Fui aparar meus pelos das narinas, das sobrancelhas e do cocuruto na Barbearia de Sêo Soté e em lá chegando astuciei a conversa dos filhos de Sêo Valdemar do Armarinho, Tema, e de um dos filhos de Sêo Tuica, Botério, dando conta de que o tal leão, sussuarna parda, jaguatirica, preazão ou cão faminto teria matado 30 ovelhas na Fazenda de Sêo Roque de Marcelino, no distrito da Bela Vista.
Segundo comentavam com Soté, com Sêo Ranoelito dos Anéis também presente, Sêo Bino Carneiro, el pintor, ambos servindo de testemunhas, e de uma senhora ex-mulher de um dentista que tomava umas brahmas, que, de fato, as rádios e outros segmentos da sociedade andavam a dizer que teria sido coisa de lobisomem e não de leão ou sussuarana.
E que a conveersa do motorista de Sêo Vardinho, do Frigo Serra, João Paulo Brito, tendo como testemunhas os ajudantes Broa e Beiçola seria fiada. Ainda mais que o camarada disse que deu a ré, dito que foi a ré do caminhão, e que o felino, um dia depois desse acontecido, ainda tentou atacar um boi na Fazendo de Sêo Lú, na localidade de Laje dos Caboclos, que fica perto do Praiano, e o mesmo recebeu foi uma chifrada do boi. Embora ferido, o 'leão' também deu sua lapada nas costas do bovino tanto que Sêo Lú passou o dia colocando remédio no lombo do animal.
E mais, que teria dado na rádio que, no Coité, também já tinha aparecido um leão e que este dito rei da selva matou um filho de Sêo Tutu nas proximidades do cemitério.
Conversa do povo, segundo os interlocutores. Sêo Bino fumava um cigarro atrás do outro, não sei se como medo do 'leão' ou por ter o hábito, comum em algumas pessoas, de só beber fumando.
Então, dei meu pitaco na conversa, entres aqueles que estavam entre brahmas e churrasquinhos, quiça de carne de gato, e defendi nossa familia dos lobisomens dizendo que, tudo não se passava de um boato em relação a nós, porque hoje estamos civilizados, aculturados e só compramos carnes, frangos e queijos nos supermercados.
E que, se ato dessa natureza fora praticado contra as 'criações' de Sêo Roque de Marcelino por algum lobi poderia ter sido coisa dos cabeças de cuyas do Coité, porque vocês sabem que coité é uma cuia, uma cabaça, e dizem que por lá, salvo engano, no Juazeirinho, tem uma familia desses lobis que ainda pratica esse tipo de predação.
Quando aos lobis da Serrinha, atestava, eu como decano, que só compramos nossos mantimentos no Baratão de Sêo Marcel Queiroz; no Armazém Andrade de Sêo Eliseu; no supermercado Chama de Sêo Toni filho de João do Bar e dona Ana; e no H Parbosinha do Shooping Serra.
Disse mais, que minha esposa Ester Loura, só compra vinhos na Evino e no final do ano se desloca até Paris para adquirir queijos e salmões no Carrefour que fica nos arredores de Paris.
Daí - os camarados boquiabertos só ouvindo eu falar - que não tinha nenhum fundamento esse boato, já chegado a Feira de Santana e a Salvador, e que considerava pertinente uma afirmação do nobre secretário de Agricultra da Serra, Sêo Cássio Fiúza Carneiro, o qual disse que a morte dos animais pode ter sido um ato praticado por uma jaguatirica ou de um cachorro faminto.
Um deles então questionou: - Um cachorro matar 30 carneiros e ovelhas, nunca vi falar nisso!
- E uma jaguatirica, pelos anos que vivo na Serrinha também nunca ninguém soube delas por aqui - completou Soté pinicando a tesoura na minha orelha.
- O que aconteceu só uma investigação detalhada dos fatos pode comprovar o real autor, uma vez que a Policia Técnica está aí para isso, o senhor governador da Bahia já disse que é a melhor do Brasil em equipamentos, uma referência, então é analisar fazer as análises dos bichos mortos, as pegadas e o assunto estaria resolvido. Agora, nós, os lobis da Serra não fomos, frisei.
Bino, o pintor, arrematou: - Se o valoroso lobi está a garantir pelos lanzudos temos mais é que acreditar e deu-me um aperto de mãos, despedindo-se.
Sai da tenda de Sêo Soté convencido de que as pessoas que ali estavam, importantes multiplicadores da opinião pública, tinham aceitado as minhas poderações, ainda que um deles, quando deixei a tenda ficou balançando a cabeça de um lado para o outro, como se disse assim, "sei não, sei não".
Daí, tomei a praça Luis Nogueira onde encontrei Sêo Amaranto, depois dobrei na Rua Direita, passei na loja de Sêo Sancho pra comprar uma latinha de tinta e por lá encontrei o emprésario Alírio Vermelho, integrante do nosso conselho politico e descemos até a Rua Bela Vista, ao Boteco do Teco, pra tomar uma gelada e jogar um pouco de conversa fora.
Arregimentamos também Tolentino Caneco, nosso homem das leis, o qual se encontrava na porta da loja de materiais de construção de sua esposa.
A conversa, no caminho, já era sobre o misterioso leão da Bela Vista e versos que já corriam de boca em boca, também nas rádios, nos programas populares e em blogs, de autoria de Galeguinho do Subaé dando conta de que fizera uma incursão pela zona rural e só vira o leão depois que tomara umas catuabas.
A gente sorria e descia a Rua Direita já na altura da casa de doutor Hamilton Safira quando despontou no lado da baixada nosso amigo Pinguinha montado num jegue, o qual se integrou a comitiva.
Alirio arreliou: - Vende esse jegue e compra uma moto antes que o leão o devore.
- Bitelo vale mais do que uma CB400, pois, além de ser bom de montaria, esquipador, é o maior garanhão dos Treze, bairro em que vivemos ao lado da Bomba.
- Biitelo! com a desvalorização dos jegues não vale uma biclcleta de segunda mão - comentei discretamente para não ofender Pinguinha.
No Teco, gritamos quase em unisso: - Abre um litrão geladão.
Pinguiha apeou de Bitelo e foi o primeiro a colocar a gelada no seu copo além de também o primeiro a falar. - Ouvi agora na rádio (só fala assim, na rádio) que tem gente achando que a morte das ovelhas no distrito da Bela Vista é coisa de lobisomem, olhando pra mim já esperando a resposta.
- Admiro que o nobre conselheiro, que me conhece há anos, que sabe que frequento a missa da catedral há 10 anos, desde que o bispo Assolari aqui chegou da Itália, que só não vou mais no clube, na antiga ACS porque fecharam, diz-se que tem um dono poderoso e a Justiça nunca resolve abrir desde que o finado Waldir Cerqueira entrou com ação de reposição da posse aos sócios; que também frequentei o bar de Sêo Foba, por muitos anos, agora fechado; que participo da corrida do 1º de maio ao lado de Sêo Luis da Bicicleta; que desfilo no ato cívico do 7 de setembro à frente do nosso TG, e vem você com essas insinuações malévolas.
- Se V.Xa. permite um aparte, disse Alirio, isso de estarem falando do lobisomem é coisa de seus adversários políticos temendo sua candidatura a deputado, em 2018 - frisou.
- E mais, ai já foi comentário de Tolentino, ninguém vai abalar a reputação de V.Exa. e podemos tirar uma nota conjunto, do coletivo, para ser lida no programa popular do Berraz.
Pinguinha ficou encolhido sendo observado por Teco que enchia novamente seu copo.
Na sua prosopopéia, então retrucou: - Não quis de maneira alguma ofender V.Xa Falei apenas o que a rádio comenta e sei que V.Exa. jamais praticaria tal ato. Agora, se mal lhe pergunto para entender melhor nossa conversa, o que significa essa palavra que V.Exa. usou a "mavelova"!
Teco emendou: - Não é 'mavelova" é malévola.
- Ora, meu nobre Pinga, malévola é que causa o mau, que é pernicioso, que possui péssima índole - comentei.
- Agora, sim, tá explicado, obtemperou Pinguinha destacando que adotaria a postura do nosso Rei Sol, o Luis, que não permitira a veiculação de mentiras, nessa imprensa marrom da Serra.
- Não chegue a tanto velho Pinga, comentei, uma vez que não estou envolvido nessa Operação Lava Sujos, e os programas populares das rádias falam a linguagem do povo.
- Isso mesmo - completou Tolentino - o povo aumenta mas não inventa e eu mesmo nunca vi um leão. Agora, se o povo da Bela Vista viu, teve até um que achou que se tratava de um leão voador, tanto que fechou a janela de sua casa para não ser devorado, temos que respeitar.
- A voz do povo é a voz de Deus - completou Alirio.
Já estávamos no quarto litrão quando Ester Loura, minha nobelissima esposa ligou-me pelo celular: - Venha pra casa tomar sua sopa de legumes e deixe de conversa fiada nesse boteco.
Todos ouviram o chelpe no viva voz. Silêncio na conversa. Os conselheiros olhando-me.
Em instantes, sem saída, disse: - Tenho que ir-me: a delegada me convocou.
Pinguinha caiu na risada, montou em Bitelo e saiu esquipando e soletrando uma quadra: Trinta ovelhas de Sêo Roque/ Foram mortas por um leão/ O lobi pagou o pato/ E Ester impediu d'ele tomar mais um litrão.