Como um compadre do Lobisomem informa que sua esposa Florzinha arranjou um trabalho do tipo bico para o mexicano Ramón
Tinha acabado de apreciar o bloco das mascaradas na integração com o bloco "Tem nego Bebo Aí" no mixórdio Carnaval da Serra quando recebo uma ligação telefônica do meu compadre Perremptório Segundo, o pessimista, para dizer-me que, atendendo a um pedido meu, sua esposa Florzinha de Jesus Amado, havia contratado Ramón, el Mexicano, para fazer um serviço de capinagem no seu quintal, e limpeza da piscina de sua casa no balneário de Vilas do Atlântico, onde estivemos recentemente em pequeno veraneio.
Confessou-me o compadre Perremptório que o mexica tinha se saído bem, salvo que foi pego com sua cuia de queijo retirando umas acerolas no seu quintal, o que só não considerou uma falha grave porque o tal assegurou que havia a permissão de sua esposa Florzinha, a quem tinha pedido a ajuda.
E, mais, disse-me o compadre: - O ousado ainda veio solicitar-me um liquidificador daqui de casa para bater um suco, uma vez que não tem esse equipamento em sua moradia.
- Ora, compadre, isso é o de menos. Pior fazem em Brasília e poucos são aqueles que punidos recebem uma reprimenda. Releve e além de emprestar o liquidificador dê um pouco de açucar ao pobre - falei.
- Se for por Florzinha esse disfarçado Cantinflas vai acabar morando aqui num quarto que temos ao lado da residência do caseiro Zezé.
- Faça essa caridade que Deus lhe ajuda - Ester Loura, minha esposa - soletrou essa frase para eu falar com Perremptório com a recomendação de que ele deveria deixar de ser ranzinza.
- Daqui a pouco esse Ramón, que nem sei se o nome dele é esse mesmo, vai colocar olho grande no meu pé de acerola e matá-lo; vai quebrar meu freeser que já não é dos melhores - comentou o compadre.
- Deixa de pessimismo. Não é à toa que você tem esse epítero, sorri.
- Pessimista uma ova. Se vocês estão com pena do mexicano que o levem para Serrinha e consigam uma bolsa familia para ele - sugeriu o compadre.
- Para aqui, não. Já temos muitos malandros, gente demais no bolsa familia, até pessoas que não precisam, gente no bolsa escola, outras no bolsa Prefeitura sem dar um prego numa barra de sabão - adverti.
Nisso chega a nossa casa minha neta Sol no ônibus que a traz da escola em Teofilândia, ouve meu diálogo com Perremptório e pede um aparte na conversa:
- Minha tia Florzinha está certa em querer ajudar o mexicano, o qual também conheci no veraneio e se trata de uma alma boa - frisou.
Ester então saiu dos seus cuidados e questionou: - Desde quando dona Florzinha é sua tia minha filha?
- Minha avó! Isso é apenas modo de falar. Eu gostei muito dela, penteei seu cabelo, coloquei óculos escuros no seu nariz pra ela ficar mais bonita e passei talco nela, daí que chamo de tia.
- Que eu saiba suas tias e tios são Fauna, Lateral Direito e Jaika. Florzinha é apenas esposa do compadre do seu avô. Daqui a pouco você vai dizer que Teco é seu tio; que Ó Santa é sua tia; que Alirio Vermelho é seu tio; que Dil é sua tia.
- Alirio é meu tio sim porque ele é amigo do meu avô, faz parte do seu conselho politico. Agora, essa Dil, se for aquela do Planalto Central, minha tia, nem pensar!
- E o amigo da Dil, Sêo Luis, você não admite chamar de seu tio. Ele é um homem bom?
- Esse Luis pior ainda. Luis lá em casa só os sapatos Luis XV de minha mãe, assegurou Sol. E se for Inácio, só santo Inácio de Loyola, garantiu.
Vendo que a discussão estava ficando politizada entrei na conversa novamente e disse que a secretária Ju Fraldas havia acabado de colocar o almoço na mesa: - Sua avó mandou preparar um porco assado dos melhores - comentei chamando-as à mesa.
- Nisso minha avó é boa. A costelinha de porco que ela prepara é de dar água na boca, respondeu minha neta.
No que também elogiei: - É sua especialidade, cozinha melhor que a Ana Maria Braga.
- Não só isso, mas também sei fazer uma boa moqueca de pescada amarela e saladas tropicais das melhores - gabou-se Ester.
A conversa seguiu animada até que Sol sugeriu que a gente fizesse uma marmita e mandasse também uma parte do porco para Ramón.
- Mas como vamos fazer isso, inquiri.
- Ora, meu avô, é só chamar o motorista que minha avó contrata para ir a Salvador, quando vai ao médico, Sêo Joaquim, e mandar ele levar o farnel com o porquinho pra casa de tia Florzinha que ela dá a Ramón.
- É uma boa idéia - comentei.
Ester então subiu nos tamancos: - Não vai mandar nada. Ele que coma lá as sobras da casa de Florzinha, que divida com Zezé o feijão preto com linguiça, pois, do meu porco ele não vai comer nem o rabo.
Sol concluiu: - Minha avó tá braba, tá em dia de Dil.