A demolição de casarões na Ladeira da Montanha, decidida pela Prefeitura e autorizada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), foi alvo de muitas críticas dos vereadores de oposição na Câmara de Salvador nessa segunda-feira, 25. Eles cobram explicações pela falta de laudo técnico apontando a possibilidade de restauração dos prédios, ou mesmo da preservação das fachadas, por integrarem o conjunto arquitetônico histórico, tombado pela Unesco.
“Já que os prédios foram desocupados, não seria mais viável escorar para um posterior processo de recuperação?”, questionou Gilmar Santiago (PT), criticando a conivência do Iphan. Para ele a derrubada dos imóveis pode estar atendendo a interesses do mercado imobiliário e sugeriu que a Comissão de Planejamento Urbano programe uma visita ao local, acompanhada de técnicos, para vistoriar a área. Segundo o presidente do colegiado, Arnando Lessa (PT), a inspeção já estava na pauta da próxima reunião desta terça-feira, 26.
Um crime
Para Hilton Coelho (PSOL) a demolição é “um crime”, pois “uma parte da história de Salvador está indo por terra”. Aladilce Souza (PCdoB) também protestou: “Sabemos que o estado era precário, mas o valor arquitetônico daquele conjunto é muito alto e merecia uma justificativa muito forte para o que foi feito. Podemos correr o risco de perder o título da Unesco de Patrimônio da Humanidade”.
Em resposta Joceval Rodrigues (PPS) e Leo Prates (DEM), líder e vice-líder da bancada do governo, lembraram aos oposicionistas que o Iphan é dirigido por Carlos Amorim, indicado pelo PT. Mas Gilmar disse continuar estranhando a autorização: “Não é porque uma pessoa foi nomeada pelo governo federal que vamos deixar de denunciar. Tem que ser apurado se houve conivência”.
Do lado governista Paulo Magalhães Jr. (PSC) e Euvaldo Jorge (PP) sustentaram que a destruição foi a única alternativa diante do estado dos prédios, com ameaça de desabar e da falta de recursos para a completa recuperação.
Gentrificação
Na opinião de Hilton a indústria imobiliária será a maior beneficiária com a decisão: “A gentrificação é evidente. Enquanto lá morarem pessoas pobres e negras nada será feito de forma efetiva. Querem transformá-lo de forma elitista como se tenta em Pernambuco com o ‘Novo Recife’. Estamos atentos e chamamos a população e entidades representativas a dizerem ‘não’ à expulsão que se consolida usando agora a tragédia das chuvas como álibi. Parte de nossa história está sendo destruída e precisamos resistir”.
De acordo com sua explicação gentrificação é o termo dado à expulsão de moradores pobres de determinada região por meio de um conjunto de medidas socioeconômicas e urbanísticas marcado pela hipervalorização de imóveis e encarecimento de custos.
“Talvez você nunca tenha ouvido o termo, mas certamente convive com seus impactos”, afirma ele, acrescentando que o local foi “abandonado pelo poder público e invadido pela especulação imobiliária. As autoridades que deviam cuidar e preservar o patrimônio histórico da cidade de Salvador são as responsáveis pela demolição desse conjunto de valores históricos da cidade”.
O socialista acrescenta não estar surpreso com tudo que ocorre “porque sempre alertamos e denunciamos que o prefeito ACM Neto representa um projeto social e político de exclusão onde os beneficiários de sua gestão são os que estão no comando da gestão desde Thomé de Souza”.
A seu ver a destruição continua “com o silêncio de todos, inclusive com a participação do governo estadual e do federal, através da omissão, incapacidade ou algo pior do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan)”. Ele também considera o Ministério da Cultura “omisso”, porque não se manifesta sobre a situação: “A omissão é tamanha que pode ser confundida com conivência”.
Outorga e Fundurbs
Presente a diversos debates e conversas com instituições e entidades para discutir novos projetos para a cidade Gilmar defende que o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU) e seus instrumentos, como o Fundo de Desenvolvimento Urbano de Salvador (Fundurbs) e a outorga onerosa, devem ser utilizados para cumprir uma função social.
Em sua avaliação “o déficit habitacional tem que ser reduzido. Temos que construir imóveis para quem precisa e não ficar nesse falso debate de que a construção civil tem que ser estimulada. Para que, para construir mais imóveis nos bairros de classe média?”. Para ele, o Fundurbs não pode ser extinto e a outorga onerosa tem que ser discutida dentro do PDDU e não isoladamente como pretende o prefeito.