.
Na obra de Paulo Coelho, quem já leu sobre o tema e espera algo dramático em relação a Linda perde seu tempo.
Até que o leitor fica esperando algo mais dramático, algo mais emotivo, algo que desperte maior interesse pela trama, mas, o autor prefere um texto linear até o final do livro, sem que esse momento seja focado.
É uma pena porque é exatamente ai que o livro perde densidade e se torna uma água-com-açucar ao estilo de outras personagens de Coelho - Veronika, Brida, Pilar, Maria, etc - sem grandes emoções.
Sobre adultério existem obras bem melhores do que esta de Paulo Coelho. Ainda assim, vale a pena lê-lo até para entender esse fonêmeno de vendas que é. Talvez esteja nessa linearidade, nessa forma quase evangeliária de escrever com citações bíblicas, profecias e outras, que o público se identique melhor do que com algo mais denso, de penetração da alma humana.
Há quem veja no Adultério de Paulo Coelho algo de pinceladas dos 50 Tons de Cinza, em moda literária, o que teria conduzido o autor nessa direção. É, pode ser.
Como literatura mais profunda não recomendaria esse livro. Como fenômeno de vendas, de interesse coletivo, sim. Vale a pena conhecer.