Existe uma extensa literatura sobre Abraham Lincoln o presidente norte-americano que pôs fim a escravidão nos Estados Unidos, em janeiro de 1863, e comandou a unificação do país com a Guerra de Secessão (Norte x Sul), guerra civil que durou todo seu primeiro governo e parte do segundo, resultou na morte de 600.000 pessoas com batalhas sangrentas e demandou um fervor cívico que moldou a unidade no país.
Lincoln é considerado um dos mais importantes presidentes do EUA, responsável diria assim, pela consolidão da Nação, nascida na guerra da Independência entre 1771 e 1783 comandada por George Washington, 1º presidente constitucional (1789/1797) e considerado o pai da Pátria.
O livro "Lincoln" da historiadora Doris Kearns Goodwin (publicado no Brasil pela Editora Record, 322 páginas), que baseou o filme de Steven Spielberg de tanto sucesso recente, é revelador da personalidade e do estilo da liderança de Lincoln, fundamental para o entendimento da guerra civil norte-americana e seus principais personagens, e de como esse advogado interiorano, peregrino, que começou a carreira em New Sallen e depois transferiu-se para Springfield, capital de Illinois, conseguiu derrotar fortes candidatos a presidencia no Partido Republicano, em 1860, o senador de NY, William H Seward; o governador de Ohio, Salmon P Chase, e o estadista do Missouri, Edward Bates.
Só este feito já foi considerado extraordinário porque Lincoln era senador de Illinois (já havia, antes, derrotado o temivel líder democrata Stephen Douglas, em 1858, mas com repercussão apenas localizada) e pregador de ideias antiescravistas. O fato de vencer a William Seward, senador por NY, considerado pela imprensa um politico que se apresentava imbatível na convenção republicana a presidente, surpreendeu o mundo politico nos EUA e revelou sua aptidão para chegar a Casa Branca.
A partir desse momento, quando Abe (apelido de Abraham) ganha a convenção interna nos Republicanos (ex-Whigs) passa a ser visto com outro olhar pela Nação. Naquele meados do século XIX, tendo-se como veiculos de comunicação mais importantes os jornais (imprensa escrita), isso tornava mais remota e lenta a difusão de nomes novos na massa popular, Lincoln encontrou pela frente mais essa dificuldade rumo a Washington.
Considere-se, ainda, que o então presidente dos EUA era o democrata James Buchanan um incentivador latente da divisão Norte e Sul, mais pendente ao Sul escravista, o que tornara a aspiração de Lincoln mais complicada.
Lincoln, no entanto, não esmoreceu. Pelo contrário, ganhou força politica e adesões à sua causa principal, e foi à luta com determinação e sutileza que surpreenderam os republicanos. Foi, assim, que venceu as eleições em 6 de novembro de 1860.
Lincoln se utiliza de um expediente que, na percepção atual parece jussárica, que era a correspondência pessoal, do própio punho, epistolar, que o identifcava por estilo único. Foi através desse meio manual e usual na época, correspondências levadas por estafetas em lombos de cavalos e carruagens, que Lincoln, já eleito presidente (assumiu o cargo em março de 1861) consegue convencer seus ex-desafetos republicanos a integrar os mais altos cargos do governo: Seward, Chase e Bates.
Doris Kearns vai a detalhes no seu livro, ao âmago da politica norte-americana, lembrando que a trajetória de Lincoln se dá na oposição a um presidente democrata num momento complicado da vida norte-americana, do inicial processo de industrialização do Norte e da tentativa de afirmação do modelo agrícola escravista do Sul. Eleito presidente, demonstra determinação férrea em levar adiante seus pontos-de-vista tanto no enfrentamento da guerra civil visando unificar o país num só território; quanto na Proclamação da Emancipação dos escravos, texto que redigiu do próprio punho.
O livro revela, ainda, o enfrentamento das batalhas entre a União e os Estados Confederados (as sangrentas Bull Run, Spotsyvania, Colt Harbor, Chanccellorsvile, e as decisivias Gettysburg e Vicksburg), as personagens dos dois principais estrategistas militares, os generais de campo Ulysses S. Grant (União) e Robert E. Lee (Confederados), as batalhas sangrentas que aconteceram para conquistar posições estratégicas (Richmond e Atlanta) e a vitória da União depois de milhares de mortos, com a unificação do pais e o perdão dado a Lincoln aos derrotados: "Não quero que ninguém seja punido, tratem todos com liberdade" - foi sua ordem.
A autora, por fim, conta o assassinato de Lincoln no teatro Ford, em Washington, ainda quando comemorava esse feito extraordinário.
Para quem deseja conhecer parte da história dos Estados Unidos trata-se de um belissimo documento, recheado de lances politicos e estratégias militares, os confrontos pelo poder e a capacidade que teve Lincoln de lidar com os homens, entendendo que na luta para salvar a União havia um propósito maior do que abolir a escravidão, que era a capacidade dos norte-americanos se governarem como um único povo.