Colunistas / Causos & Lendas
Lobisomem de Serrinha

LOBISOMEM DE SERRINHA reúne sua comunidade para esperar o FIM DO MUNDO

Ficou acertado, em ata, que a comunidade do Lobisomem morrerá de pé, nas proximidades do Açude da Bomba, perfilada e cantando o hino nacional
25/11/2012 às 19:25

 Do alto dos meus 280 anos de idade nada mais me surpreende neste planeta de meu Deus, muito menos que o mundo vai se acabar no próximo dia 12, segundo profecia do calendário Maia.


   Um parente meu do ramo dos colberzões, da Feira, até sugeriu que narrasse a minha participação num baby-bode que aconteceu em Busca-Vida para um ex-figurão da República, este sim um fim de mundo para contestadores da Justiça, mas, como lá não estive e seco minha pança a espera do rega-bode de João Banha, reuni foi meu conselho comunitário aqui do Bairro do Oseás, onde moro, para analisar qual será nosso comportamento diante dessa enorme bola de fogo que porá fim ao mundo.

   Assim dito, convoquei os conselheiros espirituais, dona Suzana do Detran, da área católica; dona Celeste dos Queiroz, da ala espírita; o babalorixá Sílvio Cachoeira, do segmento candomblezeiro; Nezinho crente, do ramo evangélico, e mais outros membros da nossa comunidade, o vereador Reizinho, o empresário Alírio Vermelho, dona Antônia licorista, dona Aninha de Sêo Zipriano, Sêo Teco do boteco da Bela Vista, Dr Poró, Sêo Dôia da Loja, representando o CDL, Sêo Expedito da farinha, do ramo do agronegócio, a professora Claudenita, a dotora Isani Moares, o juiz de linha Melvar, Merreu, representando a área do bicho, e gente da minha raça, um lapão do Quijingue, um penedão doTracupá, um pinhão do João Vieira e um matão do Barreiro pra que a gente tomasse uma posição.

  Diria que a reunião, como citam os politicos, foi "bastante proveitosa" e só não foi melhor porque dona Antônia sapecou a servir licor de jenipapo aos convivas o que alterou alguns pronunciamentos, mormente de Alírio Vermelho, o qual disse que não tinha medo algum dessa bola de fogo e que ele comeria a dita frita feito passarinha, ato que levou a beata Suzana a se benzer umas dez vezes e até ameaçar se retirar do encontro, só não o fazendo porque usei de minha autoridade, toquei aquela sineta que estava sobre a cabeceira da mesa e pedi calma.

   E foi a dona Suzana que emendou a conversa e falou que a comunidade tinha mais era que esperar o fim do mundo de joelhos, todo mundo ajoelhado e pedindo perdão a Deus por seus pecados, porque ela tava certa de que, de fato, dia 12 não ficará ninguém sobre a terra, diante de tanta incúria, diante de tanta falsidade e roubalheira que está acontecendo.

   Foi então que dona Celeste interveio e disse que ninguém iria morrer, mas, passar para uma outra etapa da vida, num outro astral espiritual, desencarnando assim da terra e experimentando novas vivências atmosférias e ambientalistas.

   - Peraí! - apartou Cachoeira - a senhora está parecendo Gilberto Gil com esse palavreado. No máximo concordo é que se o homem veio da natureza, assim reza minha religião, e tem que voltar para a natureza. "Somos todos água, planta, pedra e fogo", asseverou.

   - Eu não gosto do fogo. Arde muito. Queima. É muito doloroso. Prefiro a água e se é pra gente voltar pra natureza devemos esperar esse fim na beira do açude da Bomba porque aí vai ser menos sufocante, comentou Dr Poró solicitando mais uma dose de licor a dona Antônia, a qual falava no ouvido de dona Aninha, "Ô povo que bebe".

   - Concordo arrematou o lapão do Quijingue. Se é pra isso, o que acredito que vá ocorrer, porque essa seca já matou a metade dos bichos e até de gente, vamos todos a Bomba.

   - Mas, não como quer dona Suzana. Se é pra morrer vamos fazê-lo de pé, de cabeça erguida, mostrando o nosso valor, arrematou Teco.
 
   Concluída a reunião, ata produzida pelo crente Nezinho, todo mundo presente assinando embaixo, alguns em lágrimas, ficou decido o seguinte: que nossa comunidade vai esperar o fim do mundo à beira do açude da Bomba, de pé, perfilada junto à bandeira nacional, sem choro e sem vela. 

   No máximo, servindo um licorzinho de dona Antônia.

  Quando dona Antônia foi assinar a ata que leu esse detalhe, arrepiou: - Não assino. Oxé como é que vou vender meu estoque no São João do próximo ano?

   Balbúrbia geral no ambiente, disse-me-disse, aí toquei a sineta mais uma vez e dei por encerrada a reunião.