Colunistas / Filosofia Popular
Rasta do Pelô

Esposa do Rasta degusta camarão na moranga com pinote de grilo

Dona Céu faz receita do camarão na moranga e tem noite de luz de mel. É brincadeira.
03/12/2014 às 09:00
As novas tecnologias também encantam as emergentes da classe C e diria que já estou ficando irritado com aquela cantoria do Whatsapp de dona Céu, minha santissima esposa, na troca de mensagens com suas amigas.

   Mas, fazer o que! São os novos tempos e a gente tem que se adaptar senão fica pra trás. Até recentemente quando queríamos telefonar para alguém iamos no orelhão da Padaria de Sêo Pepe e fazíamos uma ligação. Depois que melhorei a receita foi que instalei um telefone fixo em casa na Caixa D'Água porque a linha só ia até o IAPI, aqui telefone falhava demais. De uns tempos pra cá, com os celulares, já desliguei o fixo, raramente alguém usa o orelhão da padaria, e agora veio esse luxo do Whatsapp. Dona Céu e as amigas não querem mais saber de facebook.

   Criaram até um grupo lá do salão da Adrea Lady Lú, só de mulheres de meia idade, que é um tititi, um mumumu dos pecados. Troca de fotos, troca de imagens, que santo pai todo poderoso. Até de papais-noel estilosos, jovens, colocaram com panetones à mostra.

   Mas, a novidade que gostaria de compartilhar com nossos leitores e leitoras, pra vocês sentirem quanto a Classe C evoluiu, isso graças ao nosso "Rei Sol", e veja que até eu já estou falando em compartilhar, dona Céu anda grudada no programa da Ana Maria Braga e comrpou um livro de receitas de comidas. Óbvio, via E-Comércio, tudo pela internet e pelo cartão de crédito recebendo o tal em casa, e resolveu me colocar como cobaia para testar um camarão na moranga. 

  Eu falei pra ela: - Mas que invenção é essa mulher! A gente nunca comeu camarão, salvo quando vai em algum lançamento de livro no Pelô na Fundação Casa de Jorge Amado ou no saguão da Assembleia Legislativa com Sêo Bina, e tu quer logo fazer esse tal de na moranga?

   - Se eu falasse pra você que iria fazer um camarão na jerimum seria motivo de gozação. Então, usei a palavra técnica, correta, que é camarão na moranga, uma espécie de abóbora onde os chiques produzem um camarão especial, de fino paladar - comentou.

    - E você vai acertar fazer um troço desses pelo amor de São Bendito de Categeró?

   - Que mistério tem! Mais dificil é fazer uma feijoada e eu faço muito bem. Já tirei algumas dúvidas com minha irmã Cervejão, já vi Ana fazendo (fala de Ana Maria Braga nessa intimidade)  e não tem segredo algum. Só quero que compre 1 k de camarão médio, uma lata de creme de leite e uma jerimum, tipo moranga. Não me venha com camraões miudos e jerimum verde - pediu.

   - Como é essa moranga que nunca vi lá em São Joaquim? 

   - Ora, cor de morango.  Vá na tenda de Anatólio que ele sabe como é. Quero tipo médio para fazer um jantar romântico pra nós dois - frisou.

   Lá fui eu pro trabalho, vender minhas toucas de lã na ladeira do Pelô com essa missão. Claro que liguei logo pro meu consultor Badu, o intelectual de bigode, o qual mora em Brasília e é camarada chique, não tanto como o conselheiro Souza nem o causídico Zéu, e comentei o desejo de minha senhôra.

   - Muito bem. Ela tá certa, ainda que você não mereça tal deferência - comentou Badu.

   - Vá se f...porque se tem um cara que agora também é chique sou eu.

   - Mas duvido que já tenha saboreado um camarão na moranga. Vai engasgar na hora que der a primeira garfada e querer comer a abobóra amassada com leite, como se fosse sopa - pilheriou.

  - Deixa de ser ignóbil. Já sei como é que se come esse tal do camarão na moranga e pra isso me informei com gente de saber culinário, com Sêo Moreira do Porto - avisei.

   - Você vai queimar a boca porque aquele português só sabe preparar moqueca de pescada amarela e bacalhau - arreliou.

   - Ah! vá catar cavaco e passe bem, desliguei o celular. 

   Ao invés de ir a São Joaquim desci a Baixa do Sapateiros, fui até a Feira da Sete Portas, comprei a moranga, os camarões, a lata de creme de leite sem soro e uma cabeça de dente de alho.

   Ao chegar em casa dona Céu já tava com aquele avental de gourmet, na frente escrito 'o amor tudo pode' e após entregar as mercadorias ela disse assim: - Agora você vai me ajudar. Pegue uma faca de ponta e faça uma tampa na moranga e depois retire as sementes.

    Que loucura. Lá fui eu sem a menor experiência culinária fazer tal iniciativa e retirar as sementes. A abóbora era das melhores. Tinha semente como um corno. Já ia jogar as sementes no lixo quando fui advertido.

   - Você é antiecológico. Separe as sementes, limpe todas e vamos colocá-las no sol. Depois, irão ao forno em fogo brando para serem tostadas. São leguminosas boas para o estômago.

   - Isso se dá é pra porco - afiancei.

    - Burro! É diurético, morfologicamente bom para o estômago.

   - Tá bom - conseti.
- Agora pegue esse papel laminado, cubra a moranga e ponha no forno e deixe assim por 45 minutos, recomendou.

   - Vai torrar, vai virar abóbora de carvão - sorri.

   - Não vai nada. Vi Ana Maria Braga fazendo e não torra coisa alguma. Enquanto isso vá colocar a mesma, as velas e o vinho 'Autoritas Pinot Grigio' para descansar.

   - Que vinho 'pinote de grilo' é esse mulher! Tu já viu vinho descansar. Quem descansa é meu cachorro que tá aqui dormindo - comentei.

   - É um vinho de uva gris que em francês signica cinzas usada para produção de vinhos brancos. Essa que vamos tomar é um italiano - mostrou toda sua sabedoria.

   Lá fui à varanda com essa nova missão e quando retornei a cozinha, a mulher refogando o camarão, dourando a cebola e amassando o alho, observei que algo estranho havia no forno. Quando abri a tampa um fumaceiro enorme havia tomado conta do local e gritei pra Céu: 

   - A moranga tá fumaçando...a moranga tá pegando fogo.

  -Desliga rápido que o papel laminado se incendiou - gritou aflita.
 Felizmente, depois de passado esse susto, a moranga estava apenas tostada, mas, salva do naufrágio.
Aí dona Céu deixou esfriar um pouco a abóbora, colocou os camarões no seu interior já temperados com pimenta, suco de limão e tomates e ficou aquela coisa bonita, maravilhosa de se ver.

   Vinho à mesa, livro de Paulo Coelho - agora é nosso autor predileto - para emoldurar o cenário, velas, música de Pablo no smartphone, toda aquele ambiente romântico, nos deliciamos.

   - Maravilha. Os camarões estão uma delicia com esses fiapos de abóbora prendendo nos meus dentes, tal quando chupo manga - frisei.

   - Hi! Você não sabe ser romântico. Não vai aprender deixar essa mania de classe D nunca - borrifou.

   Nada! Foi uma noite lua de mel maravilhosa e adorei o 'pinote de grilo'. Um bom vinho.