Política

OS ACERTOS E ERROS DE ACM NETO NA CAMPANHA PARA GOVERNADOR (TF)

Candidato enfrentou uma poderosa estrutura política e eleitoral no estado comandada por Rui Costa e Otto Alencar
Tasso Franco , Salvador | 01/11/2022 às 10:53
ACM Neto excelente desempenho
Foto:
     O adversário de Jerônimo Rodrigues (PT) nas eleições para governador da Bahia, em 2022, foi o ex-prefeito de Salvador e ex-deputado federal ACM Neo (União Brasil). Eleição decidida em 2º turno com vitória de Jerônimo com 52.79% (4.480.464 votos) e ACM Neto 47.21% (4.007.023) uma diferença de 5.58% (473.441 votos). Foi a mais acirrada disputa desde a primeira eleição do PT na Bahia, com Jaques Wagner, em 2006, eleição vencida contra o então governador Paulo Souto no primneiro turno; Wagner voltando a vencer em 2010, também no primeiro turno; e Rui Costa sendo vitorioso em 2014/2018, ambas no primeiro turno, a última contra José Ronaldo de Carvalho - DEM (76%x24%), uma diferença de 52%.

  Cada eleição tem sua própria história, José Ronaldo entrou na disputa, em 2018, depois de uma desistência de ACM Neto, na época exercendo o mandato de prefeito de Salvador, em seu 6º ano, e Rui, que era um governador bem avaliado venceu com facilidade. 

  Em 2022, com ACM Neto candidato e Rui Costa colocando um nome fora do círculo da política, o secretário da Educação do Estado, que havia substituido Walter Pinheiro, com baixos índices no IDEB, o cenário foi diferenciado e pela primeira vez, em 16 anos, uma eleição foi para o 2º turno, com certo sobressalto no final da campanha diante do crescimento de Neto nas grandes cidades.

  Há vários fatores a considerar nesta campanha e diria que ACM Neto cometeu poucos erros políticos e na estratégia de marketing da campanha, naturais diante de um arco de alianças tão amplo que conseguiu montar, ainda tendo que enfrentar um antigo aliado de gabinete que ajudou a eleger deputado federal, João Roma, o qual saiu candidato a governador pelo PL com o apoio do presidente Bolsonaro, e fez o jogo, em determinados momentos, do petismo. Há dúvidas se Roma tivesse amealhado mais do que os 9.08% dos votos que obteve se a eleição não teria se findado no 1º turno. Jerônimo bateu na trave com 49.33% dos votos diante de um ACM Neto, aparentemente, batido com 40.88%.

  Esse foi o primeiro obstáculo enfrentado por Neto. O segundo foi a composição da chapa majoritária nas negociações com PP, PDT, Republicanos, UB, Podemos, PSC, Solidarieda, PMN e nos primordios com o MDB. Negociações demoradas e difíceis uma vez que todo mundo queria indicar o vice e/ou o candidato ao Senado. Quando o PP rompeu com a base governista fechou-se o nome para o Senado, João Leão, depois seu filho Cacá Leão. Para vice, Neto não aceitou as exigências dos irmãos Vieira Lima e MDB migrou para Rui emplacando o candidato a vice-governador Geraldo Jr. 

  Foram tensas as negociações com Marcelo Nilo e José Ronaldo de Carvalho na disputa para vice. O Republicanos do bispo e deputado federal Márcio Marinho queria a vaga e tesou. Neto não aceitou, mas permitiu que o Republicanos indicasse um nome daí surgindo em articulação programada pelo próprio Neto, Ana Coelho, empresária, cuja ligação com a política é ser casada com o deputado estadual Tiago Corrêa. 
  Chapa lançada, apaziguado Marinho, Neto enfrentou o desgaste de acalmar e manter no seu ninho político Marcelo Nilo e José Ronaldo de Carvalho, sobretudo este último, já sendo cortejado por Rui Costa. Isso demorou um pouco e o eleitorado de Feira, muito ligado a Ronaldo, sentiu e torceu o nariz para ACM Neto, só lhe dando uma votação melhor no segundo turno. Fosse Ronaldo seu vice, o quadro seria outro. Mas, se isso acontecesse, Neto poderia perder o Republicanos. E o candidato do UB optou pela sensatez entendendo que Ronaldo jamais iria para o PT diante das eleições municipais de 2026, o PT com seu eterno candidato, o deputado PT Zé Neto.

  Tudo pacificado começou a campanha prorpiamente dita. Ana Coelho não acrescentou (politicamente falando) nada a chapa, nem o fato de ser mulher porque isso não sensibiliza um eleitorado num estado tão grande com "currais" eleitorais bem sedimentados. E a troca de João Leão, por Cacá Leão, mesmo o pai adoentado, foi um erro. Se Leão (o velho) tivesse ficado na chapa, ainda que não viajasse para os lugares em que Neto foi, e foram mais de 320 municípios, seria de melhor valia porque é mais espirituoso do que o filho, este com problema facial, e carismático.

  Observando que, do outro lado, o candidato ao Senado era Otto Alencar, lider do PSD, o político mais municipalista da Bahia pós-Lomanto Jr com base bem sólida no interior eleito com 58.4% dos votos, uma votação superior a de Jerônimo (49.33%) e somente abaixo da de Lula (69.27%); e ainda havia uma candidata que se tornou um fenômeno eleitoral, a Dr Raíssa, PL, que obteve mais de 1 milhão de votos para o Senado, uma votação que se aproximou a de Cacá.

  Um terceiro obstáculo para a campanha de Neto foi a ausência de um nome a presidência que pudsse se agregar uma vez que Lula, muito poderoso na Bahia, o petismo defendia o voto dobrado 13/13 (Lula/Jerônimo), João Roma defendia o voto dobrado nele e Bolsonaro 22/22; e Neto ficou com o 44 isolado sem puder transitar nem no 22; nem no 13 defendendo a neutralidade e capacidade de governar com qualquer que fosse o presidente escolhido pelos brasileiros. 

  Isso não lhe prejudicou tanto do ponto de vista eleitoral tanto no 1º turno; quando no 2º turno, uma vez que teve votos 44/22 e 44/13, mas a explicação ao público foi complicada. E, como Jerônimo não teve esse problema a aliança 13/13 foi quase perfeita. Se Lula tivesse vindo na Bahia mais vezes no primeiro turno, Jerônimo poderia ter vencido no 1º turno. Mas Lula só veio no finalzinho em caminhada ao Bonfim quando as imagens não davam mais tempo de colocar nos meios de comunicação de massa.

  A verdade é que tanto Lula quanto Bolsonaro analisando os números e sabendo da força popular de ACM Neto, os institutos de pesquisas dando ele como provável vencedor na avaliação do 1º turno não criticaram o candidato do UB em momento algum, o mesmo fazendo Neto em relação a Bolsonaro e Lula. Foi um jogo muito sutil e que aconteceu, também, no Rio Grande do Sul, no segundo turno na eleição entre Eduardo Leite e Onix Lorenzoni.

  Esse exercício da neutralidade foi complicadissimo para ACM Neto e sobretudo para seu marketing na TV, em parte, duramente atingido pela Justiça Eleitoral no 1º turno, que lhe tirou centenas de comerciais e programas do ar, e isso se modificou um pouco, no segundo turno, quando Bolsonaro veio a Bahia e disse que era para os seus eleitores votarem em Neto.

  Tivemos, pois, uma eleição diferenciada do 1º para o 2º turno, ACM Neto crescendo nos grandes colégios eleitorais (venceu em 16 dos 20, inclusive Salvador, Feira, Conquista, Lauro de Freitas, Juazeiro, etc) e encostou em Jerônimo.

  Neto, no entanto, teve que enfrentar a questão mais dificil de sua campanha, como entrar nos "currais" eleitorais na retaguarda da base governista. Não conseguiu. Waldir havia conseguido isso com as adesões de Nilo Coelho, Rui Bacelar, Luiz Viana Filho e Jutahy Magalhães, em 1986; Wagner conseguiu isso quando Otto Alencar e Leão e outros carlistas aderiram a sua campanha, em 2006; mas não teve êxito em desmantelar a base de Rui uma vez que Otto Alencar se manteve fiel ao petismo. 

  O senador Angelo Coronel (PDS) ficou mais distantes do petismo, elegeu dois filhos deputados, mas também não declarou seu apoio a Neto. E, o PP, ainda que Leão tenha conseguido manter os prefeitos das grandes cidades no partido, muitos outros, dos pequenos municípios migraram para Jerônimo.

  Essa base foi que deu a vitória a Jerônimo o candidato vencendo em mais de 360 municípios dos 417 no segundo turno, graças, sobretudo ao empenho de Otto Alencar e do PSD, partido que elegeu os deputados mais bem votados no estado. Claro, sem desprezar a estrutura política do petismo com Rui Costa comandando, o PCdoB e o PSB.

  A questão étnica - Neto ter declarado ser pardo - não teve a menor relevância no âmbito geral da campanha. Rendeu muita marola, porém, os movimentos organizados de negros na Bahia quase todos são atrelados ao PT, PCdoB e PSB, portanto já votam no PT.

  Diriamos que, no geral, já que estamos analisando o desempenho do candidato derrotado (veja na Editoria de Politica e o comentário sobre Jerônimo publicado dia 31/10), ACM Neto fez uma belíssima campanha, propositiva, deu seu recado aos eleitores, manteve sua base organizada e estrutura para o futuro, os números apontam um melhor desempenho no segundo turno do que no primeiro, sai da eleição sem a marca de bolsonarista e muito menos de petista, numa trilha de independência, e teve altivez em saudar e cumprimentar desejando desejando sucesso aos governos de Lula e Jerônimo. 

   Destaques especiais ao prefeito Bruno Reis, de Salvador; a dupla Zé Ronaldo/Colbert Martins Filho, em Feira, fundamentais nas vitórias de ACM Neto nos dois mais importantes colégios eleitorais do estado. (TF)